*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Não é só coisa de ficção científica. A busca por vida fora da Terra é algo bastante real para cientistas de todo o mundo. Utilizando toda tecnologia à disposição, como telescópios e espectrômetros, por exemplo, busca-se o que chamamos de “assinatura biológica”. Isto é, de maneira simplificada, elementos que só podem se fazer presentes numa atmosfera quando provenientes de processos que tipicamente ocorrem somente em seres vivos.
A busca por vida inteligente é um caso à parte. Nesse caso, a busca dos cientistas é pela chamada “assinatura tecnológica”. Partimos aqui, do princípio de que o desenvolvimento tecnológico é consequência da presença de vida inteligente em determinado local. Tal busca consistiria, por exemplo, na presença de satélites artificiais na órbita de planetas extraterrestres.
Imagem mostra representação de um satélite orbitando a TerraFonte: Shutterstock
Entretanto, um estudo de 2013 da universidade de Cádiz, na Espanha, afirma que, mesmo que encontrássemos hoje evidências de vida extraterrestre, nossa sociedade não estaria pronta para tal descoberta. O motivo dessa conclusão vai desde o conhecimento bastante limitado sobre astronomia apresentado pela maioria da população, até as inúmeras implicações sociais que algo dessa magnitude traria como consequência.
No estudo realizado com estudantes universitários, o professor e pesquisador Gabriel De La Torre mostra, por exemplo que, mais de 60% dos participantes acredita que a velocidade da luz (a maior possível de ser atingida por qualquer coisa em nosso universo) pode ser ultrapassada. Além disso, 56% dos estudantes acreditam que o termo “leucócitos”, que se refere às células conhecidas como glóbulos brancos presentes em nossa corrente sanguínea, é um termo referente à astronomia. Esses são apenas dois exemplos de como o conhecimento geral sobre astronomia é deficitário na sociedade atual.
De La Torre argumenta que a astronomia deveria fazer parte do currículo escolar, uma vez que, partindo de uma educação mais presente à respeito de questões de escala universal possibilitaria uma melhor compreensão acerca de nossa posição no espaço e, consequentemente, uma visão menos focada no ser humano e na Terra seria favorecida.
O que nos traz até as implicações sociais que seriam trazidas por uma descoberta como essa. Para citar apenas um exemplo, em muitas religiões o ser humano é colocado no centro do universo como sendo objeto de uma criação divina. A descoberta de vida extraterrestre, portanto, mesmo que microscópica traz incontáveis, e mesmo imprevisíveis, consequências para a validação dessas religiões por todo o mundo.
O físico e divulgador científico americano Carl Sagan, em seu livro Contato (Contact, 1985), que originou o filme homônimo de 1997, tenta abordar como a eventual comunicação com formas de vida extraterrestres inteligentes impactariam nossa sociedade. Na ficção de Sagan, a sociedade entraria em um período de convulsão, com líderes políticos e religiosos caindo na descrença, seguido de um período de maior compreensão cósmica com a visualização de uma sociedade global única.
Imagem do filme Contato mostrando a busca de vida extraterrestre com radiotelescópios. Fonte: Reprodução/Warner Bros
É difícil imaginar, mas na eventualidade da descoberta de vida inteligente fora da Terra, as guerras entre seres de uma mesma espécie por territórios e poder econômico dentro de um planeta compartilhado começam a fazer cada vez menos sentido. Na visão de Sagan, para um ser consciente vindo de outro planeta, provavelmente seria bastante difícil identificar e separar dois lados de um conflito exclusivamente humano.
Essa visão pode parecer otimista demais, mas é algo que vale a pena ser pensado. Diversos astronautas relatam uma compreensão da sociedade humana como algo único após retornarem de viagens espaciais. Tais viagens são normalmente financiadas por países específicos, mas os tripulantes afirmam, e não é difícil de imaginar, que nosso planeta visto do espaço é algo único e que, assim como na visão da ficção, quando nos colocamos dentro de um contexto de dimensões cósmicas, quaisquer conflitos ou resquícios de concepções antropocêntricas do universo ficariam, por falta de outras palavras, pequenos demais.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou
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