Parece que a pluralidade finalmente começou a se difundir pelo terreno inegavelmente tradicionalista dos vídeo games. A globalização? Talvez. Fato é que nunca antes na história do entretenimento eletrônico se viu uma profusão tão grande de culturas, gostos e personalidades.
Quer dizer, o que antes era território exclusivo do “macho alfa” — preparado para matar com igual eficácia monstros alienígenas e comunistas, às vezes simultaneamente — é capaz de hoje colocar a responsabilidade sobre um belo par de cromossomos X, sobre um bêbado visionário, sobre um herói oportunista.
Mas há um assunto ainda mais controverso quando se trata da permissividade da nova e multifacetada indústria de games: como anda o espaço para os homossexuais? Ok, ninguém negaria que personagens de orientação sexual “duvidosa” aparecem já há algum tempo em jogos perdidos aqui e ali.
Se não, basta lembrar-se de sujeitos como Tingle (The Legend of Zelda: Majora’s Mask), ou Vamp (Metal Gear Solid 2), Voldo (Soulcalibur)... Além de uma grande profusão de jogos atuais que tem deixado a natureza do romance central da trama a cargo do próprio jogador — Mass Effect e The Sims, por exemplo.
Entretanto, será esse espaço realmente genuíno? Será que tanto o “jogador médio” atual quanto a moderna e cosmopolita indústria de games incluíram, em caráter definitivo, a diversidade sexual na sua lista de elementos moralmente aceitáveis em um jogo? Bem, de certa forma, sim. Mas isso ainda parece ser um tanto relativo.
Uma homossexualidade caricataSeres humanos completos... Ou comédias ambulantes?
Mesmo com o contingente considerável de personagens aberta ou disfarçadamente homossexuais nos jogos, não há como negar certo padrão. Basicamente, grande parte deles ainda é retratada como personagem secundário e caricato, do tipo que se encontra ali para tornar a trama mais descontraída — um bom exemplo dessa “classe” poderia ser o vilão Ash, de Streets of Rage 3.
Surge então a seguinte dúvida: essa inclusão é realmente positiva do ponto de vista social? É lisonjeira como retrato de uma parcela da população? será que algum homossexual se sentiria representado com algo do gênero?
Conforme colocou Lydia Sung em seu artigo para o site Neoseeker, olhar a coisa apenas pelo lado da indústria provavelmente não funcionaria. “Uma mudança social é provavelmente o único jeito de garantir aceitação nos games, mas todos nós sabemos que isso demanda muito tempo e esforços incansáveis por parte das massas”.
Uma exposição gradual de novos padrões
Conforme é bem sabido desde que o ser humano se tornou um ser cultural, qualquer nova ideia deve ganhar seu espaço de forma gradual. Naturalmente, o fenômeno da comunicação de massas tornou a tarefa muito mais rápida nos dias de hoje... O que vale também para os video games, é claro. “Já que os nossos padrões sociais são grandemente influenciados pela mídia que nós ingerimos todos os dias, talvez se possa aplicar esse mesmo princípio para os video games”, afirmou Lydia ao referido site.
Algo distinto da abordagem que ainda predomina em grande parte da indústria de jogos, vale ressaltar. E não se trata aqui apenas de homossexuais, é claro. “Considere como o ‘elemento externo’ é frequentemente retratado em jogos populares. Mulheres fortes que sejam personagens de apoio aparecem sempre subordinadas a um macho líder; mulheres líderes, que mostrem força extraordinária, são transformada em objetos sexuais para que sejam menos ameaçadoras.”
É fácil perceber que nenhuma abertura para novos padrões morais de sexualidade se beneficiaria de tratamento semelhante. “Seria lamentável se a homossexualidade caísse pela mesma ribanceira caso houvesse mais personagens abertamente gays ou lésbicas em títulos de grande porte.”
Viva a diversidade em pixels!Conheça alguns games que tratam da homossexualidade
Justiça seja feita: embora gays e lésbicas ainda apareçam de forma cômica em boa parte dos blockbusters, há alguns arautos que tratam do tema de forma bastante natural. Afinal, é de se esperar que um gay seja algo mais ao longo da sua vida do que apenas... Gay, certo? Talvez, ele/ela possa salvar a galáxia antes de voltar para os braços do ser amado — que, em alguns casos, pode até mesmo ser de outra raça (confira abaixo).
- Mass Effect
Qualquer um que tenha feito de seu comandante Shepard, em Mass Effect, uma mulher deve ter percebido certa “possibilidade” em determinado ponto da trama. Basicamente, um dos personagens coadjuvantes (uma “mulher”, para fins de comparação) pertence à raça Ansari. Ela invariavelmente vai se interessar pelo seu herói... Mesmo que ele seja, na verdade, uma heroína.
- Fable II
Ok, Fable II talvez não seja o melhor exemplo do mundo em abertura sexual. Afinal, a possibilidade de o seu herói se relacionar com pessoas do mesmo sexo é razoavelmente obscurecida por uma infinidade de atividades menos, digamos, “morais” — que o diga quem já angariou as conquistas “The Swinger” ou “The Bigamist”. Mas a intenção deve contar... De alguma forma.
- Jade Empire
O RPG da BioWare é famoso por seu conteúdo romântico bastante permissivo. Basicamente, envolva-se com quem quiser... A escolha é sua. O beijo dos personagens Sky e Ming já é quase um clássico (confira acima).
- Dragon Age: Origins
Mais um caso de mundo aberto que diz “faça o que lhe der na telha”. De fato, a coisa vai além de um singelo e moralmente aceito encontro homo. Isso pode ser facilmente comprovado por qualquer um que tenha frequentado certo bordel do jogo. Seres humanos, animais... Tem para todos os gostos.
- The Sims
Eis uma das inclusões mais silenciosas da temática homo em games. Construa a sua casa, mobílie, arranje um emprego, se case — com um homem ou com uma mulher, a escolha é sua.
Como você encararia um protagonista gay?Uma evolução necessária da moral nos games
O site Gamasutra lançou a seguinte hipótese em artigo recente: e se Nathan Drake, o protagonista extremamente popular da série Uncharted, fosse gay? Quais seriam os efeitos na trama? Qual seria a reação dos jogadores? Qual seria a sua reação?
Provavelmente é possível esperar por várias respostas raivosas diante da possibilidade. Entretanto, talvez fosse mais conveniente colocar as coisas nos seguintes termos: isso realmente afetaria o herói que Nathan Drake representa? Quer dizer, ele perderia suas habilidades físicas excepcionais, seu raciocínio ligeiro ou seu carisma caso tivesse uma orientação sexual diferente da que todos nós acreditamos que seja o caso?
Enfim, eis o grande ponto aqui: questões controversas como a homossexualidade ou diferenças étnicas apenas serão completamente absorvidas pela indústria de games quando não passarem de um mero detalhe. Afinal, é de se esperar que um herói decente seja mais do que apenas uma raça, um gênero ou uma orientação sexual.
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