Forspoken é um agoniante conjunto de ideias mal executadas
Desde que foi apresentado pela primeira vez como Project Athia, em junho de 2020, Forspoken se agarra em dois principais pontos de venda: as suas mecânicas de combate, com dezenas de feitiços extravagantes; e exploração, com foco em movimentos ágeis de parkour em um vasto mundo aberto de fantasia. No entanto, o que podia parecer interessante no papel é absolutamente deprimente na prática.
O Voxel teve a oportunidade de experimentar a versão completa de Forspoken nas últimas semanas e você confere, nas linhas a seguir, os pontos positivos e negativos do game que chega em 24 de janeiro para PC e PlayStation 5. Vale destacar que esta análise está em conformidade com as restrições de embargo da Square Enix e está livre de spoilers da história.
Um pouco de contexto
No game, os jogadores assumem controle de Frey Holland, uma órfã que tem uma vida solitária e muito difícil nas ruas sujas de Nova Iorque. Ela foi abandonada na entrada de um túnel quando ainda era uma recém-nascida e passou de uma família acolhedora para outra desde então. Após terminar o Ensino Médio, ela decidiu viver na cidade grande por conta própria com a sua única família: uma gatinha de estimação chamada Homero.
Em razão das dificuldades em ter o mínimo para sobreviver, ela acabou com antecedentes criminais por furto qualificado e resistência à prisão. Após receber o ultimato de uma juíza que se compadece do seu caso, Frey se vê inspirada a mudar de cidade e começar uma nova vida, mas ela encontra um misterioso bracelete em uma loja abandonada e é transportada para um mundo de fantasia desconhecido.
O início de Forspoken é um dos poucos momentos em que a história fisga a atenção do jogadorFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Chegando lá, ela se espanta porque o bracelete é senciente e, de alguma forma, ela despertou poderes sobrenaturais. Na busca por respostas, ela descobre que essa terra, chamada de Athia, foi devastada por um tipo de corrupção e que suas antigas governantes, as poderosas Theias, enlouqueceram e se tornaram em verdadeiras ameaças. Aquilo que restou da humanidade busca refúgio em uma pequena capital chamada Cipal e Frey, que por algum motivo não é afetada pela energia maligna, se torna a única esperança para salvar esse mundo — ainda que contra a sua vontade.
De um modo geral, a história é bastante previsível e tem um problema muito grave de ritmo. Tudo acontece de forma desnecessariamente arrastada e os personagens estão muito longe de serem carismáticos: as suas expressões são robóticas e a dublagem também é sem emoção. Isso vale até mesmo para a própria Frey — embora o começo da história seja emocionante e garanta que o jogador crie uma certa conexão com ela. Sendo bem sincero, o único personagem com o qual a gente verdadeiramente se importa é a gatinha Homero... E ela nem aparece tanto no jogo, por motivos óbvios.
Em questão de poucas horas, o bracelete, que é apelidado de Algema, se torna um personagem completamente insuportável. Os desenvolvedores pensaram que seria uma boa ideia se a Algema tivesse um comentário para qualquer coisa que Frey coletasse ou que acontecesse no jogo. Se não bastasse, as rasas linhas de diálogo uma hora esgotam e começam a se repetir, virando uma tortura. O jogo felizmente tem uma opção para diminuir os diálogos com a Algema, mantendo apenas aqueles que são "essenciais" para a história.
Os personagens de Forspoken têm expressões vazias e causam estranhamentoFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Um vasto mundo genérico
O mundo de Athia é dividido em quatro regiões, cada uma governada por uma Theia. Ainda assim, existem poucas diferenças significativas entre elas. Os cenários sempre oscilam entre campos desertos, florestas, lagos ou áreas montanhosas e o jogador por vezes encontra cidades devastadas com campos de refúgio pelo caminho — afinal de contas, é um mundo pós-apocalíptico.
Há incontáveis tarefas secundárias durante a exploração, tais como: baús com materiais para serem descobertos; fontes que servem para destravar feitiços específicos; fortalezas e outras áreas dominadas por inimigos que garantem equipamentos para aumentar os atributos de Frey; pontos de observação; espécies de "labirintos" cheios de inimigos e que são protegidos por chefes; entre outras.
O grande problema é que essas tarefas são extremamente repetitivas e nem mesmo as recompensas fazem valer o esforço de completá-las. A impressão é que simplesmente copiaram e colaram as mesmas atividades com o propósito de rechear o mapa, que é sim gigantesco... Mas desinteressante. E se você ainda assim quiser completar todas as atividades, boa sorte para lidar com a interface de usuário, pois ela é confusa e nada responsiva.
Para piorar, o jogo tem pouquíssima variedade de inimigos. As criaturas basicamente são zumbis e animais infectados que aparecem de forma exaustiva em todo canto. Todas elas têm um aspecto cristalizado, pois estão sob efeito da corrupção. Por isso, seus visuais são completamente genéricos e esquecíveis. Às vezes tem uma criatura maior e mais forte, mas que também se repete e logo cai na mesmice.
Mas o parkour é divertido... certo?
A premissa de correr por um mundo aberto e atravessar todos os obstáculos com movimentos de parkour e magias parece interessante. Mas, assim como tudo em Forspoken, as boas ideias têm execução extremamente precária. Tudo é muito burocrático, pois Frey não tem total liberdade para escalar o que quiser e como quiser.
Conforme o jogador avança na história, são desbloqueados feitiços de exploração específicos, mas é estranho como não existe sinergia entre eles. Por exemplo: a Frey consegue realizar um salto após uma propulsão d'água. Parece algo útil para alcançar locais mais altos, mas estranhamente não é possível realizar nenhum outro movimento de deslocamento depois disso.
O jogo sempre encontra alguma forma de limitar a movimentação do jogador. Em outras palavras, Forspoken é um completo inimigo da diversão. A própria corrida arcana, que é feita pressionando círculo e é a base da movimentação do game, sempre é interrompida por piruetas involuntárias em qualquer terreno irregular. Isso acontece por conta de uma habilidade que teoricamente serviria para escalar, mas ela é limitada e irritante.
E o sistema de combate?
Algo que é digno de nota é a quantidade de feitiços disponíveis em Forspoken. Existem dezenas e eles variam entre técnicas ofensivas e defensivas. Entretanto, é claro que nem isso é livre de problemas.
No começo do jogo, Frey tem apenas um elemento à disposição e que é baseado em técnicas de pedra e plantas, com disparos à distância. Isso torna os confrontos muito mecânicos e repetitivos. Para piorar, a sensação de impacto é terrível e os inimigos são "esponjosos", pois custam muito para perder vida.
Conforme derrota as Theias, Frey aumenta progressivamente o seu leque de feitiços e elementos. Quando isso acontece, o jogador se depara com uma interface terrível para trocar entre as técnicas. No fim, o jogador perde mais tempo navegando entre menus, procurando o que quer usar, do que lutando de fato.
Existe uma forma de mudar rapidamente entre as árvores de habilidade em combate com uma "técnica de atalho", mas ainda assim o jogador precisa selecionar os próximos feitiços manualmente. É uma completa quebra de ritmo.
Até a navegação de menus entrar na memória muscular, o jogador já perdeu todo o interesse nos combates, pois os inimigos são sempre iguais. Além disso, sempre haverá aqueles feitiços que não são interessantes ou pouco usados. Por sorte, existe a opção de converter a maior parte em Mana para melhorar outras técnicas mais úteis.
Por fim, os comandos não são responsivos. Existe um grande atraso entre o apertar de botão e a ação de Frey — e isso pode custar bastante caro nos confrontos. Como consequência, a personagem parece muito pesada e difícil de controlar, enquanto os combates ficam desengonçados.
Existem ainda aqueles feitiços que por algum motivo têm efeito sobre a própria Frey. Ela não consegue criar uma parede de chamas e simplesmente atravessá-la ilesa, por exemplo. Nesse sentido, o jogo cai mais uma vez na questão da burocracia. O que se tira disso é que o sistema não foi pensado para ser divertido.
Frey pode equipar capas, colares e até mesmo unhas que concedem diferentes atributos e habilidades passivasFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Uma catástrofe técnica
Por se tratar de um jogo inteiramente focado em um hardware de nova geração, era de se esperar que Forspoken servisse de referência para apresentar visuais de qualidade com um desempenho implacável. Infelizmente, não é isso que acontece na prática.
Para começar, os gráficos sofrem com a péssima aplicação de uma resolução dinâmica. Os visuais causam muito estranhamento por conta disso, pois sofrem com serrilhados e borrões aleatórios em vários momentos do jogo. Na prática, o título é muito mais feio do que aquilo que foi mostrado nos primeiros materiais de divulgação.
No PlayStation 5, que foi a versão analisada, o game oferece três modos gráficos: Desempenho, Qualidade e Ray Tracing. Em teoria, o modo de Desempenho deveria manter o jogo rodando constantemente a 60 fps em resolução 1080p, mas basta girar a câmera e as quedas já são perceptíveis. Há, ainda, momentos em que a taxa de quadros despenca e deixa o jogo a menos de 30 fps.
No modo de Qualidade, que mira 30 fps com resolução até 4K, a situação é ainda pior e dá a impressão de que o jogo roda a 15 quadros por segundo — fica completamente desconfortável. Como vários feitiços são extravagantes e recheados de partículas, fica claro que o jogo simplesmente não aguenta tanta informação na tela.
A gatinha Homero é um golpe baixíssimo na história de ForspokenFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Conclusão
Forspoken é um jogo cansativo e burocrático em tudo que se propõe a fazer. A interface de usuário é recheada de informação e confusa, deixando o jogador perdido até mesmo depois de finalizar o conteúdo principal. Isso também vale para o mapa do jogo, que tem uma navegação deprimente.
Seus sistemas de gameplay também caem rapidamente na mesmice, pois os inimigos são desinteressantes e os combates, demorados e pouco responsivos. Apenas algumas poucas lutas contra as Theias são interessantes, mas acabam pagando o preço de todos os outros problemas do game.
A exploração, que deveria ser ágil, constantemente joga empecilhos na frente do jogador por conta de movimentos involuntários e um design de níveis questionável. É comum desistir de explorar no meio do caminho de tão exaustivo. Nem mesmo os novos feitiços de exploração conseguem resolver isso, pois sempre existe alguma limitação.
A história ainda tem alguns poucos elementos que salvam na sua reta final, mas é desnecessariamente arrastada e previsível. Ela pelo menos tem os seus momentos emocionantes e que podem arrancar algumas lágrimas, especialmente se você gostar de gatos. De um modo geral, os personagens de Forspoken não são memoráveis e a Algema, que está sempre acompanhando Frey, é uma das criações mais detestáveis dos últimos anos nos videogames.
No estado atual, é impossível recomendar Forspoken, ainda mais a preço cheio de lançamento. Talvez algumas (muitas) atualizações de desempenho e qualidade de vida consigam deixar a experiência mais proveitosa, mas o resultado está muito aquém daquilo que foi propagandeado pela Square Enix e é sem dúvidas a primeira grande decepção de 2023.
Forspoken foi gentilmente fornecido pela assessoria da Square Enix para a realização desta análise.
- Personagem preta como protagonista
- Variedade de feitiços
- Algumas lutas contra chefes da história principal
- Gatos
- Péssima interface de usuário
- História tem grandes problemas de ritmo
- Performance desastrosa no PS5
- Visuais muito longe do esperado
- Gameplay burocrático e pouco responsivo
- Mundo aberto genérico
- Atividades extremamente repetitivas
- A Algema é insuportável
Nota do Voxel