Femtechs são empresas que desenvolvem tecnologias inovadoras direcionadas a atender às necessidades de saúde e bem-estar femininos, muitas vezes negligenciadas ou esnobadas pelas indústrias tradicionais. Em sua grande maioria, essas inovações propõem a quebra de estigmas, tanto no produto como nos atores (no caso, atrizes) que o desenvolvem.
No universo startup, as femtechs têm revolucionado os serviços e produtos ligados às necessidades de saúde específicas das pessoas do sexo biológico feminino. Com foco no design para a criação de soluções, o nicho relativamente jovem tem apostado em parcerias entre pesquisadoras acadêmicas e mulheres empreendedoras.
Tecnologia, negócios e comportamento sob um olhar crítico.
Assine já o The BRIEF, a newsletter diária que te deixa por dentro de tudo
Isso gerou um mercado promissor que, segundo a Forbes, deve atingir R$ 232 bilhões em 2023, mesmo tendo que romper alguns estigmas e lidar com a histórica desconfiança masculina. No caso do Brasil, que tem uma população predominantemente feminina, esse mercado ganha, ou pelo menos deveria ganhar, maior visibilidade.
E essa nova revolução feminina começou, quem diria, com um processo fisiológico experienciado diariamente por mais de 300 milhões de mulheres no mundo: a menstruação.
Em 2016, quando a empresária dinamarquesa Ida Tin tentava atrair investimentos para seu aplicativo de rastreamento de menstruação e fertilidade Clue, percebeu o desconforto dos empresários de venture capital com a biologia feminina. Tendo que usar um termo para seu negócio, ela optou por "female technology", gestando assim a primeira femtech.
- Leia também: O que são AgTechs: startups de tecnologia agrícola
Mas, o que faz exatamente uma femtech?
Feitas de, por e para mulheres, já dá para perceber que estamos falando de uma indústria gigantesca. E a tecnologia envolvida abrange Inteligência Artificial, machine learning, Big Data e Internet das Coisas. O resultado são ferramentas de saúde física, mental, psicológica, sexual e social.
Além de aplicativos como o pioneiro Clue, que gerencia o ciclo menstrual para detectar o período fértil, são oferecidos hoje:
- fortalecedores do assoalho pélvico
- extratores de leite materno dentro do sutiã
- pulseiras inteligentes que medem a taxa hormonal
- testes de gravidez descartáveis no vaso sanitário
- discos menstruais que permitem sexo com penetração.
Entrevistada pelo Projeto DRAFT, a ginecologista integrativa Luciana Gandra explica que as femtechs “entram na onda do autoconhecimento e as mulheres têm mais facilidade em compartilhar sua intimidade, dissertar sobre sua vida reprodutiva e sexual".
Femtechs brasileiras
Em terras brasilis, nossas femtechs seguem a vibe internacional de trazer soluções para alguma questão feminina. Esse é o caso da Feel e da Lilit, empresas nacionais de bem-estar sexual que se juntaram em junho do ano passado. A primeira é pioneira em produtos naturais e veganos para a região íntima da mulher. Já a segunda lançou no país o primeiro vibrador criado e desenvolvido por e para mulheres.
Nessa pegada de produtos que respeitam o ecossistema feminino, a femtech Herself estabelece como missão "que a menstruação não seja um limitante na vida de nenhuma pessoa". Para isso, oferece calcinhas absorventes reutilizáveis e tecnológicas para conforto e segurança da mulher no período menstrual.
Outro desafio social e considerado um grande paradigma, a menopausa é o foco da femtech Plenapausa. Em entrevista ao Uol, sua fundadora e CEO, Márcia Cunha, explicou que a empresa nasceu "para atender essas mulheres por meio de informação, apoio, direcionamento e com a oferta de produtos”.
- Leia também: O que são martechs: startups para marketing
O mercado de femtechs
Uma avaliação recente feita pela plataforma PitchBook revelou que, apesar de uma desaceleração nos investimentos neste ano (causada pela recessão mundial), 70 startups conseguiram atrair US$ 375,1 milhões (R$ 1,9 bilhão) em escala global.
É bom lembrar que, durante a pandemia, o setor arrecadou um recorde de investimentos de US$ 2,5 bilhões, seguido de mais US$ 1,5 bilhão em 2022. Para a diretora-gerente da RH Capital, Elizabeth Bailey, "vimos uma explosão de interesse e investimento na saúde das mulheres nos últimos dois anos e, mesmo com a crise económica, não dá para colocar esse gênio de volta na garrafa”.
Em julho passado, a femtech americana Herself Health, empresa de saúde pioneira para mulheres com mais de 65 anos, arrecadou US$ 26 milhões (R$ 131 milhões) em uma rodada da Série A, para acelerar o crescimento e se atualizar com as demandas das pacientes.
Também na área de saúde, a Maven, clínica virtual que oferece cuidados para mulheres e suas famílias, alcançou em 2021 uma avaliação de mercado de US$ 1 bilhão, tornando-se a primeira femtech unicórnio.
Femtech: uma ideia, muitos desafios
Só 4,7% das techs brasileiras foram fundadas por mulheres.
Apesar das conquistas, somente 4% de toda a investigação e desenvolvimento em cuidados de saúde (estimada em US$ 500 bilhões) são direcionados especificamente às mulheres. Isso faz com que, mesmo com perspectivas sólidas de crescimento, o setor femtech continue sendo uma área subdesenvolvida da tecnologia da saúde, dizem os especialistas da PitchBook.
No Brasil, a situação é ainda mais dramática. Segundo a última edição do Mapeamento do Ecossistema de Startups, lançado em 2022 pela Associação Brasileira de Startups, em parceria com a Deloitte, apenas 20% dos fundadores de startups no Brasil são do sexo feminino.
E, das empresas de base tecnológica brasileiras, só 4,7% foram fundadas por mulheres, segundo o Female Founders Report de 2021.
O que esperar das femtechs?
Femtechs surgiram para romper estigmas e gerando negócios.
Será então que o sonho acabou? Quando se trata de empoderamento feminino, aprendemos que a coisa não é bem assim. "A saúde da mulher não é um nicho de mercado e inclui muito mais do que apenas cuidados maternos ou reprodutivos", diz a consultoria McKinsey. Além disso, "antes de empreendedoras, SOMOS ATIVISTAS", reforça o site Femtechs Brasil.
De acordo com uma pesquisa divulgada recentemente pela Forbes, que entrevistou 50 fundadoras, CEOs ou porta-vozes de 90 femtechs, grande parte delas são mais guiadas pelo propósito de romper estigmas do que alcançar o sucesso comercial.
Isso faz das femtechs um mercado ainda pouco explorado. Mas, como o atual pipeline de inovação global mostra que as necessidades de saúde das mulheres continuam sendo historicamente negligenciadas, não seria esse gap um terreno fértil e pronto para a concepção de novas soluções?
Afinal, eliminar vieses de gênero pode acabar sendo um excelente negócio.
*Este é um conteúdo exclusivo do The BRIEF, newsletter de tecnologia, negócios e comportamento, pelo o meu irmão TecMundo. Curtiu? Então assina aí, vai!
Fontes