Se você deu uma olhada nas redes sociais hoje, especialmente no Twitter, é provável que tenha se deparado com a hashtag #CancelaNetflix. Ao princípio, a campanha pode parecer confusa, mas olhar as postagens marcadas com ela fica fácil entender o por que da campanha contra o serviço de streaming mais usado em todo o planeta.
A série “O Mecanismo” estreou com todos os seus oito episódios na Netflix na última sexta-feira (23). Aos desavisados, cabe lembrar que o programa é uma dramatização baseada em eventos relacionados à Operação Lava Jato, iniciada em março de 2014, ainda em andamento e que visa apurar um gigantesco esquema de lavagem de dinheiro envolvendo o poder público e algumas das maiores empresas privadas do país.
A trama, estrelada por Selton Mello (“O Auto da Compadecida”) é baseada no livro “Lava Jato – O Juiz Sergio Moro e Os Bastidores da Operação que Abalou o Brasil”, de Vladimir Netto, e traz nomes fictícios para personagens e empresas envolvidas nas investigações. Contudo, as críticas negativas acusam a série de distorcer os fatos, o que levou à criação da hashtag citada no primeiro parágrafo.
“Estancar a sangria”
As acusações de que o seriado, criado pelo laureado cineasta carioca José Padilha (“Tropa de Elite” e “Narcos”), não tem compromisso com a realidade ganharam inúmeras vozes. Além de milhares de anônimos, pessoas conhecidas, como o crítico de cinema Pablo Villaça e até a ex-presidenta , estão entre os críticos.
Para Villaça, a série traz “manipulações narrativas desde o primeiro episódio para demonizar a esquerda”. Ele é um dos que defende o cancelamento da assinatura do serviço de streaming como forma de não compactuar com a abordagem dada pelo seriado, apesar de usar outros fatores além desse para justificar o seu boicote.
Eu estou CANCELANDO minha assinatura da @NetflixBrasil. E ela está BANIDA da minha coluna Cinema em Streaming. https://t.co/eOnCrTzdLA
— Pablo Villaça (@pablovillaca) 24 de março de 2018
Já classificou a obra como “mentirosa e dissimulada”, afirmando ainda que o seu criador se tornou “um criador de notícias falsas”. Assim como Vilaça e outros críticos, ela também cita a atribuição, na série, da expressão “estancar a sangria” ao personagem que faz alusão à . Na vida real, a frase se tornou notória recentemente ao ser dita pelo senador em uma ligação interceptada na qual ele falava do impeachment de Rousseff como “um grande acordo nacional”.
“Na vida real, jamais deu tais declarações. O senador , líder do golpe, afirmou isso numa conversa com o delator Sérgio Machado, que o gravou e a quem esclarecia sobre o caráter estratégico do meu impeachment”, registra Dilma.
A mentira tem perna curta. E, agora, a mentira ganha as telinhas de tevê: “O mecanismo”, na Netflix. pic.twitter.com/cU1SO5WUcQ
— (@dilmabr) 26 de março de 2018
Dilma cita ainda problemas de cronologia dos fatos apresentados na série, o que também poderia levar a uma compreensão equivocada da história. Ela cita especificamente o chamado Escândalo do Banestado, que começou em 1996, apesar de a série colocar como início o ano de 2003, o primeiro de como presidente.
Outras reações
Questão de princípio. #CancelaNetflix . Ela não é tudo isso. Existem outras opções melhores @mubi . Indicação de quem é especialista @pablovilaca
— Vânia L. da Silveira (@vanialuciadasi4) 26 de março de 2018
Quando uma gigante como a @NetflixBrasil usa de desonestidade igual de correntes do WhatsApp. #CancelaNetflix
— Nate, the Great (@Nathan_Maximoff) 26 de março de 2018
@NetflixBrasil pare de querer fazer politicagem. Vcs sabem q "estancar a sangria" foi dito pelo Jucá. #CancelaNetflix
— Lauri Rene (@lauri_rene) 26 de março de 2018
A Netflix foi de uma desonestidade intelectual que chega ate a ser ridicula. É uma pena, mas vamos cancelar. #cancelanetflix
— Telma (@telmamello) 25 de março de 2018
#CancelaNetflix Democracia mesmo. Continua quem quer, cancela quem quer. Cancelei. pic.twitter.com/hpjICKk1V0
— Eli Maciel (@eli_maciel_b) 25 de março de 2018
A assinatura foi cancelada há 15 minutos.
— Hugo Romão (@RomaoHugo) 25 de março de 2018
Valeu!#BoicoteNetflix #CancelaNetflix
Viu @NetflixBrasil ??
“Debate boboca”
Diante de tanto rebuliço, nada mais justo do que ouvir o criador da série sobre detalhes que, na visão de muitos, podem prejudicar a compreensão dos fatos. Para José Padilha, porém, a polêmica em torno de atribuir a expressão de Jucá ao personagem de “é um debate boboca”.
“Não escrevi o roteiro do episódio 5 [onde está a fala], nem o dirigi. O roteiro foi de Elena Soárez e a direção foi de Marcos Prado. Seja como for, chequei os diálogos. São diferentes. Não houve transcrição por parte da Elena (...)”, afirmou Padilha em entrevista ao site Observatório do Cinema. “O fato de o Jucá ter usado a expressão ‘estancar a sangria’ não a interdita. Escritores continuam livres para fazer uso dela.”
Padilha denfedeu ainda que quem faz essa crítica "nao entendeu que a série é uma crítica ao sistema como um todo e nao a esse ou àquele político ou a qualquer grupo partidário." Apesar de parecer não se importar com possíveis interpretações errôneas originadas da alteração, o cineasta fez questão de pedir que as suas respostas a James Cimino, do OC, não fossem editadas.
A quem acusa a série de distorcer fatos e possivelmente causar ruídos, o criador de "O Mecanismo" é enfático ao relembrar a mensagem que abre cada um dos oito episódios do seriado. “Na abertura de cada capítulo da série avisamos que fatos foram alterados para efeitos dramáticos. Para o pessoal que sabe ler, portanto, não há ruído algum”, explicou.