Mais do que pela jogabilidade viciante ou pelos protagonistas diversificados, Diablo III vai ficar marcado na história como o game que iniciou uma nova era para os sistemas de DRM (Digital Rights Managment). A megaprodução da Blizzard eliminou totalmente a possibilidade de se jogar offline, mesmo que a intenção seja enfrentar as criaturas do inferno sozinho.
Segundo a empresa, o motivo para isso não era exatamente combater a pirataria, mas sim possibilitar uma maior integração entre os personagens e itens que povoam seu universo. Uma justificativa em certo ponto aceitável, ainda mais quando se pensa na Casa de Leilões, sistema que deve garantir uma renda fácil para a companhia durante alguns anos.
Porém, basta olhar para os jogos anteriores da produtora para ver que a ausência de um modo offline é, em sua essência, um novo tipo de proteção contra fraudes. O próprio Diablo 2 serve como um exemplo de solução fácil contra problemas do tipo: quem jogava no modo single player era barrado da versão fechada da Battle.net, solução que diminua sensivelmente o risco de que existissem itens falsos no sistema (sem eliminá-lo completamente, que fique bem claro).
Pagando o preço pelas atitudes dos outros
Algo que já ficou claro para os consumidores, mas que não parece entrar na cabeça dos executivos de grandes empresas é que DRMs agressivos como o adotado pela Blizzard e outras empresas simplesmente não funciona. Quanto mais complexo o sistema de segurança adotado por uma companhia, mais rápido vai surgir algum hacker interessado em destruí-lo, dando espaço para a pirataria.
Quem sai prejudicado nessa história é quem compra o produto legítimo, não aqueles que simplesmente baixam novos games através de sistemas de torrent. Exemplo maior disso é o que acontecia até bem recentemente com os jogos da Ubisoft, que também exigiam uma conexão constante com a internet para funcionarem.
Enquanto quem comprou Assassin’s Creed 2 era punido toda vez que a ligação com a internet era interrompida (ou quando os servidores da produtora passavam por alguma manutenção), aqueles que optaram por meios “alternativos” não tinham esse problema. Eventualmente, a empresa decidiu abandonar de vez essa prática, não sem antes criar uma mancha em sua imagem perante aqueles que adquiriram seus games de forma legítima.
Como estimular a compra do original?
Vamos ser sinceros: não são os preços exagerados que fazem com que os jogadores apelem pela pirataria. Esse é um fator que certamente ajuda, mas que não se mostra realmente decisivo — basta ver que há pessoas que pirateiam games de iPhone e Android que custam menos de R$ 5, mesmo podendo pagar esse valor sem que ele tenha impacto em seus orçamentos.
O fato é que, em vez de criar DRMs cada vez mais complexos, as empresas deveriam investir em vantagens para quem compra games originais. Oferecer DLCs gratuitos ou um sistema de suporte realmente eficiente são soluções simples, mas que se mostram bastante eficientes em criar um público fiel — exemplo disso é o trabalho que a CD Projekt Red teve com os games da série The Witcher.
Sistemas de distribuição digitais como o Steam mostram que, se uma autenticação online realmente é necessária, ela não precisa ser intrusiva, tampouco deve limitar a experiência dos jogadores. Outro exemplo é dado pelo GOG, que oferece títulos sem qualquer DRM acompanhados por itens especiais, como livros de arte, avatares para fóruns de discussão e guias de jogo detalhados.
Um precedente perigoso
O que mais preocupa no caso de Diablo III é que ele abre um precedente perigoso para a indústria. Embora o game sofra com problemas de conexão no momento, a Blizzard tem a experiência e os recursos financeiros necessários para tornar os servidores do game estáveis, o que deve diminuir os inconvenientes do single player online em pouco tempo.
Além disso, a desenvolvedora é conhecida por estender o suporte a seus títulos de forma indefinida, como bem provam o primeiro StarCraft e o Diablo original, que até hoje ganham atualizações esporádicas e podem ser jogados online sem problemas. Infelizmente, nem todas as empresas apresentam a mesma dedicação, por mais dinheiro que tenham em caixa.
Companhias como a Electronic Arts não veem qualquer problema em cortar funções online de títulos que ainda têm uma base estável de jogadores. Até mesmo games populares como Battlefield 3 estão sofrendo com a falta de suporte, já que a companhia decidiu fechar vários de seus servidores oficiais, que aos poucos estão sendo substituídos por máquinas alugadas por alguns de seus consumidores.
Caso a moda do single player online pegue, podemos estar prestes a ver o lançamento de diversos títulos com datas de validade cada vez menores. Isso pode fazer com que games assumam cada vez mais características próprias a serviços temporários do que algo duradouro e que pode ser acessado a qualquer momento — quase como se, em vez de poder comprar um DVD de um filme, só fosse possível assisti-lo enquanto ele está em cartaz no cinema por tempo limitado.