Need for Speed Heat é o retorno triunfal que você sempre sonhou
Antes de mais nada, apague da memória o mais recente Need for Speed Payback - que quase ninguém se lembra - e Need for Speed, o reboot, lançado em 2015. Agora, mentalize toda a nostalgia dos tempos áureos da franquia, lá no PlayStation 2, em meados dos anos 2000. Pense na customização completa das carangas e no espírito das corridas ilegais que consagrou o nome Underground. Resgate também a adrenalina das perseguições de Most Wanted. Deu saudade? Pois saiba que, mesmo com ressalvas, Need for Speed Heat se esforça para trazer tudo isso aí de volta. Confira a nossa análise completa.
Polícia e ladrão
A narrativa coloca você no ponto central de um conflito entre polícia e equipes de racha. O tenente Frank Mercer - interpretado por Josh Coxx de “Thor” e da série “Babylon 5” - trabalha em uma força-tarefa para extinguir de uma vez por todas as corridas de rua em Palm City, um lugar inspirado nas regiões do Sul da Flórida, como Miami e Fort Lauderdale, com paisagens exuberantes que mesclam praias, zonas urbanas e muito neon.
Apesar de ser algo subjetivo, não há como negar: Need for Speed não se tornou uma franquia importante pela profundidade de suas histórias, e sim pelo seu gameplay. Em Heat, assim como nos jogos recentes, a narrativa é claramente influenciada pela saga “Velozes e Furiosos”. A diferença é que a franquia de filmes sabe dosar o ritmo da ação na questão narrativa.
O problema é que não há espaço suficiente para desenvolver os personagens e, consequentemente, criar uma atmosfera mais, digamos, agradável de acompanhar. Pelo contrário: os diálogos são pura encheção de linguiça (mesmo), apesar de haver cutscenes caprichadas entre cada missão da campanha.
A história por si só não se sustenta e é apenas um pretexto para torrar o nitro e ir do ponto A ao ponto B, do ponto B ao ponto A. A vantagem é que, durante o caminho, você pode apreciar os cenários incríveis que Palm City tem a oferecer - inclusive, prepare-se para passar horas no modo foto. Só que a coisa toda piora quando o personagem precisa seguir seus amigos de um ponto a outro em missões guiadas, conduzidas pelos NPCs. É chato e desnecessário, de longe os momentos mais entediantes da aventura.
O foco é no gameplay, ainda bem
A narrativa sonolenta acaba sendo compensada por um gameplay refinado, o arcade característico da série, e um mapa abarrotado de missões e itens colecionáveis a serem resgatados. O controle do carro requer um tempo de adaptação, principalmente em relação às técnicas de drift - algo que é exemplificado nos tutoriais e repetido à exaustão. Uma vez que os comandos forem compreendidos, você não vai querer parar de jogar. É sério! É uma delícia dirigir os veículos tunados em alta velocidade enquanto a rádio toca o que há de melhor e mais atual no hip-hop, trap music e na sonzeira eletrônica.
O único porém é que, de novo, a câmera adota uma perspectiva um pouco estranha quando o veículo entra em derrapagem, o que acaba limitando o campo de visão, principalmente em curvas que exigem precisão ao acionar o freio de mão.
No modo normal, que é o que eu joguei para redigir esta análise, a mudança de câmera atrapalhou um pouco o meu desempenho. Em trechos mais sinuosos, por exemplo, com o carro em alta velocidade, eu acabei perdendo o tempo da curva por não ter plena condição de visualizar o obstáculo que me esperava, mesmo tendo utilizado o pequeno mapa alocado no canto da tela. O problema, no entanto, pode ser contornado de maneira simples: basta trocar para uma outra perspectiva, de preferência para uma câmera interna.
O mapa, como citado acima, está recheado de atividades: radares de velocidade, painéis de street art e desafios de salto distribuídos por todas as regiões. A dimensão do lugar vai fazer com que você tenha que usar o recurso de viagem rápida com frequência, então é bom saber que, sim, a parte litorânea da costa leste da Flórida está bem representada, inclusive na quesito proporção. As atividades se repetem bastante, porém você estará sempre distraído com perseguições policiais e preocupado em encontrar postos de gasolina para reconstruir partes danificadas do carro.
Como de praxe, você também pode participar de missões e tentar quebrar recordes de outros jogadores no modo online, que consiste em dividir o mundo do jogo com pilotos reais, de diferentes níveis, o que gera uma rivalidade saudável no mapa. Se você se considera um lobo solitário e preza pela experiência single player, sem intervenções, saiba que é permitido usufruir da campanha em modo totalmente offline, em um mundo fechado e só seu. Pretende platinar ou miletar? Vá direto ao modo sem conexão para evitar receber convites o tempo todo.
Ciclo de dia e noite: o grande chamariz
O grande chamariz de NFS Heat é, sem dúvidas, a dinâmica cíclica das corridas. Mudar do dia pra noite ao alcance de um único botão altera completamente a forma como as missões são apresentadas no mapa, o que também afeta o comportamento da polícia. Basicamente, correr de dia, em eventos oficiais, concede dinheiro para adquirir novos carros e acessórios, enquanto os rachas noturnos concedem pontos de experiência usados para desbloquear veículos de outras classes e peças de desempenho.
A mudança de período é uma ótima forma de incentivar o jogador a vivenciar experiências distintas dentro de um mesmo mapa; de dia, com corridas profissionais, de noite, em rachas ilegais. Durante as disputas noturnas, é possível elevar o nível de pressão ao confrontar a polícia com manobras, colisões e destruições pela cidade. Basta tocar o terror para chamar atenção.
A pressão gerada pelo caos faz com que o personagem acumule mais experiência, só que há um grande risco: seja pego pela polícia e uma parcela dos pontos será perdida. E é justamente esse conceito punitivo que torna o racha noturno tão arriscado e divertido.
O mais legal é que o jogo ainda permite subornar a polícia no começo de uma perseguição, desde que o medidor de pressão não esteja tão elevado. Na prática, isso significa que você gasta dinheiro para manter os pontos de experiência intactos, ou seja, a polícia simplesmente desiste da captura devido ao suborno.
O sistema de polícia e ladrão tem muitos pontos positivos, só que está longe de ser perfeito e sofre com o comportamento inconstante da inteligência artificial. Mesmo na dificuldade normal, há momentos em que viaturas brotam do chão e te encurralam com uma rapidez que não condiz com a realidade. Assim como há situações em que a polícia simplesmente abandona a busca em questão de segundos.
Entendo que seja complexo equilibrar a equação da dificuldade. Contudo, é importante que a Ghost Games esteja ciente do problema para que algum algum tipo de ajuste seja feito por meio de atualização. Convenhamos: é frustrante perder progresso por instabilidade de IA, não?
Customização mais profunda
O personagem principal pode ser escolhido entre opções pré-definidas de avatares, mas você tem total liberdade de modificá-lo posteriormente com roupas e cortes de cabelo. O nível de customização é robusto, visto que é possível adquirir trajes baseados em modelos reais, de marcas reais, como Adidas e Kappa, por exemplo. E há, de fato, uma variedade enorme de itens.
Need for Speed não seria Need for Speed se não oferecesse um sistema de personalização de carros repleto de opções, com detalhes que vão desde a gravação no nome da placa até o tipo de aro e espessura dos pneus. Em resumo, o jogo permite trocar todas as partes externas do veículo sem burocracias, ainda que a interface do sistema seja um tanto poluída.
Há, também, modificações passivas a serem aplicadas, que servem para fortalecer os carros e dificultar a detecção da polícia. Você pode, por exemplo, colocar um tanque de reabastecimento de nitro maior, assim como trocar completamente o motor para ganhar potência. Inclusive, o game vai te dar liberdade para moldar os carros da forma como bem entender, seja para sprint, drift ou qualquer outra categoria. Para isso, basta adquirir o kit de peças adequado a cada ocasião.
À medida que você aumenta o nível de performance do carro com acessórios de diferentes raridades, novas missões são desbloqueadas para que você prossiga na história. A Ghost Games foi capaz de entregar uma progressão orgânica que se encaixa perfeitamente à atmosfera do tuning e que, acima de tudo, diverte sem exigir muito do jogador, sem impor o tal do grind.
Ué, cadê as microtransações?
Talvez seja cedo para cravar que não haverá qualquer tipo de microtransação, mas parece que a EA, enfim, aprendeu com os erros, já que Heat não promove vendas de itens por dinheiro real. Não há caixas de loot e objetos cosméticos, nada de nada, e todos os itens podem ser adquiridos com o suado dinheiro obtido nas corridas. Presume-se que a ideia da EA seja seguir a tendência do gênero e trazer carros adicionais em pacotes pagos - quem sabe até DLCs com histórias complementares. Afinal, espaço tem de sobra.
Visual primoroso
Como de praxe, NFS Heat foi concebido com o motor gráfico Frostbite 3, desenvolvido pela DICE e usado em praticamente todos os títulos recentes da EA. NFS Heat segue a cartilha dos outros jogos da franquia e continua lindo. Naturalmente, o clima glamoroso da cidade de Palm City contribui para enriquecer o aspecto visual. Em comparação ao recente Payback, nota-se uma evolução no sistema de iluminação, agora mais sofisticado, que consegue traduzir com maestria o característico clima de sol com chuva da Flórida.
Também é preciso ressaltar o trabalho do estúdio na parte de reproduzir dezenas de veículos reais. Sem exagero: poucos jogos se equiparam ao nível de detalhamento dos carros de Need for Speed, acredito que somente a série Forza seja capaz de tal proeza. Há, sim, ressalvas técnicas que afetam a jogatina, só que isso é algo facilmente reparável por meio de atualizações.
Veredito
Heat marca o retorno triunfal de Need for Speed depois de muitos erros e acertos. A Ghost Games, agora com mais bagagem, foi capaz de unir o que há de melhor em corridas de rua, customização e perseguições policiais.
Com menos história e mais gameplay, Need for Speed Heat desperta sentimentos nostálgicos e é uma carta de amor aos fãs. As ressalvas não são suficientes para ofuscar um dos games mais divertidos desde os tempos de Underground, trata-se de uma injeção de adrenalina cujo saldo final é bastante positivo. Mal posso esperar pelo próximo jogo.
Need for Speed Heat foi gentilmente cedido pela EA para a realização desta análise.
Categorias
- Menos história, mais gameplay
- Sistema robusto de customização de carros e personagem
- Ciclo de dia e noite funciona bem e proporciona uma dinâmica diferente
- Mapa grande, variado e abarrotado de atividades
- O visual continua primoroso
- Progressão mais orgânica em relação aos dois jogos anteriores
- Quem diria, livre de microtransanções
- Comportamento inconstante da inteligência artificial
- História até que razoável, só que com péssimos diálogos
Nota do Voxel