O tempo, como o conhecemos, não existiu desde sempre. Segundo a ciência, a teoria mais aceita é que ele surgiu logo após o Big Bang, ocorrido há aproximadamente 13,8 bilhões de anos. Mas há muito além do tempo: na física quântica, há pesquisadores que estudam o conceito de tempo negativo.
À primeira vista, o tempo negativo pode parecer relacionado à ideia de viagem no tempo, especialmente no sentido de retornar ao passado. Contudo, a interpretação da ciência é bem diferente.
Esse termo está associado a teorias na física quântica que exploram possibilidades matemáticas, como partículas que se comportam como se estivessem ‘voltando no tempo’. Por exemplo, algumas interpretações sugerem que, em certos contextos, poderia existir um estado ‘anterior ao zero’ em termos de referência temporal, mas isso ainda não foi comprovado.
Em um novo estudo publicado na plataforma de pré-impressão arXiv, pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, afirmam ter realizado experimentos quânticos que indicam que o conceito de tempo negativo pode ter um fundamento real. Ou seja, talvez não seja apenas uma teoria abstrata.
O artigo sugere que esse conceito possui um fundamento tangível e demanda estudos mais aprofundados para uma compreensão clara do tema. Segundo os pesquisadores, a investigação destaca uma característica fascinante da mecânica quântica, mas não traz nenhum tipo de mudança revolucionária para a área.
É importante destacar que o estudo foi divulgado apenas em uma plataforma de pré-impressão, o que significa que ainda não passou pelo processo de revisão por pares e nem foi aceito por nenhuma revista científica. Além disso, muitos especialistas manifestaram ceticismo em relação aos resultados apresentados pela pesquisa.
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"Isso é algo complicado, até mesmo para nós discutirmos com outros físicos. Somos frequentemente mal interpretados. Fizemos nossa escolha sobre o que acreditamos ser uma forma produtiva de descrever os resultados. Sendo honesto, no momento não vejo um caminho claro entre o que estamos investigando e aplicações práticas. Vamos continuar pensando sobre isso, mas não quero criar falsas expectativas", disse o professor da Universidade de Toronto e um dos autores, Aephraim Steinberg.
Tempo negativo
Assim como o emaranhamento quântico, que permite que duas partículas compartilhem o mesmo estado independentemente da distância, o tempo negativo é uma característica peculiar da física quântica. E como já foi citado, o termo não tem nenhuma relação com a viagem no tempo.
Conforme os cientistas que pesquisam o tema, o tempo negativo está relacionado a um fenômeno observado em experimentos com fótons (partículas de luz) ao atravessarem determinados materiais. A teoria sugere que, nesses casos, a luz parece emergir do material antes mesmo de entrar nele.
Isso não significa que o tempo esteja realmente ‘andando para trás’, mas sim que os fótons se comportam como se surgissem antes de sua entrada no material. Em outras palavras, o tempo negativo é apenas um termo usado para descrever a teoria segundo a qual a luz aparenta sair de um material antes mesmo de entrar completamente, devido à interação entre os fótons e as propriedades específicas desse material.
A luz utilizada nesses experimentos funciona como pacotes de ondas, compostos por várias ondas individuais com diferentes comprimentos sobrepostos. Dessa forma, mesmo em um único ponto de luz, múltiplas ondas estão atuando simultaneamente. O tempo negativo está justamente relacionado a distorção desses pacotes de ondas.
Apesar de parecer uma reação impossível, especialistas afirmam que esse fenômeno, hipotético, não viola as leis da física. No geral, o conceito tem mais relação com a distorção das ondas de luz, não com uma inversão real do tempo.
“Para entender a questão do tempo negativo, primeiro é necessário falar sobre o que é um fóton. Você pode pensar que um fóton é uma única onda, mas isso significaria que ele se estende por todo o espaço. No entanto, os fótons que usamos em laboratório não são assim. Eles são o que chamamos de pacote de ondas”, a física alemã Sabine Hossenfelder explica em um vídeo no YouTube.
Comprovação do tempo negativo?
Sob a liderança da pesquisadora Daniela Angulo, a equipe conduziu diversos experimentos utilizando lasers para direcionar partículas de luz por meio de materiais específicos. O interesse inicial em explorar o tema surgiu em 2017, quando Steinberg decidiu investigar a interação entre luz e matéria.
Após alguns anos de trabalho, a equipe conseguiu desenvolver os equipamentos necessários para realizar os primeiros testes. Durante os experimentos, o laser foi direcionado mediante uma nuvem de átomos de rubídio ultrafrios; após uma análise detalhada dos resultados, os pesquisadores identificaram o suposto fenômeno do tempo negativo nessa interação.
"Um atraso de tempo negativo pode parecer paradoxal, mas o que significa é que se você construísse um relógio "quântico" para medir quanto tempo os átomos estão gastando no estado excitado, o ponteiro do relógio, sob certas circunstâncias, se moveria para trás em vez de para frente. Posso garantir que ficamos completamente surpresos com essa previsão", disse outro co-autor do estudo, Josiah Sinclair.
Para Hossenfelder, o experimento não está relacionado à passagem do tempo ou ao conceito de tempo negativo. Ele simplesmente descreve como os fótons se deslocam por meio de um meio e como as fases do pacote de ondas se modificam nesse processo.
Segundo a física alemã, o estudo deveria adotar um nome diferente, e não ‘tempo negativo’. Inclusive, o próprio Steinberg reconheceu que a escolha desse termo para o artigo gerou a controvérsia e as reações negativas da comunidade científica.
Com os avanços na pesquisa em mecânica quântica, a relação dos fótons com a matéria têm despertado cada vez mais interesse entre os cientistas. Quer saber mais sobre esse assunto? Aproveite para entender como fótons mais rápidos que a luz desafiam a ordem do tempo. Até a próxima!