Ao fuçar memória adentro, uma das primeiras remasterizações que me vem à cabeça é o pacote Super Mario All-Stars. Lançado para o Super Nintendo no início dos anos 90, o título trazia para a recém-inaugurada quarta geração de consoles os jogos do bombeiro que foram, em grande medida, responsáveis pela marca perene deixada pelo Nintendinho na história do entretenimento eletrônico.
Mas esse não é o único motivo para que Super Mario All-Stars seja memorável. O pacote de jogos do encanador provavelmente também é fácil de se lembrar porque, à época, realmente havia poucas remasterizações.
Quer dizer, qual deveria ser o propósito para que as desenvolvedoras passassem a desencavar constantemente o passado com o pretexto de trazer melhorias? Por via de regra, cada nova geração era melhor em todas as dimensões se comparada com a anterior — de maneira que virar a página e esperar o que poderia vir de um novo lançamento era algo bastante natural. Na verdade, grande parte dos títulos em novas gerações já representavam melhorias em vários sentidos.
Isso nos traz à questão central desta pequena reflexão: se os saltos de geração continuaram ocorrendo — a despeito de críticas ou da falta de dinheiro de algum jogador em particular —, por que há tantas remasterizações hoje em dia? O que tem tornado títulos clássicos, disponíveis em gerações anteriores, mais interessantes do que aquilo que deveria ser o suprassumo da indústria?
Houve mesmo um salto de geração?
Em uma coluna escrita há muitos anos aqui no BJ, este redator escreveu o seguinte:
“Quando as primeiras gerações deram as caras, era fácil perceber que o mercado de jogos existia dentro de um nicho razoavelmente específico — sempre mantendo um padrão de desenvolvimento/inovação essencialmente linear.
“Dessa forma, com cada novo lançamento e com cada novo console colocado na prateleira ditando o ‘compasso’, era até natural que todos os olhos se voltassem para alguns colossos que, após um período de estagnação e deterioração dos seus produtos, passavam a mover novamente as pesadas engrenagens da indústria, ditando assim novos rumos.”
O texto acima foi escrito no momento em que a atual geração de consoles, a oitava, ensaiava seus primeiros passos, mas a reflexão parece mais atual do que nunca. Afinal, o que se vê, em suma, é uma nova geração de consoles que talvez não tenha sido suficientemente atraente por si só para justificar um desligamento dos jogadores em relação ao que veio antes, sobretudo na sétima geração (PlayStation 3 e Xbox 360).
Mudança de paradigma
O que fazia dos primeiros saltos geracionais algo tão natural eram, basicamente, as mudanças de paradigma oferecidas por um novo sistema; as alterações na forma como você via e interagia com o universo virtual dos jogos.
“Saltar” do seu Mega Drive ou do seu Super NES para um novíssimo PlayStation 1, por exemplo, significava largar o formato relativamente cansado das plataformas e das estruturas isométricas chapadas por belos ambientes tridimensionais — incluindo personagens capazes de falar, em vez de simplesmente regurgitar textos.
Ocorre que essas alterações talvez tenham se tornado mais e mais sutis ao longo dos anos. Fala-se de gráficos e som melhorados... Mas o formato dos jogos, essencialmente, parece ter experimentado certo desligamento das funcionalidades ditadas por novas plataformas. Há jogos com novas propostas, é claro. Mas muitas dessas novas direções são razoavelmente independentes do que oferecem as novas arquiteturas oferecidas pelas fabricantes.
Os sinais de cansaço das “gerações”
Longe de ser uma estagnação em termos de desenvolvimento, entretanto, a impressão que fica é a de que o formato “geração” tem perdido força. Afinal, não seria de todo questionável comparar o “salto” dado do PlayStation 3 para o PlayStation 4 como algo análogo a fazer um upgrade no PC. Há um console mais poderoso, é verdade. Mas o paradigma dos jogos se mantém razoavelmente o mesmo — incluindo as várias propostas online, algo já bastante comum na sétima geração.
Dessa forma, se o meu novo video game se destaca, essencialmente, pela capacidade de proporcionar uma melhor experiência sensorial, sem alterações dramáticas no formato dos jogos... Então por que eu deveria acreditar que alguma página foi virada? Há algo tão incrivelmente melhor do que BioShock ou The Last of Us nas atuais gerações — algo que justifique um “salto de geração”? Dificilmente.
Décadas de Histórias e de lembranças
Mas é provável que nem tudo se justifique em um desinteresse dos jogadores pelas vantagens proporcionadas pela oitava geração. Na verdade, mesmo entre quem defende o PlayStation 4 ou o Xbox One, é comum ouvir sobre o quão interessante seria jogar alguns dos melhores títulos dos últimos anos em versões revigoradas, com áudio e gráficos atualizados — mesmo que a essência de jogo permaneça razoavelmente a mesma... Ou talvez por isso mesmo.
Por outro lado, não falta quem aponte a avalanche atual de remasterizações como um desserviço aos desenvolvedores que tentam abarcar a nova geração — que partem para a criação de franquias ou títulos realmente inéditos.
A estes talvez valha contar sobre os primeiros passos de outra forma incrivelmente popular de mídia: o cinema. Em sua gênese e em seus primeiros anos, o que mais se via era pioneiros experimentando formas de retratar a realidade nas películas — levando para os filmes enquadramentos, cortes, efeitos especiais etc.
Passado um tempo, entretanto, essa evolução se tornou um tanto mais lenta, cedendo lugar sob os holofotes às histórias que poderiam ser contadas ali. Talvez estes sejam os dias atuais para o video game: o momento de se ocupar mais em contar novas histórias do que em imaginar novos formatos comercializáveis. E nesse cenário, realmente não há qualquer problema em relembrar alguns dos melhores contos virtuais que as últimas décadas nos trouxeram.
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