De um texto de opinião sobre um jogo recém-lançado até a média de 0 a 100 em um agregador, análises e notas fazem parte do cotidiano de quem acompanha a indústria dos videogames. É incentivo de compra para muitos jogadores e de prestígio a desenvolvedores.
Por outro lado, também é um tema que rende discussões sobre confiabilidade, injustiças e o real propósito destas avaliações. Até onde as análises e notas são relevantes? É possível sintetizar experiências de jogo em pontuações?
Metacritic e videogames, indissociáveis
É impossível abordar este assunto sem mencionar o Metacritic. É um agregador de críticas, ou seja, compila várias análises de diferentes sites e revistas, com uma média de pontuação conhecida como Metascore.
Apesar de abrigar avaliações de outras mídias de entretenimento, é conhecido principalmente pela indústria dos videogames, sendo seu maior e mais importante agregador. É o equivalente ao Rotten Tomatoes ou IMDb, famosos entre os fãs de cinema e TV.
O Metascore, que vai de 0 a 100, é calculado através de uma média aritmética ponderada, onde algumas avaliações têm mais peso de acordo com a fama, tamanho e quantidade de reviews publicadas pelo crítico ou portal.
A importância e a influência das análises para o mercado, assim como o próprio Metacritic, são indiscutíveis. De acordo com Nick Wingfield, do The Wall Street Journal, o agregador influencia nas vendas dos jogos e até mesmo na cotação das ações de suas publicadoras.
Segundo ele, isso se dá ao alto custo de um jogo de videogame, comparado a um álbum musical ou ingressos de cinema. Marc Doyle, criador do Metacritic, ainda aponta que os fãs de videogame costumam ser mais informados e engajados do que consumidores de outras mídias.
E além do valor dado por milhões de jogadores, também servem de referência e propaganda a muitas publicadoras e estúdios. Vários títulos exibem as notas que o jogo recebeu em seus trailers, materiais de divulgação e até mesmo na capa do game, como foi o caso da edição jogo do ano de Batman: Arkham City.
São até mesmo um parâmetro para contratações. Em ofertas de emprego, a Ghost Story Games, estúdio de ex-desenvolvedores de BioShock, lista como uma de suas exigências ter trabalhado em, pelo menos, um título bem avaliado, com média superior a 85, ou que os veteranos da equipe tenham gostado muito.
Em 2008, a Microsoft utilizou médias no Metacritic como parâmetro para determinar quais jogos seriam removidos do Xbox Live Arcade. Títulos com notas abaixo de 65 e com 6% ou menos de taxa de conversão da demo, ou seja, poucos jogadores que compraram após jogar a versão de avaliação, foram retirados da loja.
Vale até mencionar o vídeo recente de Cory Barlog, diretor de God of War, reagindo as avaliações de seu game. Ao se deparar com a média de 94 pontos, o desenvolvedor caiu em lágrimas. Para ele, é um valioso reconhecimento dos 5 anos de trabalho duro dedicados ao jogo.
Porém, há controvérsias
Agregadores de notas geralmente são confiáveis no que se propõe. Por se tratar de uma média que envolve dezenas de fontes, costumam dar uma boa ideia da opinião da crítica. Opiniões isoladas ou muito destoantes da maioria não costumam pesar, nem pra menos ou pra mais.
Em teoria, trata-se de uma ideia pró-consumidor, servindo de alternativa para informar e auxiliar jogadores quanto a qualidade dos produtos que pretendem adquirir. Entretanto, o Metacritic e a própria prática das notas e médias, como um todo, são alvo de algumas críticas e controvérsias.
Existem vários relatos de análises mal-intencionadas, com a pretensão de “queimar” algum jogo ou atrair atenção ao portal devido a polêmica gerada. A análise de Uncharted 4: A Thief's End pelo site Washington Post foi bastante comentada em 2016: a nota 40 foi a única abaixo de 80 entre os mais de 100 sites cadastrados.
Fãs alegam que a análise foi injusta e até criaram uma petição para a sua retirada do Metacritic, que contou com quase 10 mil assinaturas. Entre elas, a de Troy Baker, ator responsável por Sam Drake e diversos outros papéis memoráveis como Joker (Batman: Arkham Origins) Booker DeWitt (BioShock: Infinite) e Joel (The Last of Us).
Outro caso recente é o da análise de Forza Horizon 3 pelo International Business Times, do Reino Unido. Novamente, uma nota 40 que destoa de todas as outras, acompanhada de um texto que compara o jogo, de maneira incoerente, a simuladores. Trata-se de um jogo de corrida arcade, e que deveria ter sido julgado de acordo com a sua proposta.
O sistema de média ponderada existe justamente para prevenir que situações com estas impactem negativamente na média, e pelo menos nos exemplos mencionados, funcionou. Porém, o Metacritic é nem um pouco transparente quanto aos pesos que cada site possui, o que pode colocar em dúvida sua credibilidade.
Críticos e jogadores já reprovaram a forma com que o agregador converte algumas notas que não estão em seu formato, de 0 a 100. É o caso das avaliações com letras de “F” a “A”, popular nos Estados Unidos. A nota “A” é convertida para 100, enquanto que “F”, associado a zero. Isso já se provou injusto e bastante prejudicial em alguns casos, onde os próprios jornalistas discordaram do Metascore relativo ao seu review.
Ainda há a questão das avaliações de usuários: na teoria, algo interessante, mas, na prática, raramente funciona.
A ideia é que jogadores de todo o mundo também possam publicar suas opiniões no site. O problema é que isso, em vários casos, já foi utilizado para ferir a reputação de jogos, com centenas de notas zero e até mesmo spoilers no texto que as acompanha. É prejudicial aos estúdios e jogadores, e o Metacritic não é muito rígido quanto a fiscalização destas práticas, fazendo a famosa “vista grossa”.
Muitos ainda apontam que as notas de jogos estão, no geral, “infladas”, e isso acaba afetando a percepção dos jogadores. Fica evidente no sistema de cores e as diferenças para jogos e TV dentro do próprio Metacritic.
Basicamente, ele divide a média agregada em cinco níveis: aclamação universal, geralmente favoráveis, mistas, geralmente desfavoráveis e aversão esmagadora. As duas primeiras são identificadas pela cor verde, a do meio pelo amarelo e as últimas em vermelho.
Enquanto que um jogo necessita de uma média igual ou acima de 75 para se associado a cor verde, um filme precisa de apenas 61 pontos. O sistema é mais tolerante para filmes e séries porque notas altas aí são mais incomuns.
Os Vingadores, de 2012, é um filme bastante popular e, no geral, foi bem recebido. Sua média no Metacritic é 69. Um jogo com essa mesma nota é Mad Max, que nem de longe tem um status equivalente.
Tudo isso levanta alguns questionamentos. É nítido: um número é muito pouco para avaliar um jogo. Justamente por isso, notas estão sempre associadas a alguma análise em texto. O problema é que resumir tudo a apenas um número é bastante tentador (e comum).
Avaliações são úteis para “dar um chão”. Uma análise pode ser uma boa referência sobre o produto, principalmente se vem de algum produtor de conteúdo confiável, enquanto que notas as agregadas e médias expõe a recepção geral da crítica sobre um game. Porém, a experiência de jogo sempre foi e sempre será algo bastante complexo, subjetivo e pessoal.
Às vezes, aquele título que a maioria do público não gostou é uma das pérolas que marcou sua infância, ou que, apesar de todos os seus defeitos, possui qualidades que se destacam para você de maneira individual.
A experiência de jogo sempre foi e sempre será algo bastante complexo, subjetivo e pessoal
Sites como o Kotaku e Eurogamer, que publicavam análises no Metacritic, já não utilizam mais um sistema de notas. Ainda postam reviews, mas que não buscam avaliar com um número de 0 a 100 ou algo do tipo, e focam nos aspectos positivos do jogo, direcionando o texto a quem o produto é recomendado. Mudanças assim podem indicar que alguns sistemas já estão datados e precisam ser repensados. Porém, não é um cenário que mudará tão cedo.
O que você pensa sobre o assunto? Qual é a sua relação com as análises e notas e o seu pensamento sobre o impacto disso na indústria? Deixe sua opinião no campo de comentários.
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