Depois de um longo período de silêncio, ontem à noite foi ao ar na NBC uma entrevista esclarecedora com Edward Snowden, o responsável pelo vazamento de documentos da NSA, a Agência de Segurança Nacional estadunidense. Esta não é a primeira vez que Snowden dá declarações sobre o vazamento, mas era inédita uma entrevista desse porte para uma rede de televisão mundial como a NBC.
Em 2013, veio a público a notícia de que o governo dos Estados Unidos espiona a vida online de cidadãos de várias partes do mundo, inclusive do Brasil. Um dos pontos críticos do relatório divulgado por Snowden é a participação de gigantes do setor de tecnologia na internet, como a Microsoft, que colaboram com tal prática.
Para realizar o programa, Snowden conversou por quatro horas com o repórter Brian Willians em um hotel na Rússia, país que o “adotou” desde que os Estados Unidos caçaram seu passaporte. O TecMundo fez uma seleção dos temas mais importantes explorados durante a entrevista, em uma tradução direta das falas do acusado.
Sobre a Rússia e voltar para a casa
“Quando as pessoas me perguntam por que estou aqui, eu sempre respondo: 'Pergunte ao Departamento de Estado'. Eu nunca pretendi ficar aqui [na Rússia], eu tinha um vôo para Cuba e depois para a América Latina e fui detido porque o governo dos Estados Unidos decidiu revogar meu passaporte e me prender no aeroporto de Moscou.
Eu não acho que existam dúvidas de que eu quero voltar para casa. Quero dizer, desde o primeiro dia eu deixei claro que o que eu estou fazendo é para servir o meu país. Agora, se anistia ou clemência se tornarão uma possibilidade um dia, não sou eu quem pode dizer. Este é um debate que cabe ao público e ao governo fazer, mas, se eu pudesse escolher qualquer lugar no mundo para ir, esse lugar seria minha casa.”
Quando perguntado se ele ansiava por ganhar anistia, Snowden respondeu: “Minha prioridade não é comigo, mas sim me certificar de que estes programas de espionagem sejam reformados e que a família que eu deixei para trás, o país que eu deixei para trás, possam ser ajudados através das minhas ações. Eu farei tudo o que eu puder para continuar a trabalhar da maneira mais responsável possível, a dar prioridade a não causar nenhum mal enquanto eu servir ao bem comum.”
Snowden também afirmou que não teria um julgamento justo se voltasse aos Estados Unidos agora.
Sobre o seu papel na NSA
Snowden explicou que a descrição da mídia sobre ele, como um administrador de sistemas, ou como Barack Obama o chamou, hacker, são muito equivocadas. Para ele, seu trabalho o caracterizaria como um especialista técnico ou um espião que trabalhava para uma agência de inteligência dos Estados Unidos. Ele vivia e trabalhava no exterior disfarçado: “Pretendia trabalhar em um emprego falso, e tinha até mesmo uma identidade falsa que não era a minha”.
“O que eu fazia era colocar sistemas para funcionar para os Estados Unidos. Algo que eu fiz em vários níveis, desde aqueles mais baixos até sistemas ligados ao topo da hierarquia americana. Agora, o governo pode negar essas coisas; eles podem tentar dizê-las de uma maneira que pareça que eu era apenas um analista de nível baixo, mas o que eles estão tentando fazer é usar minha posição na minha carreira para distrair o público da totalidade das coisas descobertas por mim.”
“Apesar do meu asilo, eu não tenho nenhuma relação com o governo russo. Mesmo que eu quisesse dar a eles algum documento confidencial, eu não poderia porque não trouxe nada comigo na minha viagem. E eu não poderia acessá-los remotamente também.”
Sobre a NSA
Snowden estava na NSA durante os ataques de 11 de setembro e vivenciou de perto as mudanças sofridas na segurança nacional durante este processo. “Ainda que ameaças terroristas não devam ser dispensadas, elas não podem ser usadas para explorar as pessoas justificando programas ilegais de vigilância.”
“Nós não podemos abrir mão da nossa privacidade, nós não podemos abrir mão dos nossos direitos.” Brian Willians em seguida informou que eles puderam comprovar que Snowden tentou contatar os seus superiores na NSA antes de ir a público com as denúncias de espionagem pessoal.
“Sobre os registros da NSA, eles têm cópias até agora no Escritório do Conselho Geral de emails e cartas minhas levantando dúvidas e preocupações com a interpretação legal da autoridade da agência. Eu levantei estes questionamentos, não apenas oficialmente por escrito, mas para os meus superiores e para os meus colegas em mais de um escritório. Eu o fiz no Forte Meade, eu o fiz no Havaí, e muitos funcionários também ficaram chocados com estes programas. Eles nunca tinham ouvido a respeito deles, e aqueles que conheciam me disseram que eu estava certo, mas que, se eu revelasse alguma coisa, iriam me destruir. Eu avisei que estavam quebrando direitos civis e em resposta me mandaram calar a boca.”
Sobre a sua decisão de vazar os documentos da NSA
Segundo Snowden, ele não possui nenhum remorso do que fez, e para ele o resultado do vazamento foi produtivo, especialmente graças à obrigação do governo de mudar a forma como a NSA trabalhava com a população civil. Ele efetivamente transformou a maneira como o público enxerga esta agência de inteligência e até mesmo o congresso e o presidente.
“É importante lembrar que as pessoas não colocam fogo nas vidas e queimam tudo aquilo que amam sem razão. Eu ganhei agora a habilidade de dormir com a consciência tranquila e me sinto confortável sabendo que fiz a coisa certa.”
Em resposta à entrevista concedia por Snowden, o Secretário de Estado John Kerry respondeu: “Para um cara supostamente inteligente, essa foi uma resposta muito idiota, francamente... Edward Snowden é um covarde, um traidor. Ele traiu o seu país e deveria encarar as consequências. Eu o desafio a ser homem o suficiente de voltar para os Estados Unidos”.
De acordo com o Secretário, o vazamento dos documentos da NSA deu informações valiosas aos terroristas e atrapalhou o esforço de inteligência americano. “Se este homem é um patriota, ele deveria ficar nos Estados Unidos e enfrentar o tribunal. Patriotas não vão para a Rússia, eles não procuram asilo em Cuba ou na Venezuela, eles lutam pelo que acreditam aqui...”
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