Em março de 2021, a GoPro lançou uma atualização do seu app mobile e adotou um “novo/velho” nome: Quik. O objetivo comercial da empresa é atrair donos de smartphones que ainda não possuem uma câmera da marca e fidelizar os que já usam o equipamento. No entanto, o fundador e CEO da GoPro, Nicholas Woodman, vai além ao dizer que a ideia é “ajudar as pessoas a serem mais felizes”.
O TecMundo entrevistou o executivo para conhecer melhor essa forte investida no mercado de softwares, mas antes de entrar na parte mais filosófica da conversa, vamos entender como o app da GoPro chegou até aqui.
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GoPro além do hardware
A empreitada da GoPro no mercado de softwares não é recente. Além do seu aplicativo próprio que funcionava apenas com suas câmeras, o GoPro App, em 2016 a empresa investiu US$ 105 milhões na compra de dois aplicativos de edição de vídeo, o Splice e o Replay. Pouco depois, o Replay foi relançado com o nome de Quik e era focado em edições mais automatizadas e rápidas, enquanto o Splice continuou com o mesmo nome, oferecendo mais recursos para usuários avançados.
Como os serviços eram disponibilizados para editar qualquer vídeo armazenado no smartphone, a GoPro já falava sobre como gostaria de ajudar as pessoas a contar histórias melhores com vídeos, independentemente de qual câmera usassem para capturar as imagens. Em 2018, a empresa discretamente passou o Splice adiante para a Bending Spoons e começou a focar no aperfeiçoamento do seu próprio app.
The Splice app is now under the watch of another company, Bending Spoons. https://t.co/uNR1lscil5
— GoPro (@GoPro) December 23, 2018
Apesar de ter ficado um pouco de lado por conta do GoPro App, que era seu principal software, o Quik ainda tinha “cerca de oito milhões de usuários ativos por mês” antes do processo de reformulação, de acordo com Woodman.
Em 2021, a empresa entende que chegou a um novo patamar de desenvolvimento de software e relançou o Quik por R$ 37,99/ano ou R$ 7,50/mês. Quem já é assinante GoPro e paga R$ 159,90/ano ou R$ 15,90/mês também já tem acesso liberado ao Quik.
GoPro para todos
Para Woodman, o novo aplicativo é o auge desse esforço de vários anos da GoPro para diversificar sua receita e não ser dependente apenas de hardware, uma vez que o app pode ser usado para editar fotos e vídeos de qualquer smartphone ou câmera, incluindo GoPros e DSLRs, além de ajudar as pessoas a gerenciar a grande quantidade de imagens que possuem.
O executivo explica que o novo Quik democratiza os recursos que antes eram restritos ao GoPro App e, mesmo tendo consciência de que uma série de outras opções para gerenciamento de biblioteca de imagens, armazenamento e edição já existe por aí, o serviço por assinatura permite oferecer aos usuários todas as ferramentas no mesmo lugar de maneira simples.
Além disso, a empresa pode oferecer atualizações com novidades a cada duas semanas, por exemplo, enquanto seu portfólio de câmeras é atualizado uma vez por ano, o que aumenta as chances de a GoPro manter seu nome em alta por mais tempo e oferecer mais inovações aos usuários.
“A relevância e a importância de nossas marcas para as pessoas que não possuem uma GoPro é apenas um retorno muito melhor do investimento que estamos fazendo continuamente nos recursos do Quik. E é por isso que lançamos o app como um serviço por assinatura para pessoas que usam principalmente seus telefones ou outra câmera para capturar fotos e vídeos”, disse Woodman.
“E com o tempo, se pudermos impressionar esses usuários com o quão poderoso e conveniente é o Quik, talvez possamos ajudá-los a ponto de talvez um dia eles pensarem em comprar uma GoPro para levar seus recursos de captura para o próximo nível. Mas mesmo que apenas os atendamos por meio do uso do Quik, tudo bem, estamos felizes em fazer nossa marca crescer desta forma e ajudar as pessoas a alcançarem mais com a sua paixão por capturar e compartilhar vídeos e fotos”
O feed do vizinho é sempre mais verde
Deixando um pouco a parte financeira de lado, o estilo de vida GoPro existe e não podemos negar. No entanto, além do hard user praticante de esportes radicais que faz imagens incríveis, também existe o consumidor médio, que usa a câmera para filmar momentos de diversão com os filhos, finais de semana na praia e dias de sol na piscina. E eles também estão na mira.
“Nosso conteúdo pessoal nos valida e nos lembra quem somos, quem amamos e o que amamos fazer. Por isso, sentimos que é realmente importante ajudar as pessoas a se envolverem com seu conteúdo pessoal, porque achamos que isso as torna mais felizes”, diz Woodman.
Para o executivo, o uso excessivo de redes sociais faz com que as pessoas olhem muito para a vida dos outros e deixem de apreciar seus próprios momentos. “Às vezes as pessoas caem na armadilha de gastar muito tempo olhando fotos e vídeos de outras pessoas. Isso pode fazer você sentir que talvez não esteja fazendo o suficiente com sua vida".
"E esse é o aspecto do aplicativo Quik de que mais me orgulho: acho que estamos ajudando a tornar nossos usuários mais felizes e mais orgulhosos de tudo o que estão conquistando em suas próprias vidas”
Parte disso se dá por conta da "baguncinha generalizada" que vira o rolo da câmera e a galeria do celular com tantas imagens. Para ajudar a resolver o problema, o Quik aposta no recurso chamado "mural", que funciona como uma espécie de feed particular para suas imagens favoritas.
O novo Quik permite ainda a criação automática de vídeos com sincronização de música para os mais leigos. É só selecionar as fotos e vídeos que deseja usar, escolher uma música da sua biblioteca pessoal ou alguma disponibilizada pela própria GoPro — já livre de royalties e sem o risco de ser limada pelas redes sociais — para que a edição fique pronta.
Efeito pandemia, smartphones e o futuro da GoPro
Desde que abriu seu capital em 2014, a GoPro figurou entre as queridinhas de Wall Street, viu suas ações entrarem em um espiral descendente e lutou para virar o jogo. Mas a missão não é fácil quando seu principal produto disputa em um mercado em que quase metade da população mundial tem uma câmera cheia de recursos avançados no bolso graças aos celulares.
Sobre ter se inspirado no mundo dos smartphones para o desenvolvimento dos softwares da marca, Woodman não nega:
“No final do dia, tudo se resume a produzir a experiência mais conveniente possível para nossos usuários, e os smartphones têm feito um trabalho fenomenal. As empresas têm construído um hardware impressionante que é conveniente para o software que está sendo executado no telefone. Como uma empresa de hardware e software, temos que oferecer o mesmo nível de conveniência, porque é isso que as pessoas esperam”
Em 2020, durante a pandemia causada pelo coronavírus, a empresa anunciou um realinhamento estratégico, incluindo uma redução da força de trabalho de mais de 20%, foco em vendas diretas ao consumidor e no seu serviço de assinatura. Em março de 2021, os valores das ações voltaram a se tornar interessantes e a base de assinantes dos serviços da empresa ultrapassou a marca de 1 milhão, em abril.
A vantagem da assinatura GoPro é ampla e não está mais relacionada apenas a descontos na compra de novas câmeras e acessórios da marca, uma vez que oferece armazenamento ilimitado em nuvem de imagens da GoPro e transmissão ao vivo para a plataforma de streaming da GoPro diretamente da action cam.
Para o futuro, Woodman conta que podemos esperar uma versão desktop do Quik, o que vai permitir começar a edição de um vídeo no celular e terminar no computador, por exemplo. Além disso, em breve a assinatura do app deve incluir armazenamento ilimitado das imagens importadas para o mural. “Nosso objetivo é ter tudo sincronizado entre o desktop, o celular e a nuvem”, explica Woodman.
O CEO relembra ainda que o Brasil está no top três dos países que mais interagem socialmente com a marca. “De todos nós da GoPro a todos os nossos fãs brasileiros, muito obrigado. Nós adoramos, ouvimos vocês e continuaremos desenvolvendo produtos incríveis para vocês, porque sabemos o quanto apreciam isso”, finaliza.
Namastês a parte, dessa vez a GoPro parece estar determinada a fisgar novos usuários e gerar mais receita usando outros meios que não sejam suas câmeras, mas no final das contas, o recado ainda é de que tudo pode ficar melhor se capturado na action cam da marca.
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