O transporte público vai falir ou se transformar após a pandemia?

4 min de leitura
Imagem de: O transporte público vai falir ou se transformar após a pandemia?
Imagem: Geraldo Bubniak/AGB - Paraná Portal
Avatar do autor

Equipe TecMundo

As cidades inteligentes ensinam diariamente que as soluções urbanas podem vir dos lugares mais inesperados, ao mesmo tempo que se tornam cases que podem ser replicados em todo o mundo. Efeitos da globalização — no melhor sentido da expressão.

Sob esse prisma, as smart cities podem ser entendidas como hubs de respostas para os dilemas que a sociedade está enfrentando devido à pandemia da covid-19. Um desses impasses envolve o planejamento de mobilidade urbana: de que forma podemos nos prevenir de doenças infectocontagiosas ao utilizarmos o transporte coletivo no dia a dia?

Grandes e médias cidades deverão redesenhar seus sistemas de metrô e linhas integradas de ônibus para evitar uma grande falência coletiva

Se o "novo normal" continuar estimulando o distanciamento social, de forma a evitarmos multidões, grandes e médias cidades deverão redesenhar seus sistemas de metrô e linhas integradas de ônibus para evitar uma grande falência coletiva. Além da suspeita óbvia de que a mobilidade de massa é um vetor de contágio, alguns estudos analisam a extensão da pandemia em cidades como Nova York por meio da rede de metrô. 

Essa mudança de paradigma na mobilidade coletiva traz implicações variadas para agências e autoridades de transporte a ponto de colocar em xeque o modelo de transporte público que temos atualmente. É preciso avaliar se novas propostas de concessão de serviços serão atraentes diante de novas condições de menor ocupação, se será apenas uma questão de aumento na frequência de ônibus ou vagões de metrô ou se exigirá uma ampla reorganização durante a hora do rush, caso os usuários se afastem do transporte público por medo de contágio.

É preciso avaliar se novas propostas de concessão de serviços serão atraentes diante de novas condições de menor ocupação

Reforma urbana

E algumas tendências já aparecem. É o que relata o pesquisador Manu Fernández, pensador urbano estratégico e criador de ações inovadoras da FIRA Barcelona: "A experiência vital do confinamento nos deu uma perspectiva magnífica sobre o desequilíbrio na distribuição do espaço urbano. Em algumas cidades — de Calgary, no Canadá, a Colônia, na Alemanha —, os governos municipais abriram ruas inteiras para o trânsito de pedestres e ciclistas. Outras grandes metrópoles, como as espanholas Madri, Valência e Barcelona, estão avaliando como lidar com o excesso de capacidade rodoviária para reorganizar ruas  e rotas pós-confinamento".

Outros especialistas em soluções inovadoras com quem temos debatido nas Maratonas de Lives do Smart City Expo Curitiba têm sido unânimes em apontar que a distribuição desigual do espaço urbano já é uma urgência a se resolver. A pandemia nos fez enxergar outra cidade, e não devemos voltar atrás. Da mesma forma que a crise se tornou um desafio para o transporte coletivo, ela trouxe o momento de maior visibilidade para a mobilidade de pedestres, bicicletas e congêneres. É agora ou nunca.

Além de oferecerem benefícios sustentáveis para o meio ambiente, esses modais convivem de forma cada vez mais harmônica com os automóveis, quando os planejamentos viários assim são elaborados. "É hora de abrir ruas e calçadas, a partir das peculiaridades de cada bairro e região das cidades. A experiência subjetiva do novo coronavírus nos fez entender que as formas de se locomover pelas cidades precisam ser repensadas", avaliou Fernández.

A experiência subjetiva do novo coronavírus nos fez entender que as formas de se locomover pelas cidades precisam ser repensadas

Um movimento que pode inspirar cidades pelo mundo a se organizarem quando a pandemia passar é o Walk, Bike, Places, criado em 1980 em Indianápolis, nos Estados Unidos. É uma organização de caráter progressista que une ciclistas, pedestres e placemakers (realizadores urbanos, em tradução livre) dos setores público e privado, para que possam desenvolver um legado positivo para a mobilidade.

Realizado a cada 2 anos, o evento se tornou a principal conferência do ramo na América do Norte, abordando questões importantes e desafiadoras da atualidade, como mudanças climáticas, escassez de recursos e desigualdade econômica. Para isso, procura reunir novas e diversas vozes. Se tudo correr bem até lá, a edição 2020 está agendada para agosto no Indiana Convention Center. Mais informações podem ser encontradas no site.

O "novo normal"

É evidente que a operação pública e privada dos sistemas de mobilidade urbana terá que se adaptar à nova realidade mundial e que isso vai exigir a implantação de mecanismos e dispositivos que possibilitem o menor contato entre usuários nos modais coletivos. Da mesma forma, o compartilhamento das vias entre automóveis, pedestres e ciclistas precisará sair do papel em definitivo.

O "novo normal" abriu as portas de um admirável mundo de possibilidades urbanas. É preciso estimular o engajamento entre os atores sociais, para torná-las realidade em prol de uma melhor qualidade de vida dos cidadãos.

***

Beto Marcelino, autor deste artigo, estreia hoje sua coluna sobre tecnologia e mobilidade no TecMundo. Ele é engenheiro agrônomo e sócio-diretor de Novos Negócios do iCities, empresa que organiza o Smart City Expo Curitiba, maior evento do Brasil sobre cidades inteligentes com a chancela da FIRA Barcelona.

Você sabia que o TecMundo está no Facebook, Instagram, Telegram, TikTok, Twitter e no Whatsapp? Siga-nos por lá.