Um estudo publicado recentemente na revista científica JAMA Neurology aborda uma área ainda pouco estudada: o risco de doenças neurodegenerativas em ex-jogadores de futebol profissional. Citando uma frase de Pelé, cientistas da Universidade de Glasgow, na Escócia pesquisaram “o lado feio do jogo bonito”, e concluíram que a prevalência do risco depende da posição do atleta em campo.
Nesse sentido, os zagueiros, que possivelmente são os jogadores que mais cabeceiam a bola, apresentam um risco cinco vezes maior de desenvolver demência do que os atacantes e os goleiros. Além disso, o estudo afirma que, independentemente da posição em que atuam em campo, jogadores profissionais em atividade por mais de 15 anos apresentam um risco maior de doenças como Parkinson e Alzheimer do que a população em geral.
Embora essa elevação do risco de doenças neurodegenerativas tardias e demência já tenha sido objeto de pesquisa em atletas profissionais com exposição a impactos repetitivos na cabeça, como é o caso de ex-boxeadores e jogadores de futebol americano, esta é a primeira vez que se estuda a fundo as consequências neurológicas em um esporte com uma (suposta) baixa exposição da cabeça a traumas.
Cabeceadas ou cabeçadas?
De acordo com o estudo de Glasgow, ao se avaliar o risco de traumas cranianos, é preciso primeiramente considerar que o futebol é o esporte mais popular do mundo, com 270 milhões de jogadores atuando. Assim, cabecear a bola (o que chamamos de cabeceio) pode muitas vezes se transformar em uma cabeçada involuntária em outro jogador, no chão ou até na trave, com sérias consequências.
Citando um encontro realizado em 2017, sobre traumatismos cranianos no futebol, os pesquisadores disseram que a frequência de cabeceios no futebol aumenta na passagem do nível juvenil para o profissional. De acordo com os experts no assunto, “tanto a exposição geral a cabeçadas quanto a força do impacto gerado por elas foram consideradas relativamente baixas, mas com uma considerável variabilidade individual”, diz a pesquisa.
Jogadores de futebol disputam bola com a cabeça (créditos: matimix/Shutterstock)
Conclusões do estudo de Glasgow
Considerando que as forças lineares geradas pelo cabeceio da bola variam entre 5 g e 60 g, o que tornou inconsistentes as avaliações das sequelas, os cientistas de Glasgow realizaram uma pesquisa, sob a coordenação do professor William Stewart, que envolveu os registros médicos e atestados de óbito de 7.676 ex-jogadores nascidos na Escócia entre 1900 e 1977.
Segundo o professor Stewart, o cruzamento dessas informações com os dados da população em geral revelou que "o fator de risco de destaque para doenças neurodegenerativas no futebol é a exposição a traumatismo craniano e impactos na cabeça". Dessa forma, o estudo sugere que medidas de precaução devem ser adotadas para reduzir ou eliminar a exposição a impactos desnecessários na cabeça e gerenciar possíveis ferimentos ocorridos neste local.
O estudo avaliou apenas jogadores homens; os riscos do cabeceio nas jogadoras de futebol feminino, modalidade esportiva que cresce no mundo todo, ainda seguem desconhecidos.