*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Um dos fenômenos mais incomuns observados por muitas pessoas ao longo da história, inclusive durante a era moderna, é o dos objetos voadores não identificados (OVNIs). Esse é um tópico que têm despertado a curiosidade e o interesse de milhões de pessoas ao longo dos anos e, com frequência significativa, tem sido alvo de grande atenção também por parte dos veículos de mídia.
Embora a sigla OVNI tenha se tornado para muitos um sinônimo para extraterrestres e presença alienígena, o termo é, na verdade, bastante autoexplicativo e não indica em nada que o fenômeno decorra de uma inteligência não-humana. Trata-se tão somente de um objeto aéreo de natureza qualquer ou de fenômeno óptico não facilmente identificável ao observador. Por que, então, um OVNI causa tanto alvoroço?
Um suposto OVNI visto de uma fazenda perto de McMinnville, Oregon, em 1950Fonte: Science History Images/Alamy
Essa é a parte fácil de responder. Somos curiosos por natureza, somos ávidos por entender aquilo que se passa ao nosso redor. A maioria de nós, mesmo com uma experiência limitada de olhar para o céu, é capaz de reconhecer facilmente o que é um avião, o que é uma estrela ou planeta, o que é um fenômeno atmosférico corriqueiro, como raios ou nuvens em formatos esquisitos.
Alguns de nós, inclusive, adicionam a essa habilidade de reconhecimento artefatos modernos como foguetes, satélites artificiais e drones. Desse modo, sempre que algo não se alinha com alguma dessas coisas, faz todo sentido que nossa curiosidade seja aguçada.
O fenômeno OVNI se tornou assunto de grande interesse principalmente durante e após a Segunda Guerra Mundial, época em que o desenvolvimento de foguetes, mísseis balísticos e tecnologia de espionagem alcançava a um patamar sem precedentes.
Registro de um fenômeno celeste em Basiléia (Suíça) ocorrido em 1566Fonte: Domínio público
Embora existam registros seculares, o primeiro avistamento de OVNI bem conhecido da era moderna ocorreu em 1947, quando o piloto civil estadunidense Kenneth Arnold afirmou ter visto um grupo de nove objetos em alta velocidade perto do Monte Rainier, em Washington, enquanto pilotava seu pequeno avião.
Arnold estimou a velocidade dos objetos – que descreveu como tendo um formato de meia-lua – em vários milhares de quilômetros por hora e disse que eles se moviam “como discos saltando na água”. Nas reportagens dos jornais que se seguiram ao evento, foi afirmado erroneamente que os objetos tinham a forma de disco voador, fato que popularizou e eternizou o termo.
Piloto Kenneth Arnold e o desenho com a descrição do alegado OVNI observado por ele.Fonte: National Air Space Museum
Desde então, os avistamentos de fenômenos e objetos aéreos não identificados aumentaram exponencialmente e colocaram a população civil de muitos lugares do planeta em frenesi. Na segunda metade do século XX, as duas potências mundiais antagônicas durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética, criaram painéis governamentais para investigar tais avistamentos, principalmente devido à crença de que pudessem ser aeronaves estrangeiras e produto de tecnologia inimiga.
Estudos científicos posteriores desenvolvidos por meio dos relatos e registros fotográficos de observações de supostos OVNIs nos anos seguintes mostraram que mais de 90% coincidiam com eventos conhecidos: fenômenos astronômicos ou meteorológicos, avistamentos de aeronaves militares, pássaros, massas de gases quentes sob condições climáticas incomuns etc.
Alguns, entretanto, permaneceram sem explicação, fato que foi usado para dar suporte aos argumentos extraordinários que defendiam a presença de visitantes extraterrestres. Essa hipótese, embora defendida por alguns grupos sérios de ufologia, ganhou tons demasiado sensacionalistas com o passar do tempo e, desde então, tem encontrado pronta resistência pela maior parte dos especialistas e cientistas.
Cabe aqui um addendum: tal “resistência” não implica em arrogância científica, mas está associada a uma das ferramentas mais fortes e valiosas da humanidade; o método científico. Astrônomos, físicos e cientistas de áreas correlatas estão entre as principais pessoas do mundo que buscam vida fora da Terra (inclusive a vida inteligente) e existem inúmeros estudos e pesquisas sobre o assunto.
Acontece simplesmente que relatos de OVNIs variam muito em termos de confiabilidade. Observações a olho nu são facilmente enganos e relatos oculares tendem a ser enviesados por uma série de aspectos psicológicos. Até mesmo a detecção de sinais de radar de OVNIs, muito mais confiáveis em alguns aspectos, podem não conseguir distinguir bem objetos físicos de rastros de meteoros ou descontinuidades térmicas e estão sujeitos também à interferência de rádio.
Por vezes, é importante considerar cenários extremamente improváveis. Nenhuma possibilidade, por mais absurda que pareça, está imune à consideração científica. Porém, quando não conseguimos explicar algo que vemos, é fácil deixar a imaginação correr solta. É preciso, no entanto, confrontar nossa imaginação com a realidade física e, desde que nossas hipóteses possam ser submetidas a testes e verificações experimentais/observacionais, sempre teremos a capacidade de descobrir os segredos que o Universo ainda esconde de nós.
Nícolas Oliveira, colunista do TecMundo, é licenciado em Física e mestre em Astrofísica. É professor e atualmente faz doutorado no Observatório Nacional, trabalhando com aglomerados de galáxias. Tem experiência com Ensino de Física e Astronomia e com pesquisa em Astrofísica Extragaláctica e Cosmologia. Atua como divulgador e comunicador científico, buscando a popularização e a democratização da ciência. Nícolas está presente nas redes sociais como @nicooliveira_.
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