Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Adequação para algo, é o significado de fitness. Aplicado à saúde, fitness significa “estar em boa forma física”. A onda fitness atual se caracteriza por um movimento realizado por pessoas que tentam (se) promover saúde, principalmente via redes sociais, através de um estilo de vida ativo, com exercícios físicos, boa alimentação, sono adequado, entre outros.
O fitness nas redes sociais nunca esteve tão em alta. Semanas atrás escrevi sobre o “ego lifting”, mas essa é apenas uma das vertentes do movimento que tem acontecido. Jamais se falou tanto em exercícios, treinos, músculos e saúde, por tanta gente.
Mas será que realmente estamos promovendo saúde de maneira abrangente e equilibrada ou na verdade estamos impondo comportamentos que julgamos mais adequados a partir de nossas experiências pessoais?
Para que possamos superar o discurso superficial baseado em nossa própria vida para motivar pessoas a melhorarem comportamentos, precisamos andar de mãos dadas com a ciência. E ela é esmagadora quando nos mostra que exercício faz bem à saúde, assim como sono e alimentação adequados, caracterizando um estilo de vida ativo.
A onda fitness tenta popularizar o exercício físico, porém não podemos perder a premissa básica de que a maioria da população não tem o treino como prioridade em seu dia e nem quer ser atleta, apesar das inspirações dos influenciadores digitais. Não é à toa que pesquisadores tem demonstrado que na verdade as pessoas falam que não tem tempo para exercícios, a partir de uma percepção de falta de tempo e não uma barreira real de tempo (na maioria dos casos), e que isso acontece por não gostarem de exercícios.
Quais os impactos da onda fitness promovida nas redes sociais sobre o nosso comportamento?Fonte: Getty Images
A cultura da máxima performance e produtividade também atingiu esse segmento, ou seja, treinar virou uma obsessão, algo que seria inegociável para se obter o corpo desejado ou imposto pela sociedade. Algo que está longe de se movimentar por simplesmente seguir um instinto natural da nossa espécie, como para se divertir.
A exacerbação de um padrão estético considerado ideal, resulta em uma busca incessante das pessoas pelo padrão vigente e consequentemente insatisfação corporal e distúrbios e transtornos de imagem corporal, acarretando alterações nos comportamentos. Como a vigorexia, transtorno que acomete principalmente homens que se veem pequenos e fracos, apesar da notável massa muscular.
Publicações motivacionais nas redes sociais podem ser responsáveis, pela cultura fitness. Fonte: Getty Images
Na literatura já temos termos descrevendo o fenômeno: “Instabod”, simbolizando “o corpo perfeito de Instagram”. Como consequências notamos o aumento do uso de esteroides anabolizantes, na busca por acelerar o processo de ganho de massa muscular.
Temos comunidades formadas dentro do movimento fitness, com destaque para o pessoal do fisiculturismo e CrossFit, mas outras vertentes aparecem como os corredores e praticantes de Yoga. Esse apoio e suporte social via formação de comunidades é importante, somos seres altamente socializáveis e senso de pertencimento faz diferença.
O ponto crítico pode ser a motivação para o comportamento. Tradicionalmente, nos motivamos inicialmente para exercícios de forma extrínseca, ou seja, queremos as consequências dos exercícios, como estética e saúde. Tais motivações não tem se mostrado suficiente para que mantenhamos a prática das atividades regularmente, pois são distais e dependentes de muitos outros fatores, além da prática. Para ter saúde e ganhar massa muscular, não basta apenas treinar.
- Leia mais: Saiba aqui como se motivar para exercícios
A cultura fitness é uma indústria bilionária que infelizmente se distancia cada vez mais das evidências científicas. Os suplementos alimentares ilustram bem esse fenômeno, em que a indústria está na frente da ciência, quando lança produtos e posteriormente a ciência, através de experimentos controlados, corre atrás para testar a eficácia.
Os exercícios não são diferentes, conhecemos poucos pesquisadores e muitos influenciadores, ou seja, pessoas baseiam seus treinos em relatos de caso dos atletas que vão a podcasts famosos ser perguntados sobre sua rotina. Assim como modalidades de exercício com forte marketing, mas baixa comprovação científica dos seus efeitos.
O fato é que dada a complexidade de um comportamento como ser ativo fisicamente, e apesar de nossa crença de ser capaz de realizar os feitos mostrados pelos influenciadores, ser em parte alimentada por ver eles fazendo, o que chamamos de experiência vicária, assistir pode não ser o bastante. Existem inúmeras barreiras sociais que impedem que um bordão motivacional de rede social faça realmente diferença.
Posts motivacionais no Instagram realmente motivam?
Em artigo com o título #Fitness, que investigou o impacto do Instagram na aderência ao exercício e autoeficácia, universitárias indianas foram expostas a posts motivacionais na rede social, seguido de exercícios, enquanto outro grupo serviu de controle e apenas treinou sem a exposição ao Instagram. Embora a hipótese das autoras fosse favorável ao Instagram, isso não aconteceu. A exposição ao Instagram não aumentou a aderência aos exercícios, pois não houve diferença na manutenção ao exercício entre os grupos, ao longo das 2 semanas.
Assim como tudo na vida, filtro e moderação são fundamentais. É preciso selecionar com cuidado os conteúdos que consumimos nas redes sociais, pois eles impactam no nosso comportamento, para isso senso crítico e letramento científico são necessários. A ideia não é apenas adotar projetos passageiros de saúde, mas sim conseguir manter um estilo de vida ativo ao longo dos anos.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/CEFID/UDESC). É autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos, e apresenta o programa Exercício Físico e Ciência na rádio UDESC Joinville (91,9 FM); o programa também está disponível em podcast no Spotify.
Fontes