(Fonte da imagem: Semana Online)
Uma das principais características da internet é seu habitat do anonimato, ou melhor, da correspondência virtual que as pessoas adotam para se comunicar. Como não há um contato pessoal, de pele, de tato, de olho no olho, a sensação de poder que isso dá aos internautas é algo que vive no nosso subconsciente e nem percebemos.
É como se soubéssemos que existe esse poderio “virtual” dentro de nós, ainda que adormecido. Afinal, a liberdade de expressão é uma das bandeiras erguidas pela internet, não é mesmo? Pois me diga: será que você teria a pachorra de proferir certos dizeres se estivesse numa situação real?
Ao fazer um panorama pelos diversos canais informativos da internet, constatamos que existe uma verdadeira “guerra” em que os mais diversos perfis estão presentes – e a tecnologia é um segmento especialmente visado por esses sedentos comentaristas, que se enquadram em personalidades bastante, digamos, peculiares.
Para fazer um balanço desses radicais que cada vez mais proliferam internet afora, separamos quatro perfis que, numa situação real, seriam no mínimo engraçadíssimos. E agressivos, diga-se de passagem. Mas às vezes a brabeza é tão absurda e sem nexo que isso tem até o ar de sua graça, não é mesmo?
As seguintes figuras carimbadas batem ponto nessas situações: os fanboys; os defensores dos fracos e oprimidos (aqueles que criticam quem compra algo caro enquanto tem muita gente passando fome, mas fazem a mesmíssima coisa); os metidos a atualizados (para eles, tudo é “old”) e os que querem ser os primeiríssimos a soltar um comentário “bomba” só para ver o circo pegar fogo entre a galera – o cara que joga a batata quente e sai correndo. Será que existe alguma corrida aqui?
(Fonte da imagem: Todo es muy raro)
Fanboys: Android vs. iOS, Sony vs. Microsoft etc.
É até estranho pensar que a definição de “fanboy” não é autoexplicativa. Na internet, o termo parece uma bomba arremessada no meio de discussões. Quando um acende o pavio, o restante começa a se manifestar e as brigas em torno de uma marca rolam soltas. E a palavra é mais antiga do que imaginamos: ela data da década de 1920, mas está em disparada ascensão de alguns anos para cá – muito por causa da internet, cuja comunicação é facilitada e “libertária”. O termo acabou se infiltrando no segmento tecnológico e na cultura geek.
Se fôssemos separar as categorias em classes de RPG, os fanboys podem ser facilmente considerados os mais agressivos. Vamos a uma breve reflexão: é claro que alguém pode ter preferências por marcas, mas defendê-las a unhas e dentes a ponto de brigar com alguém por causa disso? Chega a ser cômico. Mas devemos nos lembrar do seguinte: tecnologia e entretenimento estão intimamente ligados. A partir do momento em que a diversão vira uma guerra sanguinária porque a marca X é melhor que a Y, temos Pokémon X e Y. Brincadeira: temos fanboys se digladiando por uma marca que está nadando em dinheiro enquanto nós estamos pegando metrô às 6 da tarde com um iPhone ou Samsung Galaxy na mão e um escudo de Esparta na outra.
Agora vem a pergunta de 1 milhão de reais: será que esses defensores e protecionistas de suas marcas iriam se comportar da mesma forma na vida real? Pode ser daí que surjam esses “loucos inspirados por GTA”, como a mídia grande gosta de citar, quando alguma situação criminosa urbana ocorre em grandes metrópoles.
Outra situação imaginável é um vendedor de loja presenciando de dentro do estabelecimento (e às gargalhadas) dois fanboys brigando do lado de fora dizendo que “o Android é X e por isso é melhor” ou “o iOS é Y e por isso é melhor”. Talvez as empresas também estejam vendo a situação rolando de rir.
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
O defensor dos fracos e oprimidos: “Você comprando essa TV com tanta gente passando fome”
O engraçado da internet é que alguns perfis surgem e, com o tempo, vão se materializando até se tornarem figuras carimbadas nos comentários. Uma dessas figuras é o defensor dos fracos e oprimidos, aquele cidadão que vem com todo um discurso moralista dizendo que o Brasil é isso, aquilo e aquele outro e que é um absurdo gastarmos zilhões numa TV ou num dispositivo de ponta enquanto muita gente passa fome.
É claro que até existe razão no discurso, ou melhor, há propósitos na realidade (principalmente brasileira) para isso. Só que uma coisa é a tese, e outra é a prática: basta olhar os objetos pessoais desse “político” que certamente haverá um iPhone, Galaxy, Nexus ou qualquer outro aparelho de ponta. E, a menos que ele viva no tempo da pedra, naturalmente terá uma bela TV LED, LCD ou plasma em sua sala.
Mas isso não justifica o comportamento agressivo que alguns discursistas têm. Será que eles se comportariam assim pessoalmente? O engraçado é que, em resposta à abordagem política desse defensor, alguns rebeldes apelam para a foto de perfil do Facebook que geralmente aparece nos comentários. É quando alguém chega e fala: “Você aí comprando esse iPad e um monte de gente passando fome”, aí vem outro em resposta logo abaixo e solta um “Véi, olha essa sua foto, tem um armário enferrujado atrás de você, o que que você tá falando aí”. Triste, mas acontece. É o que um discurso moralista pode provocar...
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
Tudo é “old”. Não importa a novidade, não importa o recurso novo: alguém vai achar pelo em ovo para criticar
Eis aí outro termo que vem ganhando cada vez mais notoriedade na internet: “old”. Apesar de podermos interpretar a palavra literalmente em sua tradução direta (“velho”), ela também se aplica a internautas que, de alguma forma, são contrários a qualquer novidade ou opinião alheia. Sabe o “do contra”? O “hater”? É quase isso aí.
Tudo é “old” para esses rebeldes internautas. Eles enxergam o mundo com um “não” prontinho para sair da manga em qualquer discussão – acalorada ou não. Novo iPad? “Old, tá igual ao antigo”. Novo Samsung Galaxy? “Bah, old, mudou pouca coisa”. Independentemente da preferência pela marca, esses críticos mantêm o radar ligadíssimo para o “não”.
Agora, que é engraçado imaginar a situação pessoalmente, isso é. Imaginem comigo um humilde vendedor começando todo um discurso de venda coreografado sobre um determinado produto e logo de cara tomar um “old”. Que rispidez por parte do cliente! É por isso que muitos se relegam da sociedade para uma tela de computador a fim de exuberar esse comportamento – que é bem deselegante, diga-se de passagem.
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
Comentei primeiro! Cheguei antes! Joguei a bomba, segurem aí para eu ver o circo pegar fogo
Esse é aquele que gosta de acender o pavio. Jogar lenha na fogueira. Mexer no ninho de cobras. Jogar a batata quente na roda e sair correndo ou simplesmente transbordar ansiedade ao ser o primeiro em qualquer coisa – inclusive comentar notícias e matérias na web.
Na verdade, a ansiedade é algo que faz parte da natureza humana. Todos nós temos um pouquinho desse sentimento. Mas a obsessão é um fator que foge um pouco do controle daqueles mais fervorosos.
É até conveniente fazer aqui uma analogia ao lançamento dos vindouros PS4 e Xbox One. Lá nos EUA, existe uma ação comum em lançamentos bombásticos assim chamada “Day One”, isto é, o puro e simples fato de você ser um dos felizardos a adquirir o aparelho no primeiro dia de venda, período em que várias lojas do varejo americano iniciam suas atividades a partir da meia-noite. O mesmo pode ocorrer com smartphones e outros dispositivos.
Dizem que brasileiros, principalmente paulistanos, “gostam de fila” e entram em uma sem ter a menor pista do destino dela às vezes. Numa conversão da internet na vida real, será que você sairia correndo na frente de todo mundo para apressadamente fazer seu pedido ao garçom e decretar o título de “primeiro”? Ou chegaria a um bar antes de ser aberto pelo próprio dono e ficar na porta só para declarar “primeiro”? Ou, ainda, estar numa balada lotada e chegar ao banheiro antes de todo mundo sem ter prestado atenção na sinalização? A pressa é inimiga da perfeição – e é natural que você esteja desesperado de aperto na vida real, diferentemente do habitat na internet.
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
Essas são algumas das situações mais comuns do mundo virtual que, na vida real, são absolutamente bizarras e não plausíveis. Existem muitas outras que poderíamos exemplificar: os que criticam o visual de alguém numa foto nova (“ficou horrível, esquece essa foto”), os que soltam comentários aleatórios completamente desvinculados do assunto (“saudades do Cirilo da novela Carrossel” no anúncio de uma nova TV) e muitos outros dizeres que, ao vivo, certamente não seriam proferidos.
E você, transborda toda a sua sinceridade virtual para a vida real nessas ou em outras situações?
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Atenção: este artigo faz parte do quadro "Erro 404", publicado semanalmente no Baixaki e Tecmundo com o objetivo de trazer um texto divertido aos leitores do site. Algumas das informações publicadas aqui são fictícias, ou seja, não correspondem à realidade.
Ilustrações por: Andre Tachibana
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