Enquanto fazia a análise de Silent Hill: Book of Memories há algum tempo, tive a “oportunidade” de bater de frente novamente com algo que pode ser realmente constrangedor em um jogo. Não, não se trata aqui da tentativa morna da Konami de dar um novo direcionamento para a sua consagrada franquia. Embora isso também tenha sido bastante desconcertante, eu me refiro aqui à dublagem em português do game.
Basicamente, se já é difícil sentir qualquer tipo de empatia pela história repetitiva e cheia de pontas soltas (inúteis) de Book of Memories, a dublagem apenas serviu para jogar mais uma pá de terra. Tratava-se ali de um desfile interminável de traduções toscas e interpretações que deixariam mesmo Sylvester Stallone envergonhado (Adrian!).
O grande problema? Book of Memories não é um caso isolado. Na verdade, as dublagens de games para o português são historicamente ruins — algumas chegando a ser uma grande e bela m***a mesmo.
Na verdade, a ocasião até serviu para refrescar a minha memória. Lembrei-me do primeiro Uncharted, por exemplo. É claro que a questão ali não era propriamente a expressão dos atores — o problema, pelo menos no meu caso, era sentir empatia enquanto ouvia diálogos intensos pronunciados no chamado “português de Portugal”.
Na verdade, sempre me parecia uma piada de português em andamento... Uma anedota que nunca terminava (e eu sou filho de portugueses, portanto, relevem!). O mesmo inconveniente ocorria também no primeiro Little Big Planet. Quer dizer, como se esquecer daquele narrador? “(...) a ixfera duish sunhadorish [a esfera dos sonhadores]”, dizia o entusiasmado companheiro lusófono.
A questão ali, à época, ainda era a raridade de dublagens em português “tupiniquim”. Sim, há mais jogos “localizados” (como gostam as publicadoras) hoje, tanto para o Brasil quanto para vários outros países. O problema é que os resultados ainda são, em grande parte das vezes, apenas medíocres.
Ah, Miami
Uma controvérsia recente envolvendo Uncharted 3: Drake’s Deception pode ajudar a vislumbrar uma das “pedras no sapato” mais recorrentes quando o assunto são dublagens para o “português brasileiro”.
Na verdade, a dublagem definitiva do game foi desenvolvida por um estúdio residente em Miami (EUA), o que ocorreu também com diversos outros games — tais como Killzone 3 e inFamous 2. Tratam-se de trabalhos obviamente feitos de qualquer jeito, sem um mínimo de qualidade interpretativa e mesmo sem traduções adequadas — embora, vale ressaltar, isso não necessariamente tenha a ver com os dubladores envolvidos.
Mas Drake’s Deception foi um caso ainda mais curioso. Isso porque houve uma proposta de um estúdio daqui, o Zeger Studios. Embora “bom” e “ruim” ainda sejam avaliações bem subjetivas, ao contrapor o material provisório da Zeger com a versão definitiva, é fácil considerar que o resultado ali poderia ter sido bem melhor (confira abaixo).
Superproduções não são recriadas assim tão facilmente
Ao que parece, as dublagens em games para o português daqui ainda são encaradas de forma muito leviana. Falta de interesse das produtoras? Pode ser. Mas o ponto em questão aqui é: uma boa dublagem deveria levar em conta diversos pontos. Por exemplo, a quantia empenhada no desenvolvimento das linhas de áudio originais.
Um bom caso pode ser o de Star Wars: The Old Republic. Em 2011, o game chegou ao mercado apresentando algo que poucos haviam mostrado até então: investimentos pesados em dublagem cinematográfica. Foram cerca de 250 mil linhas de falas, gravadas por 320 atores. De fato, o jogo foi parar no Guinness como “a produção com o maior número de atores interpretando vozes”.
E aí eu pergunto: é fácil simplesmente dublar algo assim? São horas e horas de gravações, centenas de envolvidos, centenas de “takes”. Na verdade, nem é preciso chegar nos recordes. Considere a dublagem original (em inglês) de Batman: Arkham City, por exemplo. Colossos da interpretação como Mark Hamill e Kevin Conroy obviamente se envolvem profundamente com a interpretação — que vai além das falas, conforme mostra o vídeo acima.
Alguns bons sinais...
Em suma, é preciso mais do que um trabalho feito às pressas para conseguir recriar — com um mínimo de autenticidade — as experiências sonoras de um bom game. Sim, isso ainda é algo tremendamente incipiente no Brasil... Mas há alguns bons sinais no horizonte. Diablo III por exemplo, conta com um trabalho de “localização” bastante razoável. Também Call of Duty: Black Ops 2 tem deixado muita gente esperançosa.
Enfim, verdade seja dita: goste você ou não de ouvir os diálogos daquele seu game favorito em português, fato é que o Brasil tem alguns dos melhores dubladores do mundo — como vários filmes podem provar facilmente. Resta saber quando, exatamente, essa qualidade será também uma referência em jogos de video game.
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