Cores e trilha sonora não são suficientes para salvar essa monotonia
Quando Hohokum foi apresentado na E3 do ano passado, ele foi considerado um dos games mais “relaxantes” do evento. Indie até a raiz, o título tinha tudo para não ser apenas mais um jogo independente, visto que a família PlayStation é conhecida por abrigar uma biblioteca gigante de games assim.
Desenvolvido pela Honeyslug em parceria com a Santa Monica, Hohokum, lançado para o PS4, PS3 e PS Vita, foi posteriormente apresentado em várias ocasiões: gamescom, GDC e até mesmo a nossa BGS ofereceram a oportunidade de testar essa experiência um tanto quanto, digamos, exótica. E ser esquisito nem sempre é sinal de qualidade, já que, hoje, os jogadores adoram classificar a indústria como “repetitiva”.
De fato, a mesmice domina diversos gêneros – e diversos gêneros também dominam a mesmice. Os indies costumam ser uma válvula de escape para essa repetição. No entanto, é como já mencionei: o fato de ter uma proposta diferente e ousada não necessariamente se reflete em diversão. Ser muito “zen” pode ter o seu preço.
Hohokum adota a filosofia do “lado B” de forma majestosa, mas falha na execução. É o famoso “bom na intenção, ruim na execução”. Ainda que o propósito seja absolutamente específico e possa atingir alguns nichos pró-indies, não há como absorver uma experiência gratificante ou inesquecível só com cores ou efeitos sonoros requintados.
Objetivo: não ter objetivo
A ausência de um objetivo mais específico talvez seja a grande falha de Hohokum. Não há um elemento na tela sequer que indique o que ou por que você deve fazer. Jogos como flOw e Flower trabalham bem com essa mecânica – mas sabem conduzir o jogador dentro de algumas tarefas específicas a serem cumpridas.
Hohokum se aproxima daquele novo conceito de “endless runner”, mas não trabalha com essa mecânica de forma palpável. Um autêntico endless runner coloca obstáculos, inimigos e outros entraves no caminho.
Em Hohokum, você controla um objeto colorido, no formato de um fio, que tem um olho na extremidade. Seu objetivo é perambular, perambular e perambular pelos cenários em um ritmo musical que salva a jogatina do tédio profundo, mas não elimina a impregnada monotonia que toma conta dos percursos.
Brincar com as cores enjoa em poucos minutos
Aqui, você deve atingir outros objetos – em sua maioria esféricos – para atrair outros fios (ou cordões, ou seres, ou linhas, ou o que você preferir), que logo se transformam em seguidores e brincam de “siga o mestre” com você. A mecânica é interessante até certo ponto, mas tropeça no momento em que isso, e tão somente isso, se transforma no seu objetivo principal. A repetição, portanto, é inevitável, ainda que você seja transportado a outras dimensões.
E vejam a contradição: não há um objetivo claro aqui. Se em um momento você precisa capturar outros seres iguais a você (diferindo-se apenas na cor), em outro é preciso atingir botões que abrem uma fenda para outra dimensão. Ao entrar nessas portas circulares, o jogador embarca em outro mundo e lá encontra outros seres, todos inspirados em pinturas do surrealismo e com escolhas de design peculiares. Às vezes, é preciso ativar certos mecanismos passando sobre objetos que se parecem com olhos fechados. Ao encostar neles, eles são abertos. Ponto para a criatividade nesse quesito.
Ao todo, são 17 mundos exploráveis sem um objetivo definido. Você vai, vem, volta, vai de novo, explora outro canto, retorna ao mesmo local, segue em frente... E não há nada mais que isso. Na verdade, não há sentido algum – apenas usar as belas cores como colírio para os olhos e os sintetizados efeitos sonoros como uma limpeza à poluição sonora que temos nas grandes cidades. Mas nem essa soma é suficiente para salvar Hohokum da monotonia.
Trilha sonora de respeito, mas não heroica
Hohokum demorou seis anos para ficar pronto. Seu ciclo de desenvolvimento, iniciado em 2008, passou por altos e baixos, e parte da equipe se deslocou a outros projetos. Ainda assim, o jogo contou com o talento do artista Richard Hogg em colaboração com a desenvolvedora Honeyslug e os estúdios Santa Monica.
Aliás, o próprio artista já afirmou que “não sabia se todos iriam gostar de Hohokum”. A trilha sonora é de respeito: os artistas da Ghostly International, prodígios em criação e sintetização, cuidaram da sonoplastia de Hohokum e fizeram um lindo trabalho, ainda que ele não seja destaque suficiente.
Vale a pena?
Depende. Conforme já mencionado, o próprio Richard Hogg disse que “não sabia se todos iriam gostar de Hohokum”. Eu não vou dizer que desgostei, mas devo afirmar que cores e trilha sonora não são o bastante para entregar uma proposta diferente.
Hohokum, aliás, tem essa preocupação constante: ser diferente, ser “lado B”, ser “zen”. Oras, Flower, flOw e Sound Shapes também são assim, mas executam seus objetivos com maestria – aliás, existem objetivos nesses jogos. Se a ausência de uma tarefa, mesquinha que seja, viajada que seja, agrada a você, eu não sei. Talvez seja algo específico, mas a mim não agradou.
Portanto, volto a dizer: depende. Acho que esse é um daqueles títulos 8-80, ame ou odeie. Se você estiver com sono e não quiser dormir, passe longe. Se bater a insônia, compre agora.
- Visual interessante e inspirado em pinturas surrealistas
- Trilha sonora de respeito
- Repetitivo, monótono e sonolento
- Não há objetivos, não há muito o que fazer
- Proposta simples demais e muito preocupada em ser "lado B"
Nota do Voxel