É impossível um jogo que mistura Doom, Duke Nukem e Borderlands ser ruim
Sabe aqueles jogos que você deixa passar batido e, quando dá uma chance para ele, se surpreende bastante? Para mim, um desses títulos foi Shadow Warrior, um game de 2013 que pegou uma franquia esquecida e a transformou em um shooter com uma excelente pegada oldschool.
Tudo o que os nostálgicos e carentes dos FPS dos anos 90 querem está ali: humor escrachado, ritmo frenético e sem pausas, e mecânicas das antigas, como barra de vida que precisa de kit de primeiros socorros para ser restaurada. Shadow Warrior 2 saiu e confesso: fiquei com medo que o conceito de mundo aberto e da perspectiva procedural fosse genérico demais, porque já vi muitos casos nos quais as apostas foram altas e o resultado decepcionante. Felizmente, não é o caso aqui. Confira a análise completa:
Doom + Duke Nukem + Borderlands: tem como ser ruim?
Primeiro de tudo, sei que se trata de uma pergunta vaga e que pode ter inúmeras respostas negativas, mas vamos descontrair só para ilustrar o caso. Uma coisa é fato: a jogabilidade de Shadow Warrior 2 está tão sólida e rápida quanto a de seu antecessor, que acertou com maestria o ritmo de jogo, antes mesmo dos reboots de Doom e Wolfenstein.
O game é extremamente ágil e não te dá muito tempo para respirar: atirar, trocar de arma (há oito simultâneas), usar poderes de Chi (cura, habilidades de vento, terra e muitos outros), dar dashs em alta velocidade e usar armas brancas no processo é algo que é fácil de fazer, mas difícil de aperfeiçoar, mas em ambos os casos, muito divertido.
Agora vamos ao que interessa: qual é o sentido da pergunta doida ali no subtítulo? Vou explicar, mas não detalhar (os elementos esmiuçados virão logo abaixo). A jogabilidade é de Doom, conforme dito; a história e ambientação é à la Duke Nukem, com muitos diálogos escrachados e humor negro; e por fim, agora existe um sistema de looting semelhante ao de Borderlands.
História divertida ou dispensável, você escolhe
A primeira coisa que você precisa saber é que o game não tem uma história séria. Nem mesmo ele próprio se considera sério. Shadow Warrior não era assim e Shadow Warrior 2 muito menos. Sabe aquele lance de rir de si mesmo? É algo que o jogo consegue fazer muito bem. Se você está esperando uma narrativa densa, não vai encontrar aqui.
O roteiro utiliza a mesma estrutura do primeiro título: Wang, um mercenário com técnicas ninja/samurai deve resgatar uma pessoa (antes era um artefato) e, por reviravoltas inesperadas, acaba com um espírito dentro de si, que atormenta a sua mente com diálogos triviais e outros elementos-chave para a progressão da campanha, tudo com muito humor.
Wang é escrachado: bebe, xinga, zoa e é extremamente descontraído
Acontece o seguinte: a história é muito leve, descontraída e sem complexidade absurda. No maior estilo filmes de ação com muita zoeira, o intuito é passar um roteiro bem digestível e prazeroso, sem precisar de plot twists ou mistérios absurdos.
É possível aproveitar a trama de uma maneira bem gostosa, mas há uma grande sacada: se você quiser apenas fatiar demônios e partir para a porradaria, pulando tudo isso, também é possível, e não faz muita falta, não porque é totalmente dispensável, mas porque é simples o suficiente para que certos trechos passem batidos.
Todo o clima do game é no maior estilo Duke Nukem, mas com menos piadas pesadas e ultrapassadas dos anos 90 e mais humor escrachado e pastelão, que vão desde os diálogos, passando pelos eventuais dedos do meio que o protagonista mostra a diversos outros personagens, até às piadas zoadas e sem noção.
A história pode ser divertida para quem quer acompanhar
Rápido, fluido e frenético do jeito que a gente gosta
Aqui vai uma parte bem opinativa e pessoal na análise: eu adoro games com a jogabilidade rápida que os primeiros FPS trouxeram. Sou oldschool e amo um Doom, Duke Nukem, Shadow Warrior, Hexen, Blood e muitos outros títulos que contam com mecânicas rápidas. Nada contra Call of Dutys e Battlefields, mas experiências das antigas são bacanas para quebrar um pouco a rotina.
Infelizmente, trata-se de um gênero pouco explorado e esquecido no tempo. O próprio Wolfenstein: The New Order traz apenas alguns elementos clássicos. Se tem algo que Shadow Warrior 2 realmente brilha é nessa jogabilidade rápida e com pausas certeiras para retomar o fôlego, oferecendo uma boa dose de ação e exploração, iguais aos games antigos.
Porém, há muitos elementos modernos aqui, como experiência, pontos de skills, habilidades especiais e muito mais. Sem dúvidas, esse é o maior ponto positivo do game. O ritmo é perfeito para o padrão desse gênero de nicho. Em um momento você está retalhando demônios e no outro está buscando armas e dinheiro em casas abandonadas para aproveitar o sistema de loot (detalharei mais abaixo). Em outras palavras: você nunca se sente enjoado demais para matar monstros e nem entediado o suficiente para vasculhar o ambiente. Sempre há uma recompensa.
Os comandos são muito responsivos, as habilidades são bem distribuídas, há conteúdo novo a cada nova missão, existem quests secundárias que oferecem armas únicas como recompensa, colecionáveis, quick travel para evitar desgaste e muito mais. Essa é a grande sacada de Shadow Warrior 2: você sempre ganha algo novo que revitaliza a experiência antes dela ficar chata.
O game no geral conta com um mundo aberto, mas segmentado em partes (similar à Witcher 2). Você pode se teleportar entre as áreas, cumprir sidequests, coletar dinheiro para comprar novos equipamentos, adquirir experiência para conquistar novas habilidades e por aí vai. Você escolhe o que fazer.
Você tem poucos momentos para respirar em Shadow Warrior 2
Cooperativo à la Borderlands
Antes de falar do modo cooperativo online de até quatro pessoas, preciso citar outro ponto que Shadow Warrior 2 pega levemente emprestado de Borderlands: o sistema de loot. Apesar de ser similar e utilizar um elemento que muitos jogos compartilham, ele não tem a mesma profundidade ou complexidade.
Só que a questão é que aqui isso não é ruim. O game não pretende ser em nenhum momento uma cópia de Borderlands ou Diablo. As recompensas aleatórias servem apenas como um adicional, um toque extra para aumentar o replay, exploração e empolgação em repetir as mesmas ações que, convenhamos, podem ser bem repetitivas.
Há sidequests para conquistar novos equipamentos
Em suma, o sistema de loot não é o foco aqui, mas certamente ganhar umas armas mais legais com sidequests ou enquanto vasculha o cenário é bem legal. Você não terá a complexidade de ficar parado decidindo qual runa ou arma equipar, pois o foco aqui é justamente o contrário: nunca deixar o jogador esperando. Contudo, você ainda terá à disposição uma boa variedade de equipamentos para vasculhar nos níveis procedurais e um incentivo a mais para gostar do game.
Falando nisso, ter mapas criados aleatoriamente era algo que me deixava um pouco encucado. Nem sempre deixar a cargo da inteligência artificial é uma coisa boa, como já vimos em No Man’s Sky. Porém, Shadow Warrior 2 mescla ambientes fixos com alguns procedurais, semelhante a Diablo 3, e isso traz um level design excelente.
O modo cooperativo é, ao mesmo tempo, muito divertido e um pouco frustrante. Você pode ter a ajuda de até quatro jogadores, que compartilham a sua campanha, ou seja, tem à disposição o progresso que você liberou. Certamente, é muito mais legal partir para a zoeira com os amigos, e o que era rápido e dinâmico fica ainda mais atenuado.
Coop com amigos sempre é legal
Contudo, o que pesa um pouco aqui é a dificuldade. Se os seus colegas estiverem em um nível maior que o seu, tudo ficará bem mais fácil, pois não há um balanço. Se o oposto ocorrer, ou seja, eles estiverem em um nível abaixo (entenda como armas piores e menos habilidades upadas), você ainda consegue manter a jogatina igual ao single player.
Experiência audiovisual muito bem-feita
Shadow Warrior 2 brilha muito quando o quesito “visual” entra em cena para ser avaliado. Por se tratar de ser um jogo exclusivo para PC (por enquanto), certamente devemos mencionar que a qualidade gráfica varia de acordo com o hardware da sua máquina. Entretanto, todos os níveis visuais são belos e espetaculares.
Porém, se você tem um computador razoável, provavelmente conseguirá rodar tudo com pressets mais altos do que imagina e com um desempenho formidável. O game inova aqui e usa uma tecnologia da Nvidia chamada Multi-Res Shading, que é utilizada apenas em óculos VR até agora. Trata-se de uma ferramenta que deixa o centro da tela com resolução cheia e as bordas com resolução menor, pois o olho humano tende a não notar borrões nas regiões periféricas.
Os gráficos de Shadow Warrior 2 tem muitas, mas muitas coisas extremamente bem-feitas e de cair o queixo
Além de não atrapalhar em nada a jogabilidade, a resolução menor ajuda muito no desempenho, que ganha de 10 a 15 fps (em certas situações, pode ser ainda mais). Claro, se você tiver um PC de altíssima qualidade, é possível desativar essa opção e aproveitar 100% do que o jogo tem a oferecer. Há muitos elementos bonitos aqui, como efeitos de luz e shaders de água, que são de encantar os olhos.
As animações são bem fluidas, Wang recarrega as espingardas e demais armas de formas cômicas e variáveis. Até mesmo as perks que dão habilidades de mais velocidade no disparo das pistolas mudam a postura de disparo, pois o protagonista segura as armas de forma diferente. Os cenários são extremamente variados: em uma hora você está em pequenas vilas, em outra está em centros urbanos que parecem retirados do "Tron", com muito neon e tecnologia. Em outras palavras: há muita atenção aos detalhes.
A sonoplastia também conta com bastante destaque de todos os cantos. A trilha sonora tem músicas calmas com uma pegada oriental, mas na hora da ação é recheada de riffs pesados e melodias mais rápidas que ajudam no ritmo do game. Como curiosidade, deixo a sugestão de matar muitos coelhos pelo jogo para ver o que acontece. Spoiler: espere um black metal pesado quando a surpresa acontecer. A dublagem é pastelona, mas mais uma vez, isso não é problema aqui, pois é o intuito do título.
Vale a pena?
Shadow Warrior 2 provavelmente é aquele tipo de jogo que vai passar batido no seu radar. Se você é das antigas, talvez associe ao nome do clássico e deixe na lista para comprar mais tarde. Fica uma dica: pegue o quanto antes se você gosta de obras com gameplay mais rápido. O game é extremamente divertido e realmente surpreende bastante.
Isso quer dizer que todo mundo vai gostar? Certamente não. Como sempre ressaltamos aqui, análises são extremamente opinativas e pessoais, algo difícil de passar em um sistema numérico. O Vinícius, o redator que vos escreve, é muito fissurado em shooters oldschool e tem quase todos os FPS clássicos na Steam, como Shadow Warrior (clássico, de 1997), Hexen, Duke Nukem, Doom e pretende pegar em breve o Blood.
Isso significa que Shadow Warrior 2, um game que conta com muitos elementos clássicos dos antigões, com me certeza agrada e fica a recomendação. Mas mesmo se deixarmos de lado a preferência por jogos de tiro rápidos e leves, ainda teremos um game extremamente bonito, bem otimizado, com boa trilha sonora, combate melee de qualidade e muita diversidade de conteúdo, principalmente por conta das habilidades, armas e level design excelente.
Shadow Warrior 2 não é tão complexo quando Doom, tão sarcástico quanto Duke Nukem e tampouco tão focado em loot e multiplayer quanto Borderlands, mas a mistura de todas essas características cai muito bem. Certamente, matar demônios nunca foi tão divertido e é um prato cheio pra muita gente.
Categorias
- Gráficos de altíssima qualidade
- Extremamente bem otimizado no PC
- História leve e divertida
- Jogabilidade rápida, variada e excelente para amantes de FPS das antigas
- Level design soberbo, mesmo com seções procedurais
- Sistema de looting muito bem-feito
- Ritmo perfeito: nunca fica repetitivo demais e nem entediante demais
- Muita variedade de conteúdo, como missões, armas e habilidades
- Trilha sonora muito boa
- Multiplayer cooperativo é bom, mas poderia ter uma dificuldade adaptativa melhor
- Por ser mais amplo e abrangente, fica levemente aquém em ter uma história mais marcante
Nota do Voxel