Você provavelmente já deve ter se deparado com alguma corrente de assinaturas digitais em prol de alguma causa. E possivelmente também deve ter se perguntado se isso realmente tem algum efeito ou valor legal. Para tirar essas dúvidas, conversamos com um especialista em Direito Constitucional: o advogado Carter Batista, do Escritório Osório & Batista Advogados.
Antes de mais nada, é preciso lembrar que a definição básica de petição, em termos jurídicos, é um instrumento utilizado com o objetivo de conseguir uma decisão favorável de um juiz. Mas, no linguajar popular, a palavra se tornou um sinônimo de abaixo-assinado, como uma forma de reivindicar algo para uma pessoa, entidade pública ou empresa.
Ou seja, as petições públicas são uma solicitação coletiva em torno de algum assunto, enquanto as individuais servem como um título de causa jurídica. Dito isso, vamos a algumas questões que enviamos aos experts, que falam sobre a natureza e as características de ambas as definições.
Quando as petições online surgiram?
“Desde a década de 90 há registros de ativismo digital dessa natureza em países como Portugal e também no Reino Unido. À medida em que mais pessoas tiveram acesso à internet, o potencial desse tipo de manifestação se tornou mais evidente. A massificação das redes sociais talvez tenha sido um marco na capacidade de mobilização das pessoas por meio digital e contribuiu para tornar a petição online uma importante ferramenta democrática da sociedade moderna”, diz Carter.
Petições online são uma evolução dos protocolos que já podiam ser enviados via fax
O peticionamento eletrônico surgiu com a publicação da lei que disciplinou a instituição dos Juizados Especiais Federais, a Lei 10.259/2001. O parágrafo 2º do artigo 8º prevê que "os tribunais poderão organizar serviço de intimação das partes e de recepção de petições por meio eletrônico".
O que diferencia as petições online e as tradicionais?
“O princípio é basicamente o mesmo, porém, fora das amarras do mundo físico, as petições online têm a capacidade de alcançar um número muito maior de pessoas de pensamento convergente em determinado assunto”, comenta Carter.
Petições online permitem a realização de atos processuais até as 24 horas do último dia do prazo
Além disso, a ferramenta digital permite a realização dos atos processuais até as 24 horas do último dia do prazo, com o respectivo fornecimento de protocolo eletrônico — e é aceita em processos que ainda tramitam fisicamente — neste caso, é impressa e anexada aos autos. “Especificamente em relação à petição inicial de qualquer ação judicial, a parte que providenciar seu protocolo também deverá informar no documento o número no cadastro de pessoas físicas ou jurídicas, conforme o caso, perante a Secretaria da Receita Federal.”
Até que ponto as petições online têm validade e em que casos ela pode ser mesmo eficiente?
Embora Carter não tenha citado nenhum caso em especial, o site Change.org, por exemplo, cita exemplos de mãe de criança com deficiência que conseguiu impedir taxas em escolas e uma petição eletrônica que se tornou campanha mundial de educação para meninas, a partir da vencedora do Prêmio Nobel da Paz, Malala Yousafzai.
O Avaaz também conta com uma seção de vitórias conseguidas por meio do site, como a revogação de uma lei no Marrocos que dava a possibilidade de estupradores se casarem com a vítima para escapar de processo na Justiça.
Outra vantagem é a de que autos de petições físicas podem se extraviar, acarretando a ação de restauração de autos. Além disso, com as petições eletrônicas fica mais fácil para as partes envolvidas conferir simultaneamente o conteúdo.
Quais são os erros mais comuns de quem usa as petições online e o que é recomendável para quem quer fazer uma?
Bem, quando falamos das petições como causas coletivas em sites como Avaaz, e Change.org, há uma série de recomendações para que as mensagens sejam facilmente compreendidas por quem você quer que faça parte da sua campanha. “As petições online precisam ser diretas, versar sobre demandas possíveis e que tenham repercussão no meio social. É necessário procurar um especialista na questão a ser proposta, assessoria jurídica e utilizar-se das redes sociais para aumentar seu alcance”, recomenda Carter.
É preciso ser direto e conhecer bastante sobre o assunto para iniciar uma petição pública online
Como as petições online devem ser desenvolver daqui para frente?
O caminho é sem volta e as petições eletrônicas vieram para ficar. Obviamente que, com a chegada de mais mudanças e revisões será necessário sempre se debruçar para analisar e verificar a respectiva aplicabilidade, nos limites da legislação aplicável, inclusive a Constituição Federal.
Para Carter, as petições online podem evoluir para algo mais próximo à definição popular utilizada em sites como Avaaz ou Change.org. “Na minha opinião, as petições online podem, no futuro, evoluir para se tornarem propostas de Lei de Iniciativa popular, conforme o processo que atualmente pode ser realizado no mundo offline com a Lei de Iniciativa Popular e até mesmo a Emenda à Constituição por iniciativa popular.”
O que a união entre análise de dados e do Direito Constitucional pode fazer para melhorar o uso e os resultados das petições online?
A análise de dados já é uma realidade no Direito e no processo eletrônico, incluindo softwares jurídicos que usam estatística para prever resultados e oferecer probabilidades.
Maior interesse do próprio governo poderia tornar as petições públicas online mais relevantes
Carter crê que um maior interesse do próprio governo poderia tornar as petições online — que a maior parte da população vê como algo semelhante a um “abaixo-assinado” — como algo mais relevante e eficiente.
“A participação popular na tomada de decisões já é uma regra prevista em nosso ordenamento. Em muitos casos, a ação da União depende de deliberações do Poder Legislativo, tendo em vista a primazia do princípio da legalidade”, diz o advogado.
“Contudo, acredito que o Governo Federal, querendo, poderia criar mecanismos mais eficientes de cadastro e controle das chamadas petições online para que, no futuro, haja, por exemplo, dados necessários a basear propostas de Lei que possibilitem a maior abrangência e eficácia do ativismo digital”, finaliza