Um brasileiro de Florianópolis (SC) que customiza portáteis antigos como Game Boy Color, Game Boy Advance, Game Gear e outros tem “bombado” nas redes sociais. Em entrevista ao Voxel, Paulo Santos fala sobre como a curiosidade por eletrônicos virou profissão, como funciona a reforma de um vídeo game antigo e porque as pessoas estão cada vez mais nostálgicas.
Santos pode ser encontrado na internet pela alcunha de Retroy Boy! e até mesmo um grande streamer virou fã do trabalho com retrogaming.
“O Casimiro [Miguel, o Cazé] viu nosso perfil e entrou em contato comigo querendo comprar aparelhos. Era época de Copa (2022) e ele deu uma sumida por causa das transmissões, mas depois reapareceu e acabou comprando um Game Boy Color que eu customizei com iluminação RGB nos botões. Eu ainda mandei para ele mais um Game Boy Color customizado de verde e amarelho, que eu fiz para a Copa [foto abaixo]", conta.
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Para se ter uma ideia de como a Retro Boy! viralizou: a página do Instagram da marca saltou de pouco mais de 360 seguidores, em novembro de 2021, para mais de 111 mil seguidores em janeiro de 2024.
No TikTok os números também impressionam, já que são mais de 110 mil seguidores e vídeos que alcançam 4,5 milhões de visualizações.
Paixão por video games antigos
O “empurrãozinho” de Cazé fez com que Santos abrisse a empresa Retro Boy! para aceitar encomendas de reformas, manutenção e venda de portáteis "vintage". Atualmente, a marca tem escritório próprio e até funcionários, incluindo uma pessoa dedicada exclusivamente a cuidar das redes sociais.
E a formalização do negócio deu vida a uma antiga paixão do engenheiro civil de formação. Ele sempre gostou de videos games, principalmente os antigos, e em 2020 começou a personalizar seus aparelhos e publicar as fotos na internet.
Depois de estudar mais sobre o tema e participar de comunidades de mods, ele se aperfeiçoou e percebeu que poderia ganhar a vida com o retrogaming. Atualmente, Santos realiza de 30 a 40 trabalhos de reforma/manutenção por mês.
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“A maioria dos trabalhos são em Game Boy, já que ele é um portátil que está passando por uma febre no mundo inteiro e tem muita gente querendo reformar o console. E isso acontece porque existe uma oferta muito grande de peças para o aparelho”, explica.
Santos revela que o Game Boy Color é seu video game preferido e que 99% dos Game Boy que recebe estão em excelente estado. Atualmente, ele oferece mais de 150 opções de customização para os produtos da Nintendo.
- Veja também: Game Boy Color: do pior ao melhor, segundo a crítica
A facilidade de se trabalhar com o Game Boy é inversamente proporcional no caso de eletrônicos como o Game Gear. “Ele é uma desgraça para trabalhar. Ele é um projeto muito ruim, já que é um Master System feito às pressas para miniaturizar e concorrer com o Game Boy. 50% dos Game Gear que recebo chegam em péssimo estado”, analisa.
Quanto custa reformar um Game Boy?
O criador da Retroy Boy! afirma que cada projeto de reforma/manutenção possui suas especificidades. Os aparelhos que chegam em seu escritório passam por processos como revisão e higienização de placa, tudo para que fique mais claro quão complexo será o trabalho.
Falando sobre estimativas de preço, ele diz que manutenções que mantêm o aspecto original de um Game Boy Color ou Game Boy Advance custam de R$ 300 a R$ 350. Os valores incluem reparos como a troca da tela, por exemplo. No caso do Game Boy Pocket ou Game Boy Classic o valor chega a R$ 500. No caso de reformas, que alteram o aspecto original do eletrônico, os preços ficam a partir de R$ 600.
Santos afirma que o custo do reparo de aparelhos antigos aumentou em 2023 por causa da mudança de regras tarifárias que aconteceu após a entrada em vigor do programa Remessa Conforme.
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“Várias peças são importadas e nós temos fornecedores na China, Estados Unidos, Reino Unido e até Austrália. Então por conta da taxação recente, os valores ficaram um pouco maiores. E o preço também depende do que o cliente vai querer, se vai RGB, tecla mecânica, tela IPS etc. Quanto mais adições, mais caro fica o trabalho”, diz.
A Retro Boy! aceita encomendas do Brasil todo e faz todo o processo de envio e recebimento através dos Correios, sendo que o prazo que os clientes têm para receber o produto de volta gira em torno de 45 a 60 dias. O período pode chegar a dois meses justamente por fatores como a importação de peças e componentes.
"O tempo ainda leva em consideração a alta demanda que a gente tem recebido. Se eu pegar um aparelho para reformar e ele não precisa de manutenção, em duas ou três horas eu termino. Agora, em casos de manutenção elas vão de 40 minutos, quando não tem nenhum problema, até algumas horas quando é um aparelho que o cliente quer instalar uma tela IPS na carcaça original, por exemplo", acrescentou.
Por que a nostalgia está em alta?
A nostalgia tem sido um dos sentimentos mais explorados pela indústria cultural nas duas últimas décadas. Incontáveis filmes, séries e jogos estão ganhando reboots ou versões modernizadas (que em vários casos estão sendo muito bem-sucedidos comercialmente). O Brasil particularmente tem visto um movimento parecido na músico com o retorno de bandas, cantores e cantores que fizeram sucesso nos anos 80, 90 e 2000.
E o próprio retrogaming em si é um apelo à nostalgia, reconhece Paulo Santos. Ele lembra também de colecionadores de vinis, que também estão em alta ultimamente, e defende que coisas antigas se conectam melhor com algumas pessoas.
- Veja também: Entenda: por quê nostalgia vende tanto? – TecMundo
O Game Boy Advance foi lançado em 2001 e se tornou um dos portáteis mais icônicos da história (Imagem: Koichi Kamoshida/Getty Images)
“Não é dizer que os produtos novos não são bons, mas acho que tem muita coisa saindo ao mesmo tempo que perdeu um pouco a graça. Eu sempre penso na Marvel, que tem lançado tanta coisa que eu nem sinto mais vontade de ver. Eu acho que consumir coisas antigas nos dá uma referência de épocas mais simples, sabe?”.
O proprietário da Retro Boy! cita que o interesse por coisas retrô acaba se retroalimentando e virando uma comunidade que apesar de ser nichada, é muitas vezes numerosa. Ele revela que a maior parte de seus clientes são pessoas que já realizaram um trabalho anterior com ele.
E para manter estas pessoas unidas, além de grupos no WhatsApp e nas redes sociais, Santos produz até vídeos ensinando como jogadores podem por si próprio realizar alguns reparos nos consoles antigos.
- Veja também: 5 gambiarras para fazer funcionar jogos antigos
“Tem concorrente da minha empresa que não gosta que eu ensine de graça como consertar alguma coisa. Eu prefiro que a pessoa compre no meu link afiliado e eu ensine gratuitamente do que ela faça coisa errada. Eu entendo que disseminando meu conhecimento, vou aumentar a comunidade e ainda disseminar meu nome e trabalho”.
Projetos para futuro
Paulo Santos já projeta a nova fase da Retro Boy!. Ele conta que começará um trabalho maior com PSP e PS Vita a partir do próximo mês e com o Nintendo DS e Nintendo DS Lite até meados de abril deste ano.
“A partir dos anos 2000 para frente os eletrônicos foram ficando mais complicados de mexer por causa dos componentes muito pequenos. Mas estamos nos adaptando e, inclusive, já importamos bastante peças principalmente do PSP”, ressalta.
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Santos ainda revela que quer fazer oficialmente a formação em eletrônica, a partir de um curso técnico ou tecnólogo. Com os novos conhecimentos a ideia é produzir cartuchos, mods de tela e muito mais.
“Eu gostaria de fazer não apenas a manutenção dos consoles antigos, mas também produzir coisas novas e até desenvolver jogos. Neste sentido, já estamos iniciando uma parceria para que a Retro Boy! seja uma publisher de títulos de Game Boy. Além disso, temos como objetivo lançar um jogo próprio da Retro Boy!, que é meu sonho”, finaliza.
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