O momento em que uma série de sucesso invade uma praia diferente
Há quem diga que mudanças de ares sempre são bem-vindas. Seja para voltar a conceitos antigos ou para tomar novos rumos, muitas delas geralmente acontecem para o bem – basta observar o que aconteceu com Call of Duty e Battlefield, que há algum tempo deixaram as trincheiras da Segunda Guerra Mundial para apostar em algo mais moderno, para entender melhor essa ideia.
Entretanto, o ciclo não pode parar. Logo, era de se esperar que a Electronic Arts apostasse em algo diferente com a sua série de tiro mais conhecida, mas nem todos imaginavam que esse movimento aconteceria tão rápido – muito menos que ele guiaria muitos para os confrontos entre policiais e bandidos presentes em Battlefield Hardline.
Não demorou muito para que os fãs da série se dividissem em dois grupos. Por um lado, havia aqueles que acreditavam que estava cedo demais para algo relacionado a Battlefield, ainda mais com uma proposta dessas. Do outro, estavam aqueles que defendiam a aposta e depositavam algumas de suas esperanças no novo jogo. E é aí que fica a pergunta: qual grupo está com a razão? É exatamente isso que você confere nas linhas a seguir.
A matança nossa de cada dia
Começando pelo ponto onde Battlefield fez sua história, temos a porção multiplayer. Quem já se arriscou em algum game antigo da série certamente percebeu que esse é o ponto forte da franquia da EA, a ponto de aparecer antes da campanha no menu de seleção de vários títulos. Sabendo disso, a Visceral Games, que trabalhou em Dead Space e Army of Two: The Devil’s Cartel e ficou a cargo desse episódio, se esforçou para fazer a lição de casa de forma correta. E conseguiu.
A primeira mudança é percebida já na tela de carregamento. Em vez de ficar parado apenas esperando que o estágio carregue, você tem a oportunidade de ouvir uma espécie de noticiário dizendo o que está rolando naquela região, sendo guiado posteriormente para a jogatina propriamente dita.
As fases encontradas aqui, aliás, são bem amplas e diversificadas. Algumas são reaproveitadas da campanha, enquanto outras aparecem exclusivamente nesse modo, cada uma com áreas que favorecem o uso de táticas variadas independente da classe escolhida (suas opções aqui não mudam muito do que já foi visto anteriormente: Operador, Mecânico, Especialista e Atirador).
Somado a isso, também temos outra opção que aparece apenas com um nome diferente, mas que possui uma função parecida com outra vista anteriormente: o modo Hacker, que é parecido com o Comandante de Battlefield 4. Basicamente, sua função é oferecer suporte ao restante da equipe usando uma série de equipamentos capazes de dar as coordenadas dos oponentes e outros tipos de apoio - algo divertido de se fazer em alguns momentos, mas que, ao menos para mim, não substitui a empolgação de estar correndo loucamente pelos mapas apenas disparando contra quem cruzar o meu caminho ou cumprindo objetivos.
E isso ficou bom?
Tudo que você espera do multiplayer de Battlefield Hardline está aqui, com direito a algumas novidades. Não se preocupe, modalidades clássicas como Conquista e Cada Equipe Por Si permanecem aqui, mas elas aparecem acompanhadas por outras cinco opções feitas para explorar um pouco mais da ideia de confrontos urbanos.
Uma dessas opções é o modo Roubo. Aqui, os bandidos devem unir forças para conseguir os pacotes de dinheiro que estão em cofres e, posteriormente, se esforçar para levá-los ao ponto indicado. Aos policiais, cabe a missão de pará-los como puderem e fazer de tudo para que a grana permaneça no lugar de onde nunca deveria ter saído.
Já Dinheiro Sujo vem como uma espécie de variante do Roubo e, juntamente com o anterior, conseguiram chamar atenção de boa parte dos jogadores (inclusive a minha!). A diferença é que aqui os policiais também devem se mover para colocar as mãos na grana, uma vez que o dinheiro obtido serve como uma prova contra os criminosos. Os bandidos, por sua vez, precisam correr para tirar os agentes da lei do caminho e, de quebra, carregar o máximo de cédulas que conseguirem.
Ampliando a relação, também temos Resgate e Mira. Diferente das supracitadas, essas são pouco inspiradas e exploram o confronto entre quintetos numa mecânica que lembra o que vimos em Counter-Strike. Enquanto em Resgate é preciso levar ao menos um refém com vida até o ponto indicado, em Mira um dos policiais se torna um VIP que deve ser protegido pelos demais jogadores do time – ou seja, nada muito diferente do que foi visto no jogo da Valve.
E se até aqui você está fazendo as contas, certamente se tocou que falta uma opção ainda. Trata-se de Ligação Direta, possivelmente uma das mais divertidas do grupo (e que acabou se tornando a minha favorita depois de um tempo). A ideia aqui é a mesma vista em Conquista, mas, em vez de manter pontos fixos, os jogadores devem pilotar carros pelo maior tempo possível para drenar os tíquetes do adversário. E nada de se esconder, pois o jogo o incentiva a ficar passeando pela fase ao oferecer pontos extras para quem dirige em alta velocidade.
Detalhes que fazem a diferença
Além disso, vale mencionar que em algumas opções do multiplayer há diversos veículos espalhados pelo mapa para ajudar a chegar nos pontos importantes de maneira rápida. Guiá-los se tornou uma experiência mais gratificante pelo fato de todos contarem com rádios que realmente tocam músicas, e estas podem ser trocadas caso você não curta o que está ouvindo. Essa é uma adição bem-vinda e capaz de capturar a atenção daqueles que gostam de relaxar ao som de uma boa melodia em Grand Theft Auto V.
Ainda no que diz respeito ao multiplayer, uma novidade é que agora há uma nova forma de liberar os seus equipamentos. Além da evolução (vale mencionar, aqui ela é bem mais rápida que em Battlefield 4), também é possível desbloqueá-los usando o dinheiro que o personagem obtém nos confrontos. Dessa forma, você não precisa evoluir tanto para conseguir um desfibrilador caso esteja jogando como Operador ou a sua escopeta favorita para usar como Especialista.
Entretanto, ainda fica no ar a ideia de que talvez a produtora pudesse ter feito algo mais para os fãs de um bom multiplayer. Tudo bem, os modos apresentados aqui até são capazes de trazer um pouco de variedade à ação, e os mapas são bem diversificados, mas, tendo em vista tudo o que acontece nessa guerra urbana, certamente haveria algo mais a ser explorado, seja como modo inédito ou algum outro tipo de mecânica adicional.
O outro lado da história
Sim, propositalmente começamos a análise pela porção multiplayer do game, mesma forma como o jogo apresenta as opções e como muitos jogadores encaram o conteúdo apresentado nos games da série Battleflield. “Isso significa que a campanha é ruim?”, alguns podem se perguntar, mas a verdade é que a ideia aqui é exatamente a contrária.
O enredo visto aqui conta a história de Nick Mendoza, detetive da polícia de Miami que, nos primeiros minutos de jogo, aparece em um ônibus sendo transportado para uma penitenciária. Os motivos que o levaram a tomar esse caminho é o que você descobre enquanto avança pelas fases da campanha do jogo, ao mesmo tempo em que lida com policiais corruptos e outros problemas ao longo da jornada.
Aliás, o fato de a história não começar exatamente do início remete ao que vimos em Battlefield 3 e dá ao jogador a oportunidade de acompanhar uma trama tão intensa quanto a vista no terceiro game canônico da série da Electronic Arts, com direito a traições, mudanças que afetam a vida dos personagens e, por que não, algumas explosões para garantir que o DNA da franquia está presente neste episódio.
A ideia de recorrer a uma história envolvendo policiais e bandidos foi uma decisão acertada da Visceral Games. Os capítulos aqui estão divididos em formato de episódios e lembram um seriado, algo que fica evidente quando você decide fechar o game por algum motivo e tem a oportunidade de ver trechos do que está por vir. Além disso, o roteiro garante bons momentos de diversão em uma campanha que vai facilmente ocupar cerca de 10 horas do seu tempo, ainda mais se tentar seguir pelas fases agindo de modo furtivo.
Na surdina é mais legal
Esse, aliás, é um dos trunfos vistos aqui. O game o incentiva a seguir furtivamente em boa parte do tempo, seja para livrar a sua cara de tiroteios desnecessários ou para garantir que você obtenha novos equipamentos de maneira mais rápida. Tudo aqui conta ponto: prender um oponente com mandato sem causar dano, utilizar o escaner do seu celular para saber a localização dos inimigos e até mesmo mostrar o seu distintivo antes de efetuar prisões somam ao seu placar.
O seu equipamento também dá uma ideia de como você deve agir. Via de regra, jogos de tiro em primeira pessoa apresentam metralhadoras ou outras armas mais fortes como principais, enquanto as pistolas são realocadas para o espaço secundário. Entretanto, aqui é exatamente o oposto, e é bom se preparar: você vai passar a campanha toda sem lançar uma granada, seja ela convencional ou a famosa flashbang - afinal, policiais não recorrem a elas na vida real.
Ainda que agir furtivamente seja uma boa adição, vale mencionar que é muito fácil conseguir tudo o que você precisa antes de chegar ao final do game. É bem possível que todo o arsenal esteja habilitado assim que você chegar à sétima ou oitava missão e sem precisar de muito esforço para isso. Falando em esforço, a inteligência artificial por vezes não vai exigir isso de você: caso renda dois oponentes ao mesmo tempo, o outro possivelmente vai ficar parado observando o parceiro ser preso sem esboçar qualquer reação. Também há momentos nos quais um aliado passa na frente de um adversário e ele fica lá, olhando para o nada sem sequer tentar acertá-lo.
Outro ponto negativo envolvendo a questão de agir na surdina e a falta de incentivo para continuar prendendo bandidos importantes e seus aliados é que determinadas áreas foram concebidas para serem amplas o bastante para que você simplesmente ignore tudo isso. A décima fase é um bom exemplo disso: os dois primeiros bandidos perigosos estão em uma área aberta que você pode atravessar facilmente pela lateral, fazendo com que ambos os trechos, juntos, não durem mais que 10 minutos.
Falatório tupiniquim
E o que falar da dublagem da versão nacional? Não há dúvidas de que o assunto vem sendo discutido largamente depois do anúncio de que Roger Moreira, vocalista do Ultraje a Rigor, emprestaria sua voz ao protagonista. O cantor até que se esforçou em diversos momentos para passar a emoção certa para o personagem, mas no geral o trabalho ficou bem raso por alguns motivos, como a entonação e até mesmo o modo de falar algumas frases.
Isso também vale para boa parte do restante do elenco escolhido, que não fica muito longe. Você até vai ouvir vários palavrões enquanto estiver jogando, mas de que adianta eles aparecerem para dar uma ambientação mais próxima do que é visto em guetos enquanto todas as demais frases são faladas com um português totalmente correto?
Vale a pena?
Mesmo com alguns tropeços, Battlefield Hardline consegue cumprir a promessa de entregar novidades em uma boa campanha. Diferente do que foi visto em Battlefield 4, você se sente animado a acompanhar o que é apresentado aqui, ainda mais com a adição de uma opção que mostra um pouco do que está por vir assim que é feita a decisão de abandonar a partida.
Entretanto, a campanha também apresenta algumas falhas em mecânicas que a deixam longe de ser perfeita, como problemas da inteligência artificial e até mesmo a falta de incentivo para seguir agindo de forma furtiva, que acabam tirando um pouco do brilho que esse segmento do game poderia ter.
Já o multiplayer, apesar de trazer algumas ideias diferentes (como a opção de adquirir equipamentos utilizando o dinheiro obtido nas partidas), não se esforça para ir muito além do que já foi visto nos games anteriores da série. Dos novos modos de jogo, apenas Roubo, Dinheiro Sujo e Ligação Direta são realmente divertidos, o que acaba diminuindo as opções daqueles que curtem essa modalidade.
Porém, seria errado dizer que Battlefield Hardline é um jogo para ser ignorado. Está longe de ser perfeito, mas possui o seu carisma e, ainda que não esteja na sua lista de prioridades, possui algumas ideias que devem ser conferidas ao menos para dar crédito à iniciativa da Electronic Arts de tentar algo um pouco diferente com uma de suas séries mais conhecidas.
Categorias
- A campanha possui a dose certa de ação
- Inclusão da opção de agir furtivamente é algo que merece destaque
- Mapas do multiplayer são bem diversificados
- Possibilidade de adquirir seus equipamentos no multiplayer usando o dinheiro obtido nas partidas
- Modos Roubo, Dinheiro Sujo e Ligação Direta são adições muito bem-vindas
- A inteligência artificial não ajuda a criar o grau exato de dificuldade em muitos momentos
- Falta de incentivo para continuar agindo furtivamente depois de um determinado ponto
- Modos Mira e Resgate não são o melhor exemplo de diversão
- A dublagem nacional ficou abaixo do esperado
Nota do Voxel