Se Persona 3 fosse qualquer outro jogo, eu poderia começar esse review dizendo que Persona 3 Reload é um remake do game original de PlayStation 2 e que tem como objetivo modernizar o título que trouxe, pela primeira vez, diversas das mecânicas que transformaram a franquia no sucesso que conhecemos. Só que Persona 3 nunca foi tão simples e direto como suas sequências e Reload é nada menos do que a sua quarta versão lançada até hoje.
Por isso, a dúvida não é apenas se esse é um bom remake, se é uma boa oportunidade para quem nunca jogou ou se fãs antigos ficarão satisfeitos. A grande questão é se essa é, enfim, a tão aguardada edição definitiva de Persona 3. É claro que a resposta, você encontra nessa análise.
As diversas faces de Persona 3
Não há dúvidas de que Persona 3 é o marco divisor de águas da franquia que se originou de Shin Megami Tensei, já que foi ele que trouxe a fórmula de balancear as divertidas atividades sociais e estudantis de um adolescente com as intensas lutas contra sombras poderosas usando nossas Personas. Praticamente tudo o que amamos de Persona 4 e Persona 5 se originou de algum jeito em Persona 3, mas o jogo em si é meio fragmentado em três versões, algo que sempre confundiu fãs e possíveis interessados na série.
Seria Persona 3 Reload a versão que estamos esperando há tanto tempo?Fonte: Atlus/Reprodução
Até hoje, contávamos com Persona 3, Persona 3 FES e Persona 3 Portable, todos lançados entre 2006 e 2009 no PlayStation 2 ou PSP, no caso da edição portátil. Enquanto Persona 3 FES trazia algumas mudanças no conteúdo e um epílogo inédito de 30 horas para o game, a versão portátil funcionava mais como Visual Novel na maior parte do tempo, mas trazia a possibilidade de jogar com uma protagonista feminina (algo que mudava bastante certos acontecimentos ou possibilidades no game) e a chance de controlar todos os membros do seu grupo durante combates, um fator que não estava presente nas duas primeiras edições do game. Infelizmente, Persona 3 Portable não tinha as cenas animadas e nem o epílogo de Persona 3 FES.
Dessa forma, para experimentar tudo o que Persona 3 tinha a oferecer, você tinha que, no mínimo, jogar o game em duas versões diferentes. Felizmente, a Atlus aprendeu a lição e fez as versões especiais de suas sequências, no caso Persona 4 Golden e Persona 5 Royal, serem as edições definitivas. Como a gente comentou antes, a esperança era o mesmo se repetir com Persona 3 Reload, mas esse não é exatamente o caso. Pelo menos não ainda.
Para ficar claro desde o começo: Persona 3 Reload é um remake focado quase que totalmente na versão original do jogo, aquela lançada em 2006 no PS2. Ele ainda possui algumas das mudanças de FES e Portable, mas isso se resume a coisas como interações extras, troca de roupas nas dungeons e a possibilidade de controlar seus aliados em batalha, por exemplo. Infelizmente, o epílogo e a protagonista feminina não são parte desse remake.
É incrível rever os antigos personagens com os gráficos renovadosFonte: Atlus/Reprodução
De certa forma, eu acredito que há uma chance da Atlus lançar esse conteúdo em forma de DLC futuramente, mas é algo realmente incerto. É claro que não disponibilizar o que está faltando seria uma oportunidade perdida, especialmente porque ainda faria as pessoas terem que jogar outras duas edições do game para aproveitar tudo que ele tem. Essa perspectiva desanima um pouco, mas como o conteúdo é mais uma expansão à parte e não algo necessário ao game, esse não é o único fator que temos que levar em consideração quando se trata de Reload.
De roupa nova
Deixando a questão de diferentes versões de lado, o primeiro fator que chama a atenção em Persona 3 Reload é o visual, que se assemelha bastante à Persona 5, embora os gráficos estejam mais bonitos aqui, como era de se esperar. Isso é algo bem caprichado no game todo, seja nos cenários que exploramos na vida normal ou no Tártaro, a grande dungeon que desbravamos no game. Se você jogou o game anteriormente, tudo ainda será familiar, mas muito mais detalhado e distinto.
Dá para dizer que por não ter mais as limitações do PS2 e PSP, o game perdeu um pouquinho daquela atmosfera mais dark, mas eu acho que ele está com um estilo que combina muito mais com a identidade atual de Persona . Vale falar que joguei a versão de PC e o game rodou muito bem, tendo um leve engasgo em duas áreas específicas que não eram tão diferentes do resto do jogo, então imagino que seja apenas um probleminha específico que poderia ser resolvido em um update.
Ah, e se você estranhou que chamei a dungeon de Tártaro em vez de Tartarus, é porque o segundo fator que chama a atenção é que o game está totalmente traduzido em português brasileiro. É claro que nem preciso comentar o quanto isso é importante para um game tão dependente de texto, então fico feliz que ele tenha se tornado mais acessível em nosso país. O áudio em si está disponível em inglês ou japonês e, como esperado, a dublagem é incrível nessas duas versões.
O game está totalmente traduzido em português brasileiro.
A maioria dos dubladores é diferente do game original, mas você ainda terá algumas vozes familiares, especialmente em certas músicas, que foram todas regravadas e rearranjadas. Já que mencionei as músicas, faço questão de dizer que a trilha sonora está tão boa quanto é de se esperar de um game da franquia, seja com as canções antigas ou com as inéditas que foram feitas especialmente para o remake. São todas faixas que continuam divertidas mesmo depois de dezenas de horas de jogo, então não se preocupe, você não enjoa delas tão facilmente.
Pequenas mudanças fazem a diferença
A trama permanece igual ao que já conhecemos, ou seja, você controla um adolescente que tem o poder de invocar diversas Personas e que se junta a grupo de estudantes com habilidades similares para derrotar as sombras que habitam uma torre conhecida como Tártaro. A tal torre só aparece durante a “Hora Sombria”, um período em que só os usuários de Persona conseguem permanecer conscientes. Enquanto não está lutando por lá, é necessário viver a sua vida normal de adolescente, tendo que ir à escola, fazer amigos, desenvolver suas habilidades sociais, arranjar trabalhos de meio-período e muito mais
Eu já achava o elenco de Persona 3 bem divertido, apesar de muitos personagens serem bem clichês, mas tenho a impressão de que a interação com eles ficou ainda melhor em Reload. O game traz as cenas extras de Persona 3 FES e ainda adiciona um conteúdo inédito para desenvolver mais os laços entre o protagonista e seus colegas, o ajuda a ter mais simpatia por cada um e fazer o grupo parecer mais integrado do que antigamente. Também há um pouco mais sobre o grupo antagonista, mas não vou falar muito sobre essa parte para evitar qualquer spoiler.
Os combates ficaram mais parecidos com Persona 5 e ganharam elementos inéditosFonte: Atlus/Reprodução
Outra mudança positiva é que todos os outros personagens que servem de vínculos sociais foram dublados em Reload, já que antes eles tinham apenas falas em texto. Considerando que esses NPCs são os melhores amigos ou interesses românticos do nosso protagonista, era realmente meio chato quando eles não tinham voz própria, mas dava para entender pelas limitações da época. Agora é possível maximizar um vínculo social com as mulheres do game sem que seja necessário iniciar um namoro com elas. Além disso, o game é bem claro quanto a esses relacionamentos e, agora, te permite aceitar ou rejeitar os avanços amorosos delas em vez de te jogar em um namoro ao chegar ao nível máximo do vínculo.
Algo interessante é que certas cenas de anime foram trocadas por cenas feitas com a engine do game ou simplesmente se tornaram segmentos jogáveis. Algumas ainda permanecem e foram redesenhadas no estilo atual do game, enquanto também há cenas de anime inéditas em pontos de transição que não interrompem o gameplay. Imagino que alguns fãs veteranos possam reclamar que nem todas as partes animadas foram refeitas, mas eu achei que foi uma boa mudança.
Tempo para tudo
Na parte da sua vida normal de adolescente, além de criar e cultivar vínculos sociais, você também continua tendo os mesmos eventos especiais, atividades para aprimorar as habilidades de Coragem, Intelecto e Charme, missões secundárias e, é claro, suas obrigações estudantis. O game te coloca para viver cada dia de um ano inteiro, podendo realizar tarefas diferentes dependendo do dia da semana e horário. O calendário do jogo não mudou, então quem já jogou Persona 3 vai se sentir familiarizado com os dias em que certos momentos especiais ocorrem, incluindo quando um personagem novo aparece ou quando suas provas da escola acontecem.
A localização do game em nosso idioma está sensacional!Fonte: Atlus/Reprodução
O que mudou foram as pequenas coisas, como as perguntas feitas pelos professores durante as aulas e a disponibilidade de algumas pessoas em certos dias dependendo do seu vínculo com elas. Como é de costume em jogos mais novos da franquia, você ainda tem um botão dedicado a ver o que outros jogadores responderam nas aulas ou fizeram naquele dia específico, o que pode te ajudar se estiver se sentindo perdido com tantas possibilidades.
Felizmente, o game te dá tempo suficiente para maximizar todas as suas habilidades e para ter o vínculo mais forte com cada um dos personagens. Por isso, pode explorar bem suas opções e passar o tempo como preferir, só lembrando de sempre escolher algo que te dê algum progresso em algo todo dia. Se quiser uma boa dica, basta sempre escolher passar o tempo com alguém durante a tarde e realizar atividades como karaokê, estudo, trabalho de meio-período ou visita a restaurantes durante à noite.
O longo e sinuoso Tártaro
É claro que no meio de uma vida social tão ocupada, você pode estar se perguntando sobre as visitas ao Tártaro. Se você só jogou Persona 4 ou Persona 5, fica o aviso de que em Persona 3, nós só temos essa dungeon, que é uma torre dividida em diversos blocos. Você precisa desbravar cada andar dela, lutar contra as sombras que vagam por lá e ainda lidar com um ou mais mini-bosses em certos momentos. No total, são 264 andares, mas o jogo limita até onde é possível subir a cada lua cheia, quando você precisa derrotar um chefe mais poderoso em outro lugar da cidade. Desta forma, não é possível explorar todo o Tártaro de uma vez, então também não é necessário ter tanta pressa. Felizmente, a cada tantos andares, existe um tipo de elevador que te permite circular de forma mais à vontade entre as diferentes partes da torre.
Dá tranquilamente para chegar ao limite de cada mês com apenas uma ou duas visitas ao Tártaro, especialmente conforme você for ficando mais forte e ao ter acumulado mais itens de regeneração. Cada bloco tem um visual diferente e conta com inimigos mais poderosos ou com mecânicas novas em relação ao que vimos anteriormente. É isso que permite que essa subida não se torne completamente entediante.
Ainda assim, preciso dizer que o Tártaro é a parte que acho menos divertida de Persona 3 Reload. Não porque é ruim, mas porque é onde mais dá para notar que se trata de um jogo de 2006. Isso vale muito mais para quem já jogou suas sequências e se acostumou com o esquema de dungeons mais variadas. Para tentar lidar com isso, a Atlus deixou o combate mais parecido com Persona 5, incluindo a chance de passar o turno para outro aliado quando se atinge a fraqueza de um inimigo.
Persona 3 Reload ainda possui alguns dos temas mais pesados da sérieFonte: Atlus/Reprodução
Além disso, temos a novidade da Teurgia, que é uma habilidade única e muito poderosa de cada personagem. Ela pode ser usada após uma barra especial ser preenchida aos poucos com ações específicas de cada aliado em batalha, tudo de acordo com suas personalidades. Não são golpes que garantem a vitória, mas que podem ajudar muito em momentos cruciais.
Eu não vou mentir dizendo que todas as batalhas são desafiadoras, já que depois que você conhece as fraquezas de cada sombra em dos blocos no Tártaro, fica bem mais fácil de lidar com eles. Ainda assim, as lutas com mini chefes e com os chefes mais poderosos podem ser muito divertidas e requerem bem mais estratégias, já que muitos deles não possuem fraquezas ou possuem condições especiais para serem derrotados.
Assim como antes, seus aliados só possuem uma Persona, mas você pode ter quantas quiser. Você pode consegui-las após batalhas ou ao fundir Personas que já possui no Quarto de Veludo. As Personas que você adquire após as batalhas aparecem no momento conhecido como “Hora das Cartas”, quando é possível escolher entre Personas, mais pontos de experiência, ataques especiais para ensinar a uma Persona ou dinheiro, por exemplo. Mais tarde, você poderá escolher cartas de Arcanas Maiores que te dão benefícios durante sua visita atual ao Tártaro, então é uma mecânica bem importante de se ficar de olho.
Ainda no Tártaro, você encontrará mais tesouros, sendo que alguns deles agora só podem ser abertos se você tiver um item chamado “Lasca do Crepúsculo”. Essas lascas também podem ser usadas mais tarde para restaurar a saúde e mana do seu grupo, permitindo visitas ainda mais longas ao Tártaro. Outra boa mecânica é que, após gastar lascas o suficiente, uma porta aparece perto da saída de um andar do Tártaro e te dá a chance de subir o nível de aliados mais fracos. Isso ajuda muito a não te forçar a ficar trocando de membros do grupo só para tentar deixá-los com níveis parecidos.
Já as “Portas da Mônada” e as pessoas desaparecidas dentro do Tártaro continuam presentes em Reload, o que também pode te incentivar a visitar o lugar com mais frequência ou, pelo menos, te forçar a ter um planejamento melhor de quando irá ao local. Honestamente, do meio para o final do jogo, eu passei a ir apenas dois dias antes da lua cheia e fazia absolutamente tudo o que era possível de uma vez. Nesse ponto, eu já estava um pouco cansada da torre e queria passar mais tempo cuidando dos vínculos e habilidades sociais, vendo a trama se desenrolar ou lutando contra inimigos realmente mais desafiadores. A parte boa é que o jogo te permite fazer isso sem qualquer problema, desde que cuide das pessoas desaparecidas antes do chefão de cada mês.
Vale a pena?
Dá para dizer que Persona 3 Reload é um remake extremamente fiel ao original, mas que soube muito bem onde adicionar coisas boas de FES e Portable, além dos fatores totalmente inéditos que vieram para modernizar o game e deixar seus personagens e sua trama ainda mais interessantes. Ainda é um ponto negativo que a protagonista feminina e o epílogo não estejam presentes, mas também não posso dizer que o game está incompleto sem esses elementos. Isso seria um ótimo bônus à parte ao game, mas não algo essencial na proposta trazer Persona 3 ao mundo atual.
Acho que alguns fãs mais antigos podem ter problemas com certas mudanças por causa da nostalgia, mas na minha opinião, ele melhorou tudo o que já era bom e até mesmo o que era meio ruinzinho. Com poucos tropeços na minha visão, Persona 3 Reload pode não ser a edição mais completa, mas é sim a versão definitiva do jogo que delineou o caminho de sucesso da franquia. Então, não importa se só jogou os games mais novos, se é fã de longa data ou se só teve um interesse distante na franquia até agora, porque esse é o momento de mergulhar na Hora Sombria e aproveitar o auge de Persona 3.
Nota do Voxel: 92
Pontos positivos (prós):
- Remake fiel, porém com adições e melhorias excelentes
- Personagens ficaram ainda mais cativantes
- Todo o texto localizado em português
- Música e dublagem de alta qualidade
- Batalhas contra mini chefes e chefões são muito divertidas
- Atividades e vínculos sociais são um ponto alto do game
Pontos negativos (contras):
- Não possui conteúdo extra de Persona FES e Portable
- O Tártaro pode ser bem entediante do meio para o fim do game
- Pequenos problemas de performance em áreas específicas
Persona 3 Reload foi testado na versão de PC (Windows) com uma cópia cedida pela Atlus. Além de chegar aos computadores, o jogo também contará com versões para PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series S e X. O título também chega diretamente na assinatura Game Pass, em 2 de fevereiro.
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