Antigamente, trazer relíquias do passado para a superfície era o trabalho perfeito para arqueólogos como Indiana Jones, mas hoje em dia, parece que todos querem fazer isso com franquias que fizeram tanto sucesso décadas atrás. Às vezes isso dá muito certo e possibilita que novas gerações conheçam projetos que talvez nunca os interessassem antes.
No entanto, em algumas situações, isso também é algo que pode dar errado e manchar a trajetória de uma série vista como impecável previamente. No caso de Indiana Jones e o Grande Círculo, eu diria que essa escavação não só foi bem-sucedida, como ultrapassou por muito a qualidade que vimos em seus filmes mais recentes.
É claro que te conto tudo em mais detalhes na nossa análise logo a seguir! A review foi realizada com a versão de PC do game, com um código cedido pela Nvidia e a Bethesda.
De volta às clássicas escavações
A primeira sequência de Indiana Jones e o Grande Círculo já diz praticamente tudo o que você precisa saber sobre o jogo. É uma recriação muito fiel às cenas iniciais de Caçadores da Arca Perdida, mas que te coloca no controle de Indy e te ensina quase tudo o que precisará saber de mais importante quanto as mecânicas do game.
A sensação é de realmente fazer parte de um filme da franquia, não no sentido do título parecer um filme interativo. O jogo entrega uma aventura que se encaixa perfeitamente nos moldes e tom da franquia de Steven Spielberg e George Lucas, tanto no senso de humor e temas apresentados como a maneira que trama é contada e entregue ao jogador.
Esse sentimento se mantém do começo ao fim, mesmo que alguns tropeços te lembrem ocasionalmente que você ainda está lidando com um jogo que está propenso a sofrer dos mesmos vícios de outros títulos de mundo aberto. Acredito que muitos outros fãs de Indiana Jones vão concordar que o jogo é extremamente coerente com a trilogia original e poderia facilmente ter sido mais um capítulo na saga de filmes do professor Jones, além de ser bem melhor que a sua última aventura nos cinemas.
Sua trama se passa entre o primeiro e o terceiro filme, um período perfeito para ser preenchido com uma história leve e seguindo artefatos possivelmente capazes de liberar algum poder oculto na mão dos nazistas. Para descobrir exatamente qual o mistério em volta do Grande Círculo, Indy passa por diversas cidades históricas ao redor do mundo e faz aliados carismáticos, como o Padre Antônio e a jornalista Gina, que o segue por boa parte da jornada. Também há espaço para vilões canastrões, como é o caso do arqueólogo alemão Voss, um retrato perfeito do que se esperaria de um nazista nos filmes de Indiana Jones.
Nas cidades que mencionamos, o que mais impressiona é o nível de detalhe que se encontra a cada esquina, algo que instiga naturalmente a nossa exploração. Felizmente, essa exploração também é muito recompensada pelos inúmeros bilhetes, cartas, mistérios, puzzles, segredos e missões secundárias que podemos encontrar no caminho. Isso torna até difícil progredir na história quando tem que ir de uma cidade para outra, já que você fica na vontade de fazer tudo que é possível no local antes de seguir em frente.
Falando nisso, um ponto positivo de cada cidade ser um mapa contido, ou seja, funcionar como grandes hubs abertos, é que você pode passear à vontade e sem se preocupar com telas de carregamento, a menos que use o sistema de viagem rápida, é claro. Seus métodos de exploração também podem variar bastante e geralmente caem no pensamento de “o que o Indiana Jones faria aqui?”. Seja vestir uma batina para se passar de padre e entrar em locais restritos, se esgueirar por cantinhos estreitos, usar o chicote para escalar uma janela aberta, se pendurar na borda de um edifício para um inimigo não te ver ou até usar uma garrafa de vinho para derrubar um facista desatento. Tudo é feito de uma maneira mais improvisada e que combina perfeitamente com o tema de aventura e investigação em vez de ser puramente focado em ação, algo que eu aprecio demais.
Na questão dos puzzles, eu posso dizer que adorei praticamente todos os que encontrei, mesmo aqueles que pareciam meio clichês ou simples. O jogo, felizmente, não segura sua mão e nem fica te dando dicas em voz alta antes mesmo de você tentar algo, um crime do qual muitos jogos atuais são culpados. Caso precise, basta usar a máquina fotográfica do jogo para receber uma dica, uma solução bem eficiente e que não fica enchendo o saco do jogador.
Socando nazistas com gosto
É claro que também não podemos deixar de falar das mecânicas de combate de Indiana Jones e o Grande Círculo. Acredito que por mais que Uncharted tenha se inspirado bastante nos filmes do nosso arqueólogo favorito e, em contrapartida, tenha também servido de inspiração para alguns elementos de gameplay do Grande Círculo, fico feliz que o pessoal da MachineGames não tenha tomado o caminho mais fácil ao simplesmente fazer um clone da franquia da Naughty Dog. Dá para perceber logo de início que esse é um jogo com identidade própria e feito por pessoas que se preocupam em trazer as características mais marcantes da criação de Spielberg e Lucas.
Eu não necessariamente acho que os fãs de Indiana Jones esperavam que esse fosse um grande jogo de ação, até porque seria impensável ver o nosso protagonista se envolvendo em grandes explosões ou em tiroteios a cada 20 minutos. Ainda assim, acho que o game pode atingir um público que nunca nem se interessou pelos filmes, então vale dizer que você encontrará um gameplay que pende mais pelo lado stealth, combate corpo a corpo, resolução de puzzles e que te coloca mais para explorar e investigar do que em cenas de pura adrenalina.
Você até pode usar armas de fogo, mas a munição é mais escassa e é preferível guardá-las para lutas mais difíceis. Indy possui uma pistola consigo o tempo todo e outras variedades de armas aparecem com mais frequência a partir da cidade de Gizé, mas a verdade é que você passará a maior parte do tempo desferindo socos contra os inimigos ou usando armas improvisadas que encontrar pelo cenário, especialmente quando estiver andando de forma furtiva para não chamar a atenção. Também dá para usar o seu chicote para desarmar ou desnortear os fascistas, algo especialmente satisfatório.
Dito tudo isso, o ponto mais conflitante do jogo definitivamente é esse combate corpo a corpo, mas não de forma tão ruim quanto pode soar. Essencialmente, fica claro bem rápido que a trocação de socos de Indy contra seus inimigos passa uma sensação desajeitada, que é exatamente o que vemos em seus filmes. Seus embates nunca possuem um tom muito sério e não esperamos que o professor seja realmente muito habilidoso nessa área. Para mim, isso dá um charme extra ao game, mas quando se trata de gameplay, é algo que pode sim trazer frustração aos jogadores que não veem isso com os mesmos olhos.
A parte boa é que você pode jogar de forma mais séria e passar a dar mais atenção aos momentos que vale a pena bloquear, dar contragolpes ou deixar seu fôlego se recuperar. Também é possível utilizar os diversos livros de habilidades que encontramos no cenário para melhorar seu vigor, sua barra de vida e o dano causado nos combates corpo a corpo, mas mesmo com tudo isso, acho que essas lutas ficam claramente em segundo plano na visão geral do jogo.
Focando um pouco na questão da furtividade, vale avisar que há muitos momentos em que essa mecânica é utilizada, mas eu nunca senti que isso se tornou cansativo ou muito repetitivo, afinal, todo o ciclo de gameplay acaba sendo bem variado. É claro que isso pode ser bem diferente para pessoas que não suportam jogos com stealth. O lado bom é que o Grande Círculo implementou essa parte muito bem e os inimigos podem perceber barulhos mais sutis ou até corpos de aliados no chão, o que te faz ter esconder os fascistas em cantos escuros, algo que senti falta em jogos recentes como Star Wars: Outlaws, por exemplo.
Uma última aventura com belos gráficos e dublagem
Seguindo para a parte visual do game, não há do que reclamar, ele é realmente tão bonito quanto parece, mas mesmo seus requisitos mínimos exigem uma placa com suporte a Ray Tracing. E o motivo para isso é simples: Indiana Jones e o Grande Círculo traz uma das implementações mais completas do recurso atualmente.
Seguindo os passos de games como Black Myth Wukong, o novo jogo de Indy traz o "Ray Tracing completo", também conhecido como Path Tracing, cortesia de uma parceria da Nvidia e a Bethesda. O recurso permite utilizar sombras, reflexos e iluminação com alto nível de realismo, garantindo bastante profundidade para os ambientes do game — veja comparativo aqui.
O uso desses recursos "com tudo no máximo" exige um hardware potente. Felizmente, o game também conta com suporte para o DLSS 3.0 em placas de vídeo Nvidia RTX, trazendo também a função de Frame Generation. Usando o upscaling com inteligência artificial e a geração de frames, é possível aproveitar os recursos de Ray Tracing dando uma folguinha para a GPU.
AAAAAAAAAAA
Além dos visuais, o que me surpreendeu foi a performance e motion capture do game de todos os personagens. Um destaque especial fica para Troy Baker, que interpreta nosso Indiana Jones com tanta maestria que até me assustei com os trejeitos e expressões faciais idênticas às de Harrison Ford.
Por querer aproveitar a localização e dublagem em português, não pude desfrutar da dublagem de Baker e companhia por muito tempo, até porque infelizmente o jogo não permite colocar o áudio e os textos em idiomas diferentes, mas deu para constatar rapidamente que tanto as vozes em inglês como as em português estão impressionantes. O mesmo vale para o design de som e a trilha sonora que torna essa aventura ainda mais especial e sem ficar abusando do tema principal de Indy a todo momento.
Já um aspecto que dividiu muitas pessoas desde começo foi o fato do game ser em primeira pessoa. Isso nunca me incomodou e até fez mais sentido quando eu comecei a jogar, já que a perspectiva em primeira pessoa torna a exploração, o combate, a resolução de puzzles e o deslumbre das cidades e monumentos famosos em algo muito mais envolvente e impactante. É claro que isso pode ser mais questão de gosto e trazer o efeito contrário para muita gente, mas é uma daquelas coisas que você só vai saber ao jogar por si próprio.
Algo que poderia melhorar futuramente é a interface dos menus, que embora não sejam complicadas, também não são tão intuitivas logo de cara. Muitas coisas consistem de listas e quando você arruma muitos mistérios e quests para resolver, esses itens só vão se empilhando nessas listas e ficando mais chatinhos de encontrar. Não é exatamente algo que arruine a experiência, apenas uma inconveniência que poderia ser alterada com algum update.
Vale a pena?
Com poucos empecilhos na sua jornada, dá facilmente para dizer que Indiana Jones e o Grande Círculo é um dos melhores jogos de 2024, mesmo que tenha sido lançado tarde demais para participar dos principais prêmios do ano.
Esse novo capítulo na saga de Indy está repleta de mistérios, locais lindos de se visitar e de se explorar, personagens carismáticos, vilões memoráveis e aquele humor digno dos filmes dos anos 1980. Se essa for enfim a última grande aventura de Indiana Jones, posso dizer que o chapéu e o chicote terão se aposentado com maestria!
Nota do Voxel: 95
Pontos positivos:
- Gameplay divertido e que faz sentido para a franquia
- Trama simples, mas envolvente
- O jogo te faz sentir parte de uma aventura de Indiana Jones
- Excelente performances do elenco original e em português
Pontos negativos:
- Interface não tão intuitiva
- O combate pode ser frustrante em certos momentos
Indiana Jones e o Grande Círculo já está disponível no PC e Xbox, fazendo parte do catálogo do Game Pass. O título também será lançado para PS5 em 2025.
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