Toda vez é a mesma história: sempre que um jogo novo é anunciado, basta vermos um trailer cheio de explosões em alta definição e uma aparência de encher os olhos para considerarmos o título como uma grande promessa. Pouco importa a história ou a jogabilidade, já que naquele momento o que realmente queremos saber é dos gráficos.
O problema é que essas expectativas dificilmente são correspondidas em games cujas propostas são mais visuais do que técnicas. Como não existe uma regra ou verdade universal que diga que um jogo bonito também precisa ser bom, somos frequentemente presenteados com ideias que ficam muito mais lindas na estante do que no console.
Bonitinho, mas ordinárioPorque nem sempre o visual corresponde à jogabilidadeDe que adianta um título com gráficos surpreendentes se esse é o único ponto alto de todo o projeto? Pode parecer algo óbvio, mas a sensação que temos é que muitas desenvolvedoras se esquecem de que é preciso muito mais do que um rostinho bonito para agradar o público.
Os campeões em utilizar a aparência para ocultar a jogabilidade meia-boca são os títulos baseados em filmes. Os vídeos de divulgação de Iron Man e Iron Man 2: The Video Game, por exemplo, realmente são de fazer você correr até a loja mais próxima para comprar uma cópia.
A construção dos personagens, a modelagem das armaduras e as cenas de batalha são realmente muito bonitas. Entretanto, de que adianta tudo isso quando é praticamente impossível andar? Com controles confusos e um sistema de voo extremamente complexo, a tecnologia do Homem de Ferro é mais um exemplo de adaptação a amargurar um péssimo resultado.
O mesmo aconteceu com James Cameron's Avatar: The Game, que era ainda mais esperado por conta do hype em torno do filme. Além de recriar o visual do planeta Pandora com muita fidelidade, o título também foi um dos primeiros a utilizar os efeitos 3D em consoles compatíveis. Como não ficar ansioso com tudo isso?
Como era de se esperar, a maldição dos jogos inspirados no cinema não perdoou. Nem mesmo os cenários coloridos e as criaturas idênticas às vistas na telona conseguiram esconder as falhas de câmera, controle de veículos e dublagem.
A queda de uma franquiaQuando nem mesmo as tradições são respeitadasOk, jogos de filmes não são bons exemplos. O que dizer, então, de um game pertencente a uma série de respeito, mas que consegue estragar tudo o que foi construído até então? Quando a jogabilidade original é substituída por gráficos incríveis é porque há algo equivocado com a produção.
O ouriço da SEGA é a personificação desse erro. Com a possibilidade de gráficos tridimensionais nos consoles atuais, a empresa abandonou o clássico gênero de plataforma que marcou época para colocar Sonic em alta velocidade por ambientes coloridos e muito bonitos.
Em Sonic Adventure, ainda para Dreamcast, a fórmula utilizada conseguiu reunir diversão e visual em uma aventura diferenciada, mas que trazia todos os elementos típicos do personagem. O problema, na verdade, é o que veio depois disso.
A imagem do raio azul nunca mais foi a mesma a partir de Sonic Heroes, para Playstation 2. A sensação que todos os fãs da mascote tiveram era de que o foco deixou de ser a jogabilidade ágil para uma corrida desenfreada e sem sentido. Ao mesmo tempo em que os fãs da franquia consideraram a evolução gráfica como o futuro do personagem, eles perceberam que as alterações eram o início de sua queda.
Os apaixonados por Final Fantasy também se deixaram enganar por várias bolas fora da Square Enix, que utilizou os dois episódios mais populares de toda a saga para gerar spin-offs lindos de se ver, mas horríveis de se jogar.
Em Dirge of Cerberus, revisitamos o mundo de FF VII, mas no papel do enigmático Vincent. A lógica é simples: o capítulo mais popular da série com um dos personagens mais carismáticos em uma aventura que utiliza todo o potencial do Playstation 2. Tinha tudo para dar certo, tanto que os trailers e vídeos promocionais fizeram com que as expectativas em torno do lançamento fossem altíssimas.
Na prática, entretanto, Final Fantasy VII: Dirge of Cerberus era intragável. Além de substituir o clássico RPG por um shooter insosso, o sistema de comandos não respondia direito e a história em nada lembrava a epopeia de Cloud e Tifa. Nem mesmo o incrível visual (para a época, que fique bem claro) conseguiu salvar esse fiasco.
Já Final Fantasy X-2 tinha um enredo tão ruim que fez a proeza de destruir todo o universo criado por seu antecessor. Os gráficos são alguns dos mais bonitos de todo o PS2, mas a trama era muito sem graça e melosa, o que desagradou completamente os fãs da franquia. O que dizer de um game que transforma uma sacerdotisa em uma estrela da música pop sem qualquer explicação?
A atual geração não conseguiu escapar da síndrome do “bonitinho, mas ordinário” que muitas séries desenvolveram. Os jogos de Time Crisis, por exemplo, são presença garantida em todos os sistemas da Sony e a mais recente vítima desse erro.
Ainda que eles nunca tenham sido lembrados por conta de sua beleza, é inegável que Time Crisis: Razing Storm empolgou com seu visual. Tiros e explosões em alta definição sempre foram animadores, principalmente quando usam um conceito como o Move para fazer a mira e atirar. Neste caso, porém, o periférico não conseguiu evitar a catástrofe.
“Mas por que as coisas têm de ser assim?”
Se você também faz essa pergunta ao ver sua série favorita ser descaracterizada em prol de uma evolução visual, saiba que a culpa é única e exclusivamente da desenvolvedora responsável pelo título. Por mais que a franquia seja forte no mercado e tenha um grande público ansioso por um novo lançamento, isso não significa que entregar um produto “feito nas coxas” seja perdoável.
Os gráficos incrivelmente bonitos podem ser considerados como a maior propaganda enganosa dos games. Como ninguém tem acesso ao jogo antes de seu lançamento, ficamos dependentes de trailers e vídeos divulgados pelos estúdios, que só nos mostram aquilo que realmente vale a pena para eles e da maneira mais adjetivada possível. Por que exibir algo que possa prejudicar as vendas, não é mesmo?
Foi o que aconteceu com Tony Hawk Ride, cujas imagens promocionais mostravam a adrenalina do esporte em um título que prometia revolucionar o gênero. Ele acompanhava um periférico em forma de skate para que o jogador realizasse as manobras na sala de casa, apresentado nos comerciais como algo fantástico.
Com exceção dos cenários e personagens extremamente realistas, nada é aproveitável em Ride, considerado um dos piores jogos dessa geração. Quem comprou o jogo (e pagou caro, já que o acessório elevou o preço final do produto) sentiu-se enganado por não conseguir reproduzir a experiência vista nos vídeos.
Mortal Kombat VS. DC Universe fez algo semelhante. Após criar uma expectativa enorme entre os fãs das duas franquias e apresentar gráficos de tirar o fôlego, o encontro entre Superman e Sub-Zero vendeu mais pelo que ele prometia ser do que pelo que o game realmente era. Com movimentos lentos e travados, as lutas eram sofríveis e faziam o jogador querer chorar por ter usado seu suado dinheiro para comprar aquilo. O único consolo eram as belas curvas da Mulher-Gato.
De novo e mais uma vezA beleza que não esconde a repetiçãoEnquanto muitos jogos utilizam os gráficos para esconder a podridão existente na jogabilidade, outros conseguem oferecer uma aventura divertida. Mas só nos primeiros minutos, pois a repetição faz com que nos sintamos dentro de um looping temporal em que realizamos as mesmas ações infinitas vezes.
O recente Star Wars: The Force Unleashed II possui animações que parecem um filme. A perfeição das texturas e expressões faciais fez com que muitas pessoas duvidassem que se tratasse de um jogo. A jogabilidade e as batalhas também eram agradáveis e davam a entender que o novo “Guerra nas Estrelas” era perfeito.
Você começa a perceber que tudo é extremamente repetitivo e que não há nada de novo à medida que você avança. São as mesmas lutas, os mesmos movimentos e os mesmos botões separados por animações de encher os olhos.
Esse foi o ponto que fez com que Final Fantasy XIII fosse duramente criticado pelos fãs da franquia. Quem conseguiu enxergar além do filme interativo que se desenrolava na tela da TV viu um jogo cuja mecânica se resume a “andar, matar monstros e ver as cenas animadas”.
Apesar de não serem exemplos de jogos ruins, tanto Final Fantasy quanto Star Wars usam os gráficos de última geração para esconder uma jogabilidade repetitiva e nada animadora. O problema é que muita gente se deixou enganar pelas cenas de computação gráfica e esqueceu que a diversão é o principal fundamento de qualquer jogo, e nesse ponto eles decepcionaram.
A pobreza como virtudeAinda existem jogos em que a diversão é maior que os gráficosQuando o TecMundo Games analisou Scott Pilgrim VS. The World, muitos usuários criticaram seus gráficos, considerando-os não merecedores do potencial do Playstation 3 e Xbox 360. Ainda que o game não trouxesse nada de inovador, a ideia de homenagear os clássicos 16-bits, como Streets of Rage e Double Dragon, coube perfeitamente no visual utilizado.
Esse é apenas um exemplo de títulos subestimados por oferecerem propostas que fogem do padrão de alta definição que a maioria dos games adota. Em vez de apelar para gráficos realistas, esses jogos vão pelo caminho inverso e apostam todas suas fichas em jogabilidade e diversão.
É compreensível que os proprietários dos consoles de última geração sintam-se frustrados ao ver algo totalmente pixelado e sem realismo algum na tela de sua TV. “Se é para não ter evolução alguma, que continuássemos com nossos SNES”.
São pensamentos assim que impedem o desenvolvimento de novos Super Meat Boys, Braids e Limbos. A maioria dos estúdios evita criar games com gráficos alternativos com medo que os usuários considerem a simplicidade como um desleixo. Como a primeira impressão é a que fica, é fácil imaginar que o visual pobre trará uma jogabilidade deficiente.
Entretanto, é preciso saber diferenciar incompetência de propostas inovadoras. A aventura do bolo de carne, por exemplo, é totalmente feita com quadrados e sem muitos detalhes exatamente para referenciar Meat Boy, o clássico em Flash do qual foi originado. Já títulos como Naughty Bear são visualmente ruins por serem mal feitos mesmo.
Por fim, o mercado atual exige que o jogador o enxergue com outra perspectiva: a de que ideias inovadoras estão escondidas em imagens não atraentes, mas tremendamente divertidas. Estúdios independentes estão ganhando cada vez mais espaço para divulgar seus produtos dentro da PSN, LIVE e WiiWare e é preciso dar valor a essas novas ideias para que a diversão volte a ser o foco da indústria de games.