Granblue Fantasy é uma franquia que ensaia há tempos uma forma de atrair novos públicos. Isso é verdade não apenas com suas adaptações para mangá e anime, mas também com spin-offs no mundo dos videogames. A sua empreitada mais recente, Granblue Fantasy: Versus, provou a competência da Cygames em reimaginar seus personagens e sistemas em um gênero completamente diferente, mas ainda assim acabou se limitando ao nicho dos jogos de luta. Agora, a ideia é dar um passo adiante com o tão aguardado Granblue Fantasy: Relink, que embarca na fórmula de um RPG de ação — algo que muitos fãs de longa data desejavam.
Previsto para 1º de fevereiro com versões para PC (Steam), PlayStation 4 e PlayStation 5, Granblue Fantasy: Relink é acima de tudo uma experiência single-player e linear com uma campanha competente, embora enxuta para os padrões do gênero. Ele também não deixa de lado a possibilidade de embarcar em missões multiplayer com mais três jogadores, enfrentando chefes ou hordas de inimigos para ganhar experiência e materiais em uma premissa que remete a Monster Hunter, da Capcom.
O jogo foi apresentado pela primeira vez em 2016, época em que estaria a cargo da PlatinumGames, conhecida por Bayonetta e NieR: Automata. No entanto, ele sofreu uma sucessão de adiamentos e, após o término do contrato, a própria Cygames assumiu o desenvolvimento internamente. A situação, naturalmente, preocupou muitos entusiastas, mas o resultado é um RPG competente e divertido que serve de porta de entrada para principiantes na série, mas com muitos elementos familiares aos jogadores do gacha para celulares. Será que o resultado é satisfatório? Você descobre os detalhes a seguir, no review completo do Voxel. Confira:
O céu é o limite
Como não podia deixar de ser, Granblue Fantasy: Relink traz a premissa básica do universo da série, que se chama Mundo dos Céus e é composto por incontáveis ilhas flutuantes, com suas respectivas naturezas e proporções. O grupo principal é conhecido como Aeroviajantes, utilizando-se de um barco voador em uma jornada até a lendária ilha de Estalúcia, onde o pai do(a) protagonista estaria à sua espera segundo uma carta. No novo jogo, visitamos o inédito espaço celeste de Zegagrande, que é apenas uma parada no amplo escopo da aventura.
Assim que os Aeroviajantes entram na nova região, várias anormalidades começam a surgir e não tarda até descobrirem a ameaça da Igreja de Ávia, uma perigosa organização que está fazendo uso do poder de Bestas Primordiais, que se tornam descontroladas e provocam cataclismas que ameaçam a população. As suas intenções malignas acabam mirando Lyria, uma inseparável e bondosa aliada do grupo que tem poderes misteriosos — incluindo o de se comunicar com essas criaturas.
A campanha de Granblue Fantasy: Relink traz uma história original, com textos localizados em PT-BRFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
A estrutura do jogo é bastante simples. Tudo começa nas cidades, que atuam como lobbies onde é possível interagir com NPCs — incluindo um ferreiro, uma mercadora e uma balconista para aceitar missões. Durante a campanha, o jogador é guiado por áreas exploráveis onde é possível enfrentar inimigos e descobrir tesouros. Os cenários são bastante simples, mas guardam muitos segredos. É fácil de deixar algo para trás, pois o jogo não traz um mapa para checar cada cantinho com calma. Por isso, a exploração se torna um pouco caótica e desnorteante.
E por fim, há lutas contra chefes que são verdadeiros espetáculos, pois são bastante variadas e desafiadoras. Elas buscam inspiração em mecânicas do Granblue Fantasy original, incluindo Overdrive e Break. Por isso, há padrões de ataque que cobrem a arena inteira e obrigam o jogador a se movimentar bastante. É preciso aproveitar as brechas para derrubar o adversário e otimizar o dano.
A campanha está com os textos localizados em português do Brasil e pode ser concluída com cerca de 15 horas de gameplay. Pode parecer curta, mas, depois disso, o jogador destrava missões de dificuldade mais alta que exigem personagens bem equipados e até mesmo uma forcinha no modo multiplayer. Uma vez que forem concluídas, novos acontecimentos se desdobram e o jogador caminha para o final verdadeiro. Na minha experiência, levei aproximadamente 27 horas no total.
Os jogadores podem se perguntar se é preciso conhecer a história original para aproveitar Granblue Fantasy: Relink. Felizmente, o jogo é muito competente ao apresentar um breve contexto de como tudo começou, enquanto os diálogos trazem um glossário em tempo real para dar mais informações. Ainda assim, ele não perde muito tempo introduzindo seus personagens nas cenas principais. Em outras palavras, qualquer conhecimento prévio é bem-vindo.
Os novos personagens criados para Granblue Fantasy: Relink são um grande destaqueFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Existe a opção de conferir as origens dos tripulantes de forma rápida e opcional nos chamados Episódios de Destino, que recompensam com um acréscimo de atributos. Isso é algo que também existe no Granblue Fantasy original, apresentando breves cenas que se aprofundam na história dos personagens e em como eles entraram na tripulação.
É interessante notar que, com o passar dos capítulos, os Episódios de Destino também mostram a percepção dos personagens sobre os acontecimentos desta trama original, assim como suas resoluções. Isso também vale para aqueles que são recrutados só mais tarde. É uma decisão certeira e que funciona muito bem, já que beneficia aqueles que quiserem aprender mais sobre seus personagens favoritos.
A campanha traz um enredo bastante simples e comum aos animes, com grande ênfase nos laços de amizade e no senso de justiça. Apesar disso, ela é feliz ao introduzir personagens carismáticos e instigar a curiosidade, em especial com relação ao grupo antagonista que é composto por personagens inéditos na franquia. Os seus acontecimentos também são bastante cinematográficos e dramáticos, incluindo momentos que não ficam atrás de sucessos como Final Fantasy XVI.
O único problema é que os personagens conversam bastante durante a ação, e isso inclui diálogos importantes para o enredo. Por se tratar de um jogo frenético, é muito difícil tomar nota de tudo que está sendo dito no meio do combate — independente se você presta atenção nas legendas ou no áudio original. O resultado disso é muita poluição sonora, então eu apreciaria muito se os personagens esperassem a luta terminar para situar o jogador com mais tranquilidade.
Fácil de aprender e satisfatório de dominar
Granblue Fantasy: Relink traz um elenco com dezoito bonecos selecionáveis, mas poucos ficam disponíveis desde o início. A maior parte deve ser recrutada com o uso de Cartões de Tripulação, que são obtidos conforme o avanço na campanha ou nas missões. É interessante como os personagens têm bastante profundidade de gameplay e camadas de aprendizado, com uma lista de combos dedicada.
Claro, é possível jogar de maneira descompromissada, apertando quadrado repetidas vezes, mas há casos em que pressionar um botão no momento correto permite estender combos e causar ainda mais dano. Os personagens também têm acesso a ações únicas que costumam ser atreladas ao botão triângulo. A Narmaya, por exemplo, é capaz de mudar a sua postura de combate a qualquer momento para acessar um novo arsenal de golpes. É um sistema que beneficia quem aprende as nuances da jogabilidade.
Os jogadores têm liberdade para personalizar as habilidades e equipamentos dos personagensFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Conforme subimos de nível, é possível gastar pontos de maestria para liberar novas técnicas e melhorar atributos. Há uma árvore de habilidades que permite atribuir pontos à vontade, então o jogador consegue montar uma build de acordo com suas preferências. Também é possível forjar diferentes tipos de armas e equipar selos que concedem benefícios aos personagens, incluindo redução no tempo de recarga de habilidades, bônus de vida, aumento de ataque ou dano crítico, atordoamento e muito mais.
Parece complicado de entender a princípio, mas a interface é muito intuitiva e desperta a curiosidade para experimentar todos os outros personagens. Todos são bastante divertidos de controlar, e no multiplayer é ainda mais gratificante montar composições que aproveitem suas proficiências. Isso significa que o endgame envolve desafiar as missões de maior dificuldade para angariar materiais, fabricar armas cada vez melhores e evoluir as maestrias dos personagens.
As missões são separadas por dificuldade e estilo, garantindo diferentes recompensasFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
É por isso que é possível traçar paralelos com Monster Hunter, pois o balcão de missões traz as tarefas designadas, com suas respectivas dificuldades e as recompensas possíveis pela conclusão. Para deixar tudo mais conveniente, também é possível marcar os materiais que você precisa para forjar armas ou melhorar selos em uma lista de desejos. Com isso, o jogo é capaz de filtrar apenas as missões que têm chances de entregar o que você precisa. É realmente muito útil e ajuda a não deixar a tarefa maçante.
Por sua vez, o combate é bastante envolvente e variado, e ao mesmo tempo se beneficia das lutas contra chefes que estão entre as melhores que os jogos do gênero já entregaram, lembrando até mesmo raides de MMOs. Há alguns chefes menores que se repetem, trocando apenas seus elementos predominantes, mas ainda assim apresentam padrões de ataque únicos. É um nível de esmero que extrapola tudo o que já vimos em outros jogos com temática de anime.
A longo prazo, é possível que algumas missões fiquem repetitivas, mas a estrutura do jogo tem muita margem para atualizações. A Cygames já revelou suas intenções de lançar novos conteúdos, incluindo uma batalha contra Lúcifer, que também será jogável em Granblue Fantasy Versus: Rising, já a partir de março deste ano. A versão de lançamento já permite investir bastante tempo e diversão, então a ideia de receber missões inéditas continuamente e, quem sabe, novas histórias é bastante animadora.
Direção artística que condiz com a essência da série
Os visuais de Granblue Fantasy: Relink são artisticamente muito bonitos, remetendo aos traços das ilustrações originais de Hideo Minaba. Alguns modelos podiam passar por um polimento se observarmos atentamente, mas não é nada que atrapalhe a experiência. Tudo é muito agradável visualmente e consegue transmitir a essência do título original, mas agora com proporções muito maiores.
Os efeitos visuais também são muito caprichados. Para quem observa de longe, o jogo parece difícil de entender pela sua aparente poluição visual, mas tudo funciona muito bem quando é você quem está com o controle em mãos. Vale notar que os testes ocorreram no PlayStation 5 com o Modo Performance habilitado, para garantir que a ação acontecesse a 60 quadros por segundo. Não há o que reclamar nesse sentido: o jogo manteve um desempenho agradável a maior parte do tempo.
Granblue Fantasy: Relink traduz a fórmula original com maestria para alcançar novos públicosFonte: Reprodução/Bruno Magalhães
Isso também vale para as partidas online. Eu pude realizar alguns testes e, em termos de netcode, não notei atrasos nos comandos ou lags. No entanto, era comum que as salas sofressem travamentos e quedas repentinas na hora de iniciar missões, obrigando que os grupos fossem desfeitos. Isso causou estranhamento, considerando que os servidores estavam vazios no período de review.
Também é uma pena que o jogo não tenha suporte a crossplay entre PlayStation e PC, pois o ideal seria unificar a sua base de jogadores. No Brasil, por exemplo, é natural que a maior parte da comunidade marque presença no PC, já que a Nuuvem está publicando o jogo na América Latina por um preço muito mais acessível na plataforma — R$ 179,90 nos computadores e nos consoles, R$ 250,99.
Vale a pena?
Granblue Fantasy: Relink traz um universo encantador e não poupa esforços para entregar momentos marcantes ao longo da sua campanha, com destaque para as batalhas contra chefes que estão entre as mais impressionantes e divertidas da atualidade. O jogo representa um novo marco na franquia da Cygames, trazendo à luz como seria esse universo e seus personagens em um título de alto orçamento.
E é claro que apenas apostar em um escopo elevado não bastaria. O jogo demonstra uma direção certeira, apresentando mecânicas coesas e envolventes, além de um loop de gameplay que incentiva a experimentação. É possível curtir o seu conteúdo sozinho, como um jogo single-player, mas a possibilidade de se juntar a amigos no modo multiplayer traduz o aspecto social do título original com maestria para o gênero de RPG de ação, garantindo bastante sobrevida com os conteúdos de endgame.
Seus sistemas de combate não são tão complexos quanto os de um hack’n slash, mas trazem variedade e profundidade o suficiente para recompensar aqueles que dominarem seus respectivos personagens. Além disso, é muito satisfatório observar seus danos e atributos subirem. O resultado disso é um jogo em que não percebemos o tempo passar, e não há elogio mais apropriado do que este.
Os seus visuais podem parecer tecnicamente datados hoje em dia, mas a direção artística consegue compensar com belíssimos traços que remetem às artes originais, que são um dos maiores pontos positivos da franquia. A trilha sonora também cumpre um ótimo papel ao reimaginar temas clássicos com novos arranjos, deixando os confrontos muito mais memoráveis.
Com pequenos deslizes, Granblue Fantasy: Relink é praticamente um jogo perfeito dentro da sua proposta e faz valer os seus quase oito longos anos de espera. O título é um exemplo claro de como franquias mobile, com mundos suficientemente engajantes, podem ser bem-sucedidas em gêneros mais apelativos para o público geral.
Nota do Voxel: 95
Pontos positivos (prós):
- Campanha divertida e cheia de surpresas;
- Batalhas incríveis contra chefes;
- Variedade de personagens;
- Gameplay fácil de aprender, sem abrir mão da profundidade;
- Evoluir os personagens é uma tarefa satisfatória;
- Visuais e trilha sonora.
Pontos negativos (contras):
- Sem cross-play entre PC e consoles;
- Diálogos importantes no meio dos combates;
- Ausência de mapa para exploração;
- Erros de conexão ao aceitar missões no multiplayer.
Granblue Fantasy: Relink foi testado no PS5 com uma cópia cedida pela Nuuvem, que é a distribuidora do game no brasil em parceria com a Cygames. O jogo também conta com versões para PC e PS4.