As aventuras do deus-sol na terra onde tudo é pintado à mão.

Okami é um RPG de apelo estético diferenciado com uma jogabilidade fluida em meio a um universo que prima pela fantasia e imaginação, tendo como base a cultura e arte japonesas. Utilizando a técnica de arte gráfica cel-shading, o resultado do visual lembra bastante os animes e desenhos animados em geral. O protagonista é a inusitada encarnação de um Deus sob a forma de lobo, dando uma exclusividade razoável à premissa do game.

Okami pertence ao rol de jogos “especiais” do PS2, onde se encaixam Katamari Damacy, Tokobot, Mojo e outros jogos que se destacam por apresentar jogabilidade, gráficos ou conceitos muito diferentes do padrão ou dos outros jogos lançados com regularidade. É um jogo de plataforma muito bem concebido, que presta deferência à cultura oriental em seus cenários e detalhes. Apesar de fácil demais na maior parte do tempo, compensa o nível de dificuldade com uma campanha longa e satisfatória, puzzles criativos e divertidas batalhas com os chefes.

A história do deus-sol

A cultura oriental se presta de maneira fenomenal à criação de jogos, talvez pelo fato de videogames terem muito em comum com a linguagem dos animes, os desenhos animados japoneses. Ou talvez porque no Japão a diversão seja levada à sério, já que lá muitos vídeo-games, animes e mangás são criados com o foco em um público adulto, ávido por entretenimento.

Okami extrai seus conceitos da religião xintoísta, nativa do Japão. O xintoísmo é pouco conhecido no Brasil (e desconhecido para os ocidentais de uma forma geral), o que faz com que os temas e personagens de Okami sejam muito novos e interessantes pra nós.

O personagem principal, Amaterasu, que é representado por um lobo com um disco em chamas, é a principal divindade do xintoísmo, o deus-sol (por isso o disco em chamas nas costas). De forma similar, outros personagens e acontecimentos do jogo são inspirados em lendas e crenças religiosas.

O ar de exotismo, auxiliado pelos gráficos que parecem pinturas, é responsável pelo maior atrativo de Okami, que peca às vezes na jogabilidade, mas mantém a satisfação do jogador por toda sua campanha.

Exótico apenas para os Ocidentais

O termo exótico realmente deve ser utilizado com cuidado para Okami. Como já dito, ele é exótico e intrigante para os ocidentais, mas se utiliza de mitos e histórias que são muito comuns no Oriente. Assim, não é possível dizer que o enredo de Okami seja especialmente criativo.

O tema ecológico de Okami, por exemplo, com restauração de áreas impuras que foram tocadas pelo mal, lembra muito o anime Princess Mononoke, de 1997. Os inimigos e os fantasmas em Okami, que são espíritos incorporados ou pessoas que morreram com tarefas inacabadas, tratam dos mesmo temas da safra recente de filmes de horror japoneses, como “O Chamado” e o “O Grito”. Okami extrai tanto de mitos e histórias conhecidas que é quase panfletário, como se fosse uma introdução às religiões e crenças orientais.

A história não só é derivativa de temas religiosos, como também apresenta a eterna luta entre bem e mal como motivo principal: o deus-sol encarna em um lobo lendário, a fim de desfazer o mal feito por Orochi, um demônio que tocou várias partes do mundo espalhando sua influência malévola. Tirando o verniz exótico, portanto, não há nada de novo no enredo de Okami.

Alguns jogadores também podem sentir que a história se desenrola em um ritmo muito lento, o que é piorado pela impossibilidade de pular algumas seqüências que você já assistiu. Mas o incômodo talvez possa ser atribuído ao nosso “ritmo ocidental” de viver, sempre apressado, sempre querendo ir direto ao ponto.

Mas a falta de originalidade no enredo não tira os méritos de produção; todos os conceitos são apresentados de forma agradável e surpreendente, como o próprio Amaterasu e a genial introdução do pincel celestial (celestial brush), que representa o toque dos deuses no mundo terreno.

Uma ferramenta chamada pincel celestial

O toque mais criativo de Okami está no pincel celestial; é uma ferramenta muito interessante de interação com o cenário, sendo utilizada tanto em batalhas como na resolução de puzzles e abertura de outros mapas. O uso do pincel é muito simples: a qualquer momento do jogo basta segurar R1; a tela congela e se torna um pergaminho, onde você desenha com o analógico esquerdo. Depois que o desenho estiver terminado, basta soltar R1 para ver o efeito provocado.

Mas não é qualquer desenho que terá efeito. Ao longo do jogo Amaterasu aprenderá várias pinceladas diferentes, formando desenhos com apenas um ou dois movimentos. Para realizar uma explosão no cenário, por exemplo, é necessário desenhar um círculo e depois um pequeno traço saindo de dentro do círculo para fora. É a representação de uma bomba com um pavio. Os demais traçados também são intuitivos, e sua execução é muito natural e fácil dentro do jogo, nunca quebrando o ritmo.

Embora seja fácil de executar, infelizmente em algumas ocasiões o pincel falha, obrigando o jogador a executar o movimento novamente.

Algo mais chato acontece em alguns quebra-cabeças, onde Amaterasu precisa desenhar elementos mais complexos, como recriar pontes: muitas vezes é preciso tentar várias vezes, até entender exatamente o que o jogo espera que você desenhe. Você normalmente tem todo o tempo que precisar pra desenhar, mas mesmo assim pode ser incômodo.

Os outros controles de Amaterasu, principalmente em batalha, respondem de maneira precisa. As opções de ataque não são tão atraentes ou inovadoras como o pincel celestial, mas se integram bem ao estilo de jogo e permitem o término rápido das batalhas, o que se torna muito importante ao longo do jogo. Infelizmente os inimigos se repetem demais, o que faz com que a maior parte das batalhas fique maçante.

É possível evitar os inimigos na maior parte do tempo, o que ajuda um pouco. Já as batalhas com os chefes são inevitáveis, mas felizmente são muito mais interessantes do que os combates normais. Assim como o resto do jogo, tendem a ser fáceis, mas inimigos criativos e que se comportam de maneira intrigante ajudam a manter o ritmo, levando o jogador a procurar os próximos chefes e puzzles.

Os puzzles nunca são difíceis demais, sempre incluindo algum tipo de interação com o cenário (como rolar pedras até certo lugares) e o uso do pincel celestial no momento adequado.

É tudo muito simples e até mesmo ingênuo, mas é divertido desenhar um sol em uma caverna e ver um cogumelo que você acabou de descobrir crescer até o topo, virando uma plataforma que permite alcançar o próximo cenário. Em um departamento tão difícil de acertar como os puzzles Okami faz escola, e seria bom se todos os jogos adotassem o mesmo cuidado que evidentemente foi colocado na sua elaboração.

Uma jóia oriental baseada em uma técnica de pintura à aquarela

O departamento gráfico é onde Okami realmente surpreende. Não é o jogo mais bonito do PS2, pois não utiliza de toda a capacidade do console, mas o que surpreende é o seu estilo; o jogo parece ter sido inteiramente desenhado à mão, com o mesmo pincel que você utiliza para desenhar no jogo.

O estilo é claramente inspirado no sumie, a técnica de aquarela oriental que deixa o jogo com características que o diferenciam de qualquer outro jogo do PS2. Okami tem uma personalidade única entre os jogos existentes, e dentro de suas peculiaridades, não poderia ser mais bem-feito.

Apesar dos loadings demorados, os diferentes cenários se conectam de forma bastante fluida, contribuindo para a percepção de que tudo acontece em apenas um grande mapa, muito detalhado e cheio de coisas pra fazer. Alguns pop-ups ocorrem no início do jogo, principalmente no mapa principal, mas parecem se resolver depois. Eles chegam a atrapalhar quando acontecem com inimigos, que surgem de repente e perto demais para que você possa desviar a tempo.

Também é fácil se perder no início do jogo, mas o mapa disponível através do menu é útil e marca o local das missões mais importantes. Absolutamente todas os menus e objetos remetem à cultura japonesa: os menus são acessados como se fossem um leque e os objetos, como as caixas de itens, são inspiradas nas pequenas caixas de jóias orientais.

Tudo contribui para tornar Okami uma experiência gráfica sem igual no PS2, e é bom ver que jogos tão bonitos podem ser feitos em um console que já está saindo de cena.

Mortais não podem ouvir as vozes dos deuses

Um defeito notável em Okami é a falta de vozes de narração; ao invés de vozes se ouve apenas breves toques repetidos que representam as vozes dos personagens. Desde o primeiro momento é muito irritante, como se fossem os sons das caixas de texto dos antigos RPG's de computador.

É difícil de compreender por que os desenvolvedores optaram por não colocar narração, já que ela combinaria tão bem com o estilo de Okami. Talvez seja uma maneira de manter a natureza exótica de seus personagens, mas isso poderia ter sido feito com a adição de uma narração em uma língua fictícia, como acontece em Shadow of the Colossus.

Em compensação, os efeitos e a trilha sonora são muito bons. A trilha se destaca mais, por adotar instrumentos orientais na sua execução. O ritmo varia de acordo com os acontecimentos na tela, sendo quase minimalista, com apenas toques em cordas em momentos de exploração, e depois crescendo com a adição de tambores e gongos, na derrota de chefes ou aquisição de novos traços para o pincel celestial.

Explorar outras culturas engrandece o ser humano

Okami é um jogo obrigatório para apreciadores da cultura oriental, pois implementa muito bem os conceitos derivados de crenças e mitos japoneses. Em termos de ambientação, é o mais perto que um jogo pode chegar de um mangá.

Mesmo para quem não se importa com o tema oriental continua valendo a indicação, pois é uma experiência única entre os jogos disponíveis em todos os consoles, oferecendo uma campanha satisfatória embalada por belos gráficos e trilha sonora.

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