O quão longe você iria para apagar os erros do passado?
Quantum Break deseja ser mais do que um simples jogo. Desenvolvido pela Remedy Entertainment — a mesma das séries Max Payne e Alan Wake —, o game parece querer conciliar duas facetas mostradas pelo Xbox One desde seu lançamento, conciliando na mesma experiência um jogo com grandes valores de produção e uma série de TV com bom orçamento e um elenco de qualidade.
O resultado é uma iniciativa que funciona bem, mas está longe de ser tão revolucionária quanto seus criadores gostariam de nos fazer acreditar. Mesmo assim, a maneira como os desenvolvedores conciliam a história com a maneira como ela é contada resulta em uma das melhores experiências que os donos do Xbox One (ou de um PC poderoso) podem ter atualmente.
Não isento de problemas técnicos e certas quedas de ritmo, o game consegue desenvolver muito bem aquilo a que se propõe. Apresentando um sistema de combate inteligente (embora um pouco repetitivo), Quantum Break é uma experiência que você vai querer viver pelo menos duas vezes — não exatamente por suas mecânicas ou pela coleta de itens, mas sim por seu roteiro, que consegue ter a coragem que falta em muitos jogos de grande orçamento.
Mudando a maré
A trama do game se inicia quando o protagonista é convidado por seu melhor amigo, Paul Serene, a testemunhar uma experiência programada para acontecer em uma universidade durante o período da madrugada. Em questão de poucos minutos, é revelado que o experimento envolve nada menos que uma máquina do tempo que permite viajar tanto para o passado quanto para o futuro.
Não demora muito até que as coisas saiam de controle e Serene se veja preso dentro da máquina, enquanto Jack — junto a seu recém-surgido irmão, Will — tem que escapar do exército particular da empresa Monarch Solutions. Em meio a esse caos, o protagonista se descobre capaz de usar poderes que manipulam o tempo-espaço para ajudar em sua fuga.
O jogo não demora muito para apresentar diversos conceitos que serão digeridos aos poucos conforme a aventura prossegue. Aparentemente, as ações ocorridas na universidade fizeram com que o tempo quebrasse e somente uma invenção de Will é capaz de corrigir o que está acontecendo.
Quando parece que tudo está correndo rumo a uma solução, surge no caminho dos personagens o chefe da Monarch: uma versão mais velha e cruel de Serene, que também tem o poder de controlar o tempo. Ele está disposto a convencer os irmãos a se juntarem a ele em seu plano que pode tanto salvar o mundo quanto condenar a humanidade a uma era de trevas — proposta que é prontamente negada pelos protagonistas, o que traz uma série de consequências trágicas.
Revelar mais da história de Quantum Break além dessa premissa inicial é um desserviço a qualquer pessoa que pretende se aventurar pelo game. O jogo é propositadamente confuso em seu início, revelando aos poucos as motivações de personagens e explicando situações que, em um primeiro momento, parecem simplesmente bizarras.
A aposta em uma trama baseada em viagens temporais e distorções especiais funciona muito bem, e os roteiristas sabem equilibrar bem momentos expositivos e horas em que é preciso certas coisas em aberto. Sem entrar muito em detalhes, digamos que algumas das contradições e círculos apresentados pelo roteiro vão ser tema de várias discussões nos próximos meses.
Também ajuda a existência de personagens como Beth Wilder, uma agente infiltrada na Monarch que parece conhecer profundamente Jack por algum motivo. Até mesmo figuras menos proeminentes ganham um bom espaço em tela caso você esteja disposto a ler os vários documentos espalhados pelas fases — além de revelar mais sobre a trama principal, eles ajudam a explicar melhor certas situações e fazer você ganhar mais simpatia pelos vilões (sem, no entanto, deixar de desprezá-los).
O jogo está completamente traduzido para o português brasileiro, com vozes bem reconhecíveis e um ótimo trabalho de sincronia. No entanto, ele peca em alguns momentos: durante nossos testes com uma cópia para review, os conteúdos relacionados a Alan Wake surgiram somente na língua inglesa, sem que houvesse qualquer legenda que ajudasse o jogador que não domina o idioma.
Série com qualidade profissional
Em alguns momentos-chave da trama, Quantum Break dá ao jogador a possibilidade de moldar certas escolhas que vão determinar o caminho seguido pelo resto do game. Na prática, o caminho até o final e certos acontecimentos importantes acontecem da mesma forma, mas o rumo até cada um deles difere bastante dependendo de suas ações.
Logo no início, por exemplo, você pode decidir como a Monarch Solutions vai lidar com manifestantes que testemunharam os incidentes na universidade. É possível usar seu exército pessoal para matá-los — o que vai causar a revolta da comunidade — ou manipulá-los e criar uma campanha de relações públicas que vai prejudicar a imagem de Jack Joyce.
Essa escolha simples traz consequências que surgem até o final da trama, seja na forma dos companheiros que vão auxiliar Joyce em seu caminho ou em detalhes como manchetes de jornais e transmissões de rádio. O sistema não é implementado de uma forma necessariamente elegante, mas serve bem ao propósito de mostrar o impacto que o jogador pode ter sobre esse mundo.
Após essas escolhas, o game assume o “modo série” e apresenta um episódio que mostra a consequência de seus atos e o que está acontecendo na Monarch enquanto Jack prossegue em sua jornada. Apostando em atores talentosos, a Microsoft e a Remedy criaram uma experiência que se encaixaria muito bem na programação de uma emissora como a HBO ou a AMC — deixando a vontade de que uma série completa seja lançada em algum desses canais.
Por padrão, a transmissão da série acontece por streaming (tal qual o Netflix), mas há a opção de baixá-la completamente para o HD do Xbox One. No caso da versão digital, os episódios — acompanhados de sua dublagem oficial — ocupam nada menos que 75 GB, então é bom contar com uma conexão veloz caso você decida transferi-los.
A Remedy soube dosar bem a proporção de tempo em que você joga com a duração dos episódios. No entanto, por mais que as cenas mudem dependendo de suas escolhas, é difícil não encarar a decisão da empresa de investir em um seriado mais como uma alternativa às cenas de corte tradicionais do que como algo realmente revolucionário do ponto de vista narrativo.
Na nossa experiência, os servidores de transmissão usados pela Microsoft apresentaram algumas instabilidades e não foi comum ter que lidar com episódios que eram interrompidos frequentemente. No entanto, como estávamos com uma cópia de review pré-lançamento, é bastante provável que a companhia reforce seu sistema a tempo do lançamento oficial do game.
Lembre-se de rebobinar
Quantum Break mantém a tradição da Remedy Entertainment de construir sistemas de jogabilidade no mínimo inventivos. Se no passado a empresa popularizou o efeito “bullet time” em Max Payne, aqui ela aposta em um sistema de manipulação temporal para entregar algo que vai além de um mero jogo de ação.
O título oferece um sistema em que é possível carregar três tipos de arma: uma pistola, variações de metralhadoras leves e uma opção mais pesada (que pode ser uma metralhadora ou uma carabina). Cada opção se mostra adequada a um tipo específico de inimigo, sendo que o jogo oferece quantidades generosas de munição para que você nunca tenha que se preocupar em encontrar maneiras de se defender.
No entanto, a parte mais interessante fica por conta dos poderes que Jack desenvolve conforme a aventura progride. Inicialmente ele é capaz de desviar de disparos e projetar um escudo que barra as balas inimigas temporariamente, mas não demora muito tempo até que ele consiga causar explosões e correr em velocidade extrema pelos ambientes.
O game introduz novos poderes com um ritmo bom, oferecendo ao jogador a oportunidade de melhorá-los conforme suas preferências pessoais. Para isso é necessário coletar um recurso conhecido como “Fontes de Cronum”, que surge de forma escondida pelos cenários de toda a aventura.
Quantum Break não é um game exatamente difícil em seus combates, contanto que você saiba usar seus poderes de forma inteligente. A melhor forma de sobreviver é usar sabiamente as coberturas espalhadas pelos cenários, especialmente quando começam a surgir inimigos capazes de desativar temporariamente os poderes de Jack.
Enquanto você não está lutando por sua vida, Quantum Break permite explorar ambientes em busca de documentos e itens interessantes que geralmente desenvolvem pontos secundários. Também há alguns momentos esporádicos de plataforma que surgem como o elo fraco do game — ao pular sobre um abismo, não é incomum cair nele porque a animação necessária para o protagonista se segurar simplesmente não foi acionada, o que costuma gerar mortes bastante irritantes.
No geral, a Remedy consegue equilibrar bem os momentos calmos com aqueles em que ação toma protagonismo. No entanto, é difícil não sentir que há certa repetição de inimigos nas partes finais do jogo, algo que só é mitigado pelo fato de que, quando isso começa a ficar óbvio, o game finalmente chega a sua etapa final.
Infelizmente, o combate contra o último chefe decepciona por ser um tanto “apelativo”. Mais do que testar as habilidades adquiridas pelo jogador, esse momento testa sua paciência ao fazê-lo ter que desviar constantemente de ataques que causam sua morte instantânea, o que diminui em muito as opções táticas possíveis para ser bem-sucedido.
Vale a pena?
Quantum Break não chega a ser uma revolução do ponto de vista narrativo conforme o prometido por seus desenvolvedores, mas está bem longe de ser ruim por conta disso. A escolha da Remedy em misturar momentos jogáveis com uma série televisiva funciona bem, muito disso graças a um roteiro bem amarrado e atores eficientes em seus papéis.
O estúdio soube brincar bem com o conceito de viagens no tempo, costurando de forma talentosa uma história cheia de reviravoltas e personagens marcantes. Isso faz com que valha a pena terminar o jogo pelo menos duas vezes, nem que seja para revisitar pontos iniciais com informações adicionais ou para conferir qual rumo a trama seguiria caso você tivesse feito outras escolhas.
Também ajuda bastante o fato de que Quantum Break é um game muito bonito e uma prova de que o Xbox One ainda tem muito a entregar em matéria de visuais. Por mais que a versão PC provavelmente seja superior nesse quesito, é difícil criticar a plataforma da Microsoft nesse sentido — ainda mais levando em consideração o quanto o material apresentado tem um desempenho estável.
Caso você tenha a plataforma de mesa ou um computador compatível com os requisitos mínimos, não é preciso pensar duas vezes antes de adquirir o game. Esse é o tipo de produto que você vai querer manter acessível em sua coleção, já que provavelmente vai ter vontade de voltar a ele de tempos em tempos, seja para procurar novos itens ou simplesmente para encontrar novas formas de usar os poderes de Jack.
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Categorias
- História envolvente
- Sistema de poderes que funciona bem
- Dificuldade bem balanceada
- Escolhas que realmente mudam o rumo da trama
- Boa dublagem e ótimas interpretações
- Simplesmente lindo
- As legendas dos episódios nem sempre aparecem de forma sincronizada
- Momentos de plataforma dispensáveis
- A batalha final é um pouco anticlimática
Nota do Voxel