A presidenciável Manuela d'Ávila (PCdoB) esteve na Campus Party Brasil nesta sexta-feira (2) para participar de um painel sobre a neutralidade da rede. O TecMundo aproveitou a oportunidade para conversar com ela e entender um pouco mais do que a candidata pensa sobre a questão.
Todos os presidenciáveis foram convidados ao debate pela Campus Party; apenas Manuela apareceu
Para refrescar a sua memória, de maneira resumida, o fim da neutralidade de rede permite que as operadoras discriminem o tráfego de qualquer site ou serviço em suas redes a fim de obter benefícios financeiros. Ou seja: você vai pagar valores diferenciados para utilizar serviços específicos, caso o fim da neutralidade aconteça.
Há algumas semanas, Gilberto Kassab (PSD), atual ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, comentou que o Brasil não tem como pauta o fim da neutralidade "por agora". Contudo, rumores da indústria indicam que operadoras já fazem lobby para que a neutralidade vá por água abaixo.
Encontramos com Manuela d'Ávila, candidata do PCdoB, durante a tarde desta sexta-feira. Agora, você confere, na íntegra, o nosso papo sobre a questão que pode afetar todos os cidadãos brasileiros conectados.
Manuela D'Ávila
TecMundo: Em primeiro lugar, qual é o motivo da visita aqui na Campus Party?
Manuela D'Ávila: Eu vim participar de um debate sobre neutralidade, após convite da própria Campus. A ideia era que todos os pré-candidatos à presidência fizessem um debate sobre a questão, mas eu fui a única que veio. Eu acho que a gente precisa fazer um esforço para transformar isso em um debate nessa eleição. Esse é um tema que interessa todo mundo por várias razões, interessa ao Brasil. Precisamos sair com candidaturas engajadas na construção e na proteção de dados.
TecMundo: E onde estão os outros candidatos que foram convidados?
Manuela D'Ávila: Eu não sei [risos]; dizem que eles têm medo dessa galera e dessa juventude.
TecMundo: Você acredita que o Brasil está mirando o fim da neutralidade de rede?
Manuela D'Ávila: Eu acho que sim, e por duas razões: primeiro, sempre existiram muitos interesses em torno disso, os interesses das teles [empresas de telecomunicações] são milionários, fazem muita pressão. E esse governo agora é um governo refém, refém dos interesses internacionais. Então, de um lado as corporações que querem esse modelo de negócio aqui dentro já queriam antes; e de outro lado, as grandes empresas, das grandes economias do mundo que são representadas pelas políticas de seus governos, querem acabar com as oportunidades de negócios para a juventude brasileira.
O Brasil precisa da indústria, precisa da indústria criativa
É bom que a gente compreenda que existem duas dimensões da discussão. Essa individual, de garantir o acesso de todos a tudo, mas existe uma dimensão estratégica do desenvolvimento do país.
Quando a gente fala de tecnologia das coisas, por exemplo, que pode existir um carro autônomo, as grandes montadoras que não são nacionais e dois jovens do interior do RS, SP ou BA, poderão competir na rede em pé de igualdade, a gente está abrindo oportunidade de desenvolvimento para o Brasil.
O Brasil precisa da indústria, precisa da indústria criativa, que é a indústria 4.0, para ajudar o país.
TecMundo: Pensando especificamente no usuário de internet, como você enxerga o fim da neutralidade? Como isso poderá ser algo ruim?
Manuela D'Ávila: Como eu sou uma pessoa de esquerda, eu digo que, em primeiro lugar, porque cria a internet dos poderosos e dos pobres. Isso é o oposto do que a internet se propôs a ser em sua origem.
A internet, embora não sempre, tem a perspectiva transformadora na comunicação porque ela garante que todas as pessoas se conectem. Ela permite que um cara faça um rap lá no Rio de Janeiro e faça um upload naquela plataforma do momento. A neutralidade permite também que novos negócios surjam; há menos de 10 anos ninguém esperava que a Netflix virasse o que virou. Como assim tem um monte de filme? [risos]. O fim da neutralidade impedirá o acesso dos usuários, claro que sempre os mais pobres.
TecMundo: A neutralidade de rede não anda sendo combatida de maneira efusiva pelos candidatos da direita; como você enxerga isso?
Manuela D'Ávila: Um cara lá do meu estado, Leonel de Moura Brizola, diria que são os "interésses". O fim da neutralidade tem ligação com os interesses de muitos poderosos internacionais e também com relação às teles e empresas de comunicação.
Todo o Estado tem uma participação determinante, o problema é que a galera não se informa sobre isso. Mentem muito na própria internet, não é?
TecMundo: O Brasil está polarizado politicamente, e a tecnologia, como podemos observar na plateia da Campus Party também, é majoritariamente composta por homens. Como você olha para isso e como é fazer parte desta discussão da neutralidade?
Manuela D'Ávila: Eu vim na Campus várias vezes. É uma galera muito jovem, e o lugar deles precisa ser o Brasil, não é? O Brasil precisa acolhê-los. Eu entendo a indignação deles com a situação. É muito difícil produzir tecnologia em um país que não investe na sua indústria e as oportunidades são diminuídas. É muito difícil. O problema é não compreender por onde se constroem essas saídas.
Essas saídas precisam acontecer. A gente pode pensar em dois países que têm muito desenvolvimento tecnológico: Estados Unidos e Coreia do Sul. Todo o Estado tem uma participação determinante, o problema é que a galera não se informa sobre isso. Mentem muito na própria internet, não é? Divulgam muitas notícias mentirosas, então passam a acreditar que as coisas caem do céu. É natural o investimento público.
Mas eu também não tenho medo. Me disseram que ali [plateia da Campus Party] havia algumas pessoas que votavam na extrema-direita, mas estava todo mundo ouvindo de boa. Eu acredito que seja uma galera que estuda muito, que se prepara muito e que busca o bem do Brasil.
- Esta entrevista contou com a colaboração do repórter Rafael Farinaccio
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