Coluna: o que é jogabilidade?

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Pode parecer bobeira, mas muitos jogadores não fazem ideia do significado real da palavra jogabilidade. Isso acontece porque ela é consequência de uma MESMA tradução para três palavras DIFERENTES no inglês: gameplay, mechanics e playability. Sim, são três coisas distintas.

Tudo bem, até mesmos os desenvolvedores nos confundem com alguns conceitos ambíguos, veja exemplos:

  • “(Jogabilidade é) uma série de escolhas interessantes” – Sid Meier, autor de Civilization
  • “Um jogo com boa jogabilidade é aquele em que você ‘vence’ fazendo coisas inesperadas ou fazendo-as funcionar” – Andrew Rollings e Dave Morris, autores do livro Game Architeture and Design
  • “A experiência da jogabilidade corresponde a uma interação entre o design do jogo e o desempenho de tarefas cognitivas, com uma variedade de emoções decorrentes ou associadas a diferentes elementos de motivação, desempenho de tarefas e conclusão” – Craig Lindley, Lennart Nacke e Charlotte Sennersten

Sinistro de complexo, não é mesmo? Vou descomplicar isso aí. Hoje, quero elucidar o que realmente é jogabilidade para que nunca mais você utilize essa palavra em vão quando comentar em sites e fóruns afora que o jogo X tem ótima/péssima jogabilidade.

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Jogabilidade é...

A forma específica como você (jogador) pode interagir no ambiente em que se encontra. Portanto, jogabilidade não tem nada a ver com gráficos, história ou elementos de áudio. São as regras, os padrões que conectam o jogador ao jogo. É o que chamamos em inglês de gameplay. Portanto, ao avaliar se um jogo tem bom/péssimo gameplay, você precisa estar atento a quatro quesitos:

  1. O ambiente em que os personagens estão presentes;
  2. A possibilidade de alterar os objetos existentes no ambiente (ou até o próprio ambiente);
  3. As regras que governam a mudança de estado dos objetos presentes (como a mudança de posição);
  4. As recompensas e punições que resultam ao se alterar o ambiente.

Em outras palavras, gameplay é toda a interação que diferencia um livro ou um filme de um jogo, pois neste você pode influenciar o contexto e mudá-lo.

Exemplo prático:

Ao avaliar o gameplay de Assassin’s Creed, nós levamos em consideração que é possível pular, saltar, escalar, se esconder, lutar, se escorar, andar a cavalo, assassinar alvos, alterar as habilidades do protagonista, usar diferentes armas... Enfim, tudo que é possível fazer/modificar perante o ambiente no qual estamos inseridos.

Um jogo que tem bom gameplay, atualmente, é aquele com uma gama diversificada de possibilidades para interagir com o cenário, como as séries Uncharted e The Elder Scrolls. Agora, o gameplay deficiente é aquele cuja interação é limitada, tornando as ações repetitivas ou de pouca relevância para o contexto do jogo — maior crítica de Final Fantasy XIII.

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Mas jogabilidade também é...

A mecânica de jogo (game mechanics), que executa corretamente as ações realizadas no controle. É quando o jogador cria uma expectativa com o resultado de apertar determinado botão ou uma sequência, e na tela isso acontecer exatamente como ele pensou.

Exemplo prático:

A série Pro Evolution Soccer antes da versão 2010 tinha um grave problema de game mechanics. Imagine que você estava avançado rumo ao campo adversário pela lateral e resolvia mudar a direção rapidamente... Então, o artilheiro matador do seu time misteriosamente demorava uns dois segundos para completar a ação e a fazia além das quatro linhas do campo. Isso é um grande problema de mecânica dos controles.

Por outro lado, o jogo de luta Street Fighter vs Tekken e o FPS Battlefield 3 são dois exemplos com excelentes game mechanics, pois todos os comandos são responsivos em frações de milésimos de segundo. São títulos que não conseguem atrair os jogadores se os controles forem difíceis ou demorados.

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Peraí, mas jogabilidade não representa...

...a facilidade com que um jogo pode ser jogado, bem como a quantidade ou duração para terminá-lo completamente? Trata-se aí da playability, que é o resultado da qualidade do gameplay. Ter uma boa playability significa adequar um jogo a vários tipos diferentes de jogadores, sem frustrá-los. Em outras palavras, é tentar agradar a gregos e troianos, a novatos e veteranos, a casuais e hardcore.

Um quesito extremamente difícil, mas que precisa ser avaliado por várias ópticas: satisfação, curva de aprendizado, imersão, motivação, eficiência, capacidade de emocionar e possibilidade de socialização. É, moçada, vida de analista de games não é tão mole. Não basta sentar, comer e jogar a tarde toda.

Exemplo prático:

Mass Effect 3 é um jogo que buscou se adequar aos diferentes perfis de jogadores. Além de contar com um breve tutorial dentro da história principal, ele permite escolher entre três diferentes modos de jogo:

  • Você quer só a parte de ação, com poucos diálogos? Tudo bem...
  • Você gosta da história e quer assistir a mais cenas de animação? Ótimo!
  • Quer os dois estilos anteriores juntos para ter uma experiência de RPG completa? Manda ver

BioWare se preocupou muito para ter uma ótima playability e atingir um número ainda maior de jogadores. E quando o caso é o oposto? Demon’s Souls e Dark Souls são exemplos perfeitos para este caso, visto que têm curva de aprendizado altíssima e se restringem a um número pequeno de jogadores pela dificuldade insana.

Claro que isso não torna esses dois jogos necessariamente ruins, há quem encare a dificuldade como um desafio. Vale ressaltar a inteligência dos desenvolvedores neste caso, que compensaram as penalizações com várias horas de jogo.

Veredito

O intuito deste artigo não é pregar que todos nós falamos errado e que, a partir de hoje, devemos trocar a palavra jogabilidade por outras estrangeiras. Muito pelo contrário, eu gostaria que os leitores refletissem e aprendessem um pouco mais sobre video game.

Afinal, quando falamos jogabilidade em português, podemos estar nos referindo a três coisas diferentes, o que pode empobrecer seu comentário ou até invalidar seu argumento em uma discussão. Sendo assim, proponho um exercício: tente analisar e abordar cada um destes três conceitos isoladamente.

Quem sabe não seja a hora do TecMundo Games mudar a nota de Jogabilidade das análises para outro nome, como Controles, para evitar confusões? O que vocês acham disso tudo?

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