Call of Duty é um gigante da indústria. Até o momento, foram 14 jogos lançados e, mesmo em um ritmo de lançamentos anuais, continua aparecendo no topo das listas de jogos mais vendidos do ano. Entretanto, a franquia vem perdendo força e apresenta graves sinais de desgaste.
Ela deixou de ser uma série influente e, hoje, é especialista em incorporar elementos que deram certo em outros jogos. O que aconteceu no meio do caminho? Até onde conseguirá manter a relevância e a popularidade?
Tempos de ouro
O primeiro game foi lançado em 2003, desenvolvido pela Infinity Ward. Diversos membros do estúdio haviam trabalhado no aclamado Medal of Honor: Allied Assault, publicado um ano antes, e Call of Duty foi praticamente um sucessor espiritual.
O game manteve o cenário da Segunda Guerra Mundial e seu motor gráfico, mas trouxe um modo single player muito mais cinematográfico, três campanhas com diferentes pontos de vista da guerra (soviéticos, americanos e britânicos) e NPCs sempre presentes, dialogando entre si. Também foi um dos primeiros jogos a implementar um botão dedicado à mira, o ADS (aiming down sights). Foi um sucesso arrasador.
O game levou mais de 90 prêmios de jogo do ano e vendeu incrivelmente bem para uma nova propriedade intelectual. Suas primeiras sequências chegaram em 2005 e 2006, firmando a franquia de vez como um dos maiores nomes no gênero. Em 2007, a saga abandonou a temática de Segunda Guerra Mundial, já saturada, e apostou em conflitos atuais. Call of Duty 4: Modern Warfare definiu diversos padrões no gênero, como a jogabilidade e o esquema de botões, e seu legado permanece até hoje.
Isso sem mencionar, claro, o componente multiplayer, que trouxe muitas customizações, modos que se tornaram clássicos (como o Domination) e um sistema de progressão viciante. Graças a esse jogo, Call of Duty passou de uma grande franquia no gênero FPS para um dos maiores nomes em toda a indústria.
Ciclo anual, mais do mesmo
Modern Warfare 3 (2011) marcou o ápice em popularidade da saga, mas também foi cercado de discussões sobre uma possível estagnação criativa. Call of Duty tornou-se uma franquia anual já em 2006, com um novo título sempre em novembro, e muito por conta disso vimos jogos cada vez mais parecidos entre si desde então. A fórmula estabelecida em 2007 foi replicada sem grandes novidades nos games seguintes, rendendo muitas reclamações.
A fórmula estabelecida em 2007 foi replicada sem grandes novidades nos games seguintes, rendendo muitas reclamações
A situação chegou a um ponto crítico em 2013, com o lançamento de Call of Duty: Ghosts. É o jogo com as piores avaliações em toda a saga, e há praticamente um consenso na comunidade de que esse foi o título mais decepcionante até então. A série precisava de novos ares — que vieram no ano seguinte, com Call of Duty: Advanced Warfare.
De influente a influenciado
Até então, dois estúdios revezavam no desenvolvimento da franquia, alternando em cada ano: Infinity Ward e Treyarch. Em 2014, uma nova equipe entrou na brincadeira, a Sledgehammer Games, que já havia auxiliado no desenvolvimento de Modern Warfare 3. Isso marcou o início dos ciclos de 3 anos de desenvolvimento, que, de acordo com a Activision, beneficiaria a franquia em longo prazo.
Advanced Warfare (2014) foi talvez o jogo que mais trouxe mudanças no núcleo da saga, adotando um contexto futurista com exoesqueletos que possibilitavam pulos duplos no ar e rápidos impulsos em todas as direções. Apesar da louvável inciativa de trazer novidades, o título não foi bem recebido pela comunidade. Além disso, a saga passou a incorporar diversos elementos de outros jogos do gênero, rendendo até algumas polêmicas.
Titanfall foi lançado em março de 2014, alguns meses antes de Advanced Warfare, e chamou a atenção justamente por seus pulos duplos e verticalidade. Com exceção das corridas na parede, tudo isso também estava presente no novo Call of Duty. É claro, são jogos bem diferentes, no geral, e até vale mencionar que Advanced Warfare estava em desenvolvimento desde 2011, muito antes do anúncio de Titanfall, mas que as semelhanças deixaram uma pulga atrás da orelha... Deixaram.
Agora, se havia dúvidas quanto às inspirações de Advanced Warfare, não dá para dizer o mesmo de Black Ops 3 (2015). O jogo manteve o contexto futurista e trouxe as corridas na parede, exatamente como em Titanfall. Levando em conta que o desenvolvimento de Black Ops 3 começou em meados de 2013 e que o título da EA foi anunciado por volta do mesmo período, é difícil acreditar que não houve influência.
Não para por aí. Black Ops 3 também se inspirou em outro jogo, Destiny (2014), com seu sistema de especialistas. São personagens com armas ou habilidades especiais desbloqueáveis durante as partidas, independentemente do desempenho do jogador (ao contrário dos populares killstreaks). É um sistema muito semelhante às classes e subclasses de Destiny, e algumas das habilidades são idênticas, como as lanças gravitacionais do personagem Ruin e a super-habilidade da subclasse combatente.
Até mesmo Call of Duty: WWII (2017), cuja proposta foi resgatar as origens da franquia, trouxe diversos elementos de outros jogos. O game possui uma área social, exatamente com a Torre em Destiny, e em vez de exibir o último ponto ao final de uma partida, como é desde os primórdios da série, agora mostra a melhor jogada, assim como em Overwatch.
Até quando?
Call of Duty vive um complicado dilema: manter-se fiel à fórmula que o consagrou ao mesmo tempo que tenta trazer novidades no seu ritmo acelerado de lançamentos. Enquanto alguns fãs clamam por inovações, outros preferem a zona de conforto. Pelo visto, adaptar elementos que deram certo em outros jogos foi a maneira encontrada de trazer novidades sem correr muitos riscos.
Call of Duty deixou de ditar o gênero e, de certa forma, vive na sombra de seu próprio passado
Há anos a saga não traz algo realmente novo para a indústria como foi em seus primórdios. Call of Duty deixou de ditar o gênero e, de certa forma, vive na sombra de seu próprio passado. Permanece vivo muito graças ao que foi estabelecido anos atrás.
Obviamente, isso é consequência do modelo anual. Franquias muito longas, principalmente as que recebem um novo título a cada ano, tendem a perder a força gradativamente. Vimos isso com Need for Speed e Assassin’s Creed, só para citar alguns exemplos. Dá até para dizer que, para uma franquia que é anual há mais de uma década, Call of Duty vai muito bem. O revezamento de três estúdios possibilitou jogos mais polidos e cheios de conteúdo — e apesar das quedas nos números desde Modern Warfare 3, permanece como um dos nomes mais fortes da atualidade.
O revezamento de três estúdios possibilitou jogos mais polidos e cheios de conteúdo — e apesar das quedas nos números desde Modern Warfare 3, permanece como um dos nomes mais fortes da atualidade. No entanto, fica a pergunta: até quando?
No entanto, fica a pergunta: até quando? Call of Duty: WWII levou a saga de volta às suas origens e conseguiu acalmar os fãs enfurecidos pela onda de jogos futuristas, mas será que esse tipo de abordagem é suficiente para manter a franquia de pé por muitos anos? A comunidade de Call of Duty é uma das mais fiéis que há por aí, mas como será diante de outros gigantes em ascensão, como Playerunknown's Battlegrounds e Fortnite?
Talvez a equipe precise repensar o ritmo de lançamentos anuais, que, apesar de render muito lucro, pode representar um desgaste irreparável a marca. Não há uma saída simples, é verdade, mas, diante de uma indústria em constante mudança, é necessário se adaptar para permanecer vivo. Como um fã de longa data, espero que a franquia permaneça forte e nos traga novos jogos tão incríveis e impactantes como foi no passado.
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