Realidade virtual, virtual reality, VR ou RV. Você escolhe como quer chamar essa tecnologia que separa você do mundo real e o leva para um ambiente totalmente imersivo. E é sobre isso que a gente vai falar neste episódio da série de história da tecnologia.
Você vai saber como essa ideia surgiu, bombou, caiu no esquecimento e agora está bombando de novo — pois é, ela é bem mais antiga do que parece e tem muita história para contar. Confira essa trajetória abaixo!
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Uma invenção jurássica
É muito difícil precisar exatamente quando a realidade virtual foi inventada. Esse conceito está no imaginário há um bom tempo para descrever um ambiente que proporciona experiências fora da realidade. Em 1838, o britânico Charles Wheatstone criou óculos estereoscópicos que usavam espelhos na frente dos olhos com uma pequena angulação na lente.
Os óculos de Wheatstone são uma versão antiga de VR e 3D.
O efeito criado é que duas imagens lado a lado, sejam desenhos ou fotos, ficavam sobrepostas, criando a ilusão de volume e imersão. Mas ainda era cedo para aparecer alguma coisa acessível nesse nível.
Publicado em 1935, o conto de ficção científica "Os Óculos de Pigmalião", de Stanley Weinbaum, descreve um par de óculos que traz um mundo surreal que combina hologramas com sons e cheiros, como se fosse um projetor individual.
Foi a primeira (e também a mais precisa) descrição sobre o que seria a realidade virtual
Mais ou menos nessa época, começaram a ser vendidos os óculos View-master, em que você colocava filmes fotográficos no lugar das lentes. Eles eram mais voltados para crianças e foram até relançados em 2015.
Sentidos com fliperama
Mas uma das primeiras produções veio na década de 60, com Morton Heilig. Depois de anos de desenvolvimento, ele criou o Sensorama, que parecia um fliperama e trazia uma mistura de cadeira que se mexia, óculos com visor, alto-falantes e até odores para simular a experiência. O cientista ainda patenteou uma ideia chamada máscara telesférica, um item individual com imagens em três dimensões em cor ou não que dominavam a visão periférica do usuário.
Os anos 60 ainda foram palco de dois avanços importantes. No campo teórico, o lendário Douglas Engelbart, responsável pelo mouse moderno, também idealizou que a gente podia usar um monitor para exibir visualmente informações que estavam em um computador.
Isso começou então a ser aplicado aos poucos. Em 1961, engenheiros da Philco criaram o Headsight, um projeto de estímulo visual e reconhecimento de objetos. A ideia era usar esse sistema para mover uma câmera remota, e ele foi usado até em treinamentos militares e de voo. Quatro anos depois, Ivan Sutherland inventou o The Ultimate Display.
A "Espada de Dâmocles" e a estrutura complicada para funcionar.
A ideia de você não diferenciar real do virtual evoluiu para um dispositivo chamado A Espada de Dâmocles, considerado o primeiro headset funcional de realidade virtual, com um computador gerando o mundo artificial e interação com objetos. Ligado em 1968, ele era tão pesado que ficava suspenso por uma haste.
Uma indústria com potencial
Em 1985, ex-funcionários da Atari resolveram investir na área sozinhos, já que a empresa quebrou depois de uma crise. A VPL Research é a companhia que oficializou o termo Realidade Virtual e ainda lança vários periféricos na área.
Eles incluem a luva Data Glove, que serviria de base para a PowerGlove da Nintendo, e os óculos EyePhone, que foram os primeiros comercializáveis
Anos antes, a NASA começou a pesquisar gráficos em 3D para treinar pilotos de missões espaciais tripuladas. O resultado foi o Virtual Interface Environment Workstation, ou VIEW, com óculos, luvas e até uma roupa completa com sensores para medir desempenho e sinais vitais.
Um passo atrás
A realidade virtual começou mesmo a sair dos laboratórios nos anos 90 e virou moda, especialmente nos games. O grupo Virtuality passou a fabricar dispositivos e arcades com a tecnologia, inclusive multiplayer. Em 1993, a Sega anunciou um headset para o Mega Drive e até alguns jogos, mas ele nunca passou da fase de protótipo. Em 1995, a Nintendo apresentou o ambicioso Virtual Boy, com um formato bem fora do convencional e gráficos 3D em vermelho e preto.
O Virtual Boy e o visual "vermelho e preto".
Só que ele é considerado o maior fracasso da história da empresa, com uma biblioteca fraca, por causar dores de cabeça e ter um jeito nada confortável de usar. A Atari ainda tentou lançar um headset chamado Jaguar VR para o console de mesmo nome, mas ele não saiu do papel.
Em 1992, foi lançado o filme "O Passageiro do Futuro", baseado em um conto de Stephen King. Foi o primeiro contato de muita gente com realidade virtual e ambientes em 3D, mas ele envelheceu muito, mas muito mal. Tem ainda "VR Troopers", série que passou no Brasil nos anos 90 e é uma versão norte-americanizada de tokusatsus como Metalder.
Um dos projetos que se salvam dessa era é a empresa WorldViz, que começou a desenvolver plataformas e virou uma gigante da área, com clientes que vão de universidades e da Philips até a NASA.
Está dando para ver que a maioria dos lançamentos da época se tornaram fracassos, né? A internet começou a se popularizar e, com ela tomando toda a atenção, o público passou a perceber que a realidade virtual era pouco acessível e nada desenvolvida. Talvez depois de uns 20 anos?
Abrindo os olhos
Temos então um abismo entre os avanços do começo dos anos 2000 até agosto de 2012. Nesse mês, Palmer Luckey iniciou no Kickstarter o financiamento da primeira versão do Oculus Rift. Deu tão certo que o jovem empresário até estampou uma famosa capa da revista Time.
A ideia dele era criar um display em forma de visor posicionado na cabeça do jogador. Ele seria relativamente acessível e bem mais fácil de usar se comparado a tudo que veio antes. O primeiro Development Kit foi financiado com sucesso e começou a ser enviado em março de 2013. A partir daí, várias empresas deram início à criação de jogos para realidade virtual no PC.
Ele tinha uma tela de 7 polegadas com resolução de 1280×800 pixels e campo de visão de 110 graus na diagonal, tudo muito melhor que tentativas anteriores. O código do kit virou público em setembro de 2014, incluindo firmware e esquemas do hardware. Foi nesse ano também que saiu o kit de desenvolvimento 2, com várias melhorias em relação ao original, incluindo resolução da tela e taxa de refresh. Mais de 100 mil unidades foram enviadas em 1 ano.
Uma das versões de desenvolvimento do Oculus Rift.
A versão para o consumidor saiu no começo de 2016. Só que ele era caro, 600 dólares, e exigia um PC parrudo para funcionar. Muita gente também reclama até hoje do motion sickness, aquela sensação de enjoo por você estar se movimentando no game, mas parado na vida real. Esse sintoma varia bastante entre cada pessoa e diminuiu bastante nos últimos modelos.
A Oculus foi a grande líder dessa segunda revolução do VR
O aparelho foi o pioneiro e repopularizou a tecnologia para games, interações sociais, simuladores, demonstrações e muito mais. Deu tão certo que o Facebook comprou a empresa em 2014. O fundador Palmer Luckey teve vários problemas com processos envolvendo o desenvolvedor John Carmack, bem como o financiamento de campanhas políticas, e deixou a companhia em 2017.
A concorrência estava chegando
Nos consoles, quem saiu na frente foi a Sony. O Project Morpheus era uma lenda anunciada em 2014, mas que já tava em desenvolvimento pelo menos uns 3 anos antes. Ele foi renomeado como PlayStation VR no ano seguinte e finalmente saiu em outubro de 2016.
O preço era salgado, 400 dólares, e muita gente reclamou que a instalação no PS4 era difícil e deixava o cômodo cheio de fios. A biblioteca do PSVR ainda é limitada e poucos jogos de peso estão na plataforma, tipo Resident Evil 7 e Doom. Mas a Sony garante que 1 milhão de unidades foram vendidas até junho de 2017 e uma segunda versão foi anunciada em outubro. O design ganhou pequenas melhorias, inclusive na entrada do fone de ouvido, e reduz a bagunça de cabos.
O terceiro grande competidor dos tempos modernos é o HTC Vive. Feito pela fabricante taiwanesa em parceria com a Valve, ele é considerado o melhor headset atual em desempenho e conforto. Ele se aproveita de câmeras e sensores instalados ao redor do jogador para maior movimentação em cenários e traz um controle bem intuitivo.
HTC Vive e seus sensores e controles.
Mas tudo isso tem um preço, e o Vive custa 600 dólares. Ele foi apresentado em 2015 e saiu no ano seguinte.
Player 2, 3, 4...
Nos últimos 2 anos, a concorrência cresceu. Outra das mais recentes revoluções na área foi em 2013, com o Freefly VR. O grande diferencial desse headset era a capacidade de usar no lugar do visor um smartphone posicionado na horizontal, servindo de tela. Esse produto não foi tão bem-sucedido assim, mas abriu as portas para muitos projetos parecidos.
A Google entrou no mercado com dois produtos interessantes. O primeiro, de 2014, foi o Cardboard, que tornou o VR acessível a todos, já que é nada mais que um case de papelão. O segundo é o Daydream, de 2016, bem mais elaborado, compatível com vários dispositivos e já na segunda geração.
A Samsung começou em 2015 com o Gear VR, que só funciona com aparelhos da linha Galaxy a partir do Note 5 e S6. Fabricantes como Lenovo, ASUS e até o Facebook já estão embarcando nessa onda também.
A Nokia foi pelo caminho inverso e lançou uma câmera que grava em 360, a OZO, mas já descontinuou o projeto depois de 2 anos. A GoPro, que já teve a história contada por aqui, também embarcou nessa com o suporte para gravação Omni. E a Microsoft também está nesse caminho com um projeto ambicioso. A Mixed Reality é uma mistura de realidade virtual com realidade aumentada, em uma experiência totalmente inovadora.
O Mixed Reality da Microsoft.
A realidade virtual é uma tecnologia muito útil pra simuladores, na ciência, em educação e nos games. Ela foi introduzida cedo demais, mas isso foi bom para evoluir com o tempo e chegar à sua época de ouro, que é agora. E aí, você já experimentou algum dispositivo de realidade virtual? Acha que ela é o presente, o futuro ou vai cair no esquecimento mais uma vez?
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