Desde 2009, a FromSoftware adquiriu um nível de prestígio diferente após o lançamento de Demon’s Souls, no PS3. De uma boa desenvolvedora de jogos, a companhia passou a ser reconhecida como um estúdio de altíssima qualidade, que finalmente culminou no grandioso reconhecimento de conquistar um Game of the Year com Sekiro, dez anos depois da primeira empreitada neste novo subgênero denominado "soulslike".
Elden Ring, o novo e um dos mais aguardados games da FromSoftware, pode ser o título que vai elevar a fórmula para outro patamar ao combinar elementos peculiares a um gênero que já foi de nicho: uma narrativa em parceria com George R. R. Martin, de Game of Thrones, uma aproximação maior ao multiplayer e a introdução de um mundo aberto à fórmula.
Depois de muitos segredos guardados a sete chaves e anos sem novidades, o jogo está cada vez mais perto e o Voxel teve uma oportunidade de ouro de testar por muitas horas o primeiro teste de rede fechado do título. Portanto, se ajeite na cadeira e confira o primeiro preview de Elden Ring.
Mundo aberto feito sob medida
Nas últimas duas décadas, dois termos se transformaram drasticamente: mundo aberto e elementos de RPG. No passado, franquias que usaram essas ferramentas se destacaram bastante e apresentaram uma nova "fornada" de games muito interessantes na era do PS3 e Xbox 360. Entretanto, como tudo que é em excesso, rapidamente o mercado se tornou saturado de experiências genéricas e batidas que copiaram muitas dessas fórmulas à exaustão.
Nem tudo precisa ser grandioso. Nem tudo requer modernização e escalas épicas. Apesar de Elden Ring ser um jogo aguardadíssimo, é compreensível a cautela de uma parcela dos fãs ao saber que a companhia adotaria elementos de mundo aberto a um gênero tão consolidado. Mas pode dormir de coração leve: à sua própria maneira, Elden Ring adapta e abraça novos conceitos com a sua roupagem original, criando algo único e tão promissor quanto tudo que já vimos.
Não se preocupe: o mapa maior do game não trará marcadores a torto e a direito, NPCs e quests infindáveis. Em outras palavras, Elden Ring não se tornou um Far Cry ou qualquer outro jogo de mundo aberto que já estamos familiarizados ou saturados. Pelo contrário, o título adota a rota mais moderna e recente, com áreas grandes que incorporam a exploração orgânica que a FromSoftware faz tão bem.
O mundo aberto serve como o parquinho de diversões para os fãs de soulslike, com muitos inimigos, segredos e dungeons que trazem o melhor que há. A intenção não é fazer a comparação clichê, mas Elden Ring certamente se aproxima mais de um estilo de Zelda: Breath of the Wild — ou simplesmente o mapa orientado à curiosidade do jogador. Saia da área inicial e se aventure onde a vista parecer mais apetitosa.
A build de teste esteve online por todo final de semana e passei mais de 15 horas jogando: em uma pequena área de Limgrave, demorou bastante para achar todos os segredinhos do mapa. Essa é a grande sacada do jogo, descobrir as cavernas e conteúdos escondidos no mundo aberto (e pode apostar que há um monte deles). Mesmo após mais de 10 horas e achando que vi tudo que havia para aproveitar, sempre tinha alguma coisa extra que requeria mais atenção aos detalhes.
Em suma, Elden Ring se provou muito melhor do que eu podia esperar no breve teste de rede. Se havia preocupações sobre a adição de espaço aberto entre as dungeons, elas desapareceram por completo. É um playground maior com tudo que mais amamos na fórmula, que apresenta um mundo conectado e recheado de atividades orgânicas para fazer, sem a necessidade de marcadores ou ponteiros na tela.
Até mesmo nesse aspecto o game tem seu próprio tempero. Há sim uma bússola e um botão para mapa, já que um mundo aberto sem eles poderia beirar a frustração, mas eles têm poucas informações para manter o sentimento de exploração e descobertas que só a FromSoftware sabe fazer.
O máximo que o jogador vai ver são indicadores de dungeons que achou, onde as suas runas, as “almas” de Elden Ring, ficaram caso tenha morrido, e ícones dos Locais de Graça, as fogueiras do título — que também mostram um filete de luz que indica a direção de onde está o próximo Local de Graça que segue adiante a história principal. E, caso esteja fora de combate, é possível usar a viagem rápida a qualquer momento para qualquer Local de Graça.
Até o mapa tem uma mecânica legal. Caso o jogador não ache um fragmento de mapa, toda a área será amarronzada quando apertar o botão de consulta, sendo impossível analisar a geografia de antemão. E, assim como Breath of the Wild, a graça é olhar o horizonte e colocar marcadores, que ficam visíveis como um facho de luz, e ver o que há por lá.
E sempre há alguma coisa recompensadora, pode apostar. Elden Ring foi citado pela Bandai como o jogo com maior liberdade da série e é exatamente isso que a jogatina demonstrou. Há diversas áreas com patrulhas inimigas escondendo recompensas excelentes ou cavernas com chefões opcionais que podem desbloquear até NPCs novos para adquirir itens e magias. Ou, até quem sabe, simplesmente andar pelo mapa vai fazer o jogador dar de cara com chefões que vagam por ali, como cavaleiros ou dragões.
Além disso, a jogatina conta com ciclos de dia e noite, efeitos de clima dinâmico e muito mais. De acordo com uma apresentação da Bandai, o horário do dia e condições podem influenciar o que o jogador encontra no mapa, mas pelo menos por enquanto, não reparei nenhuma mudança significativa.
Em resumo, é basicamente o Dark Souls que amamos com uma escala maior e mais recompensadora. No caso, recompensa é sinônimo de mais conteúdo orgânico. É tudo feito sob medida para a fórmula, incluindo algumas novidades e alterações para que toda experiência sirva a esse propósito, como a inclusão de Torrente, seu corcel espectral para se locomover no mapa e subir montanhas com áreas de acesso especiais, e dano de queda reduzido para não frustrar demais a exploração.
Ao todo, foram oito chefões opcionais, um chefão principal, quase uma dezena de dungeons e muitos segredos a encontrar. Inclusive, até mesmo nisso a equipe uniu o moderno ao clássico. Os locais mais fechados são chamados de “Áreas Legado”, onde o level design se assemelha mais aos terrenos que estamos acostumados na fórmula, mas ainda assim com mais opções de progressão do que jamais vimos na série. Um dos exemplos foi o Castelo de Tempesvéu, onde lutamos contra Godrick, um dos chefões da história principal. Tudo isso é extremamente recompensador, mas... e o gameplay? Vale?
Mais difícil? Mais fácil? Combate familiar refinado
Existe um experimento curioso em que, quando se cria uma escada que tem um único degrau de tamanho diferente, as pessoas acabam tropeçando frequentemente ao usá-la. Essa analogia pode ser esquisita, mas esse é o sentimento de jogar Elden Ring para um veterano de FromSoftware: tudo é muito familiar à franquia Dark Souls e há elementos de Sekiro também, mas algo no ritmo do combate faz com que a memória muscular atue do jeito errado.
Elden Ring é, simultaneamente, mais rápido e devagar que outros jogos souslike. Os inimigos demoram mais para desferir os ataques e há algo que destoa com o que já estamos acostumados. Requer tempo e experimentação para se acostumar, mas logo tudo flui naturalmente e há muito do DNA de outros games da empresa por aqui.
Por exemplo, existe a mecânica de contra-ataque: após uma defesa e apertar o botão de ataque forte, usa-se um golpe especial que pode causar um dano monstruoso. Há a possibilidade também de usar duas armas simultaneamente e, caso sejam da mesma categoria, habilita ataques únicos. Até os golpes parecem aprimorados, com maior conexão entre cada poder e uma sensação mais fluida de combos.
Apesar de haver uma amálgama de outros títulos, Elden Ring detém sua própria identidade. O combate a cavalo, as Cinzas de Guerra que mudam as habilidades de cada arma, os tipos de magia e até a abordagem de como o jogador vai se aproximar dos inimigos diferem de todo o resto. Até mesmo a maneira como os inimigos se comportam varia, já que estamos em um mundo aberto desta vez.
Os adversários montam emboscadas a céu aberto e também usam a furtividade ao seu favor, há líderes de tropa que podem soar o alarme e fazer com que mais de 15 inimigos o ataquem de uma vez, complicando as coisas. Se você quer "botar para quebrar" e dar de cara com todos no seu cavalo, usar o stealth ao seu favor ou uma mistura de ambos, fica à sua escolha.
Assim como o mapa, o gameplay é que apresenta maior variedade e liberdade até hoje. Na build, testei três classes e todas me proporcionaram experiências bem diferentes. A versão de testes tinha cinco classes distintas, mas o time prometeu muito mais e a possibilidade de customizar seu personagem do zero.
Mas se você gosta de dificuldade, pode ficar tranquilo que o game não ficou mais fácil. Há facilidades, como o pulo herdado de Sekiro que o ajuda a evitar ataques ou até as invocações de espíritos do próprio jogo, como lobos ou feiticeiros, que agora não dependem da sorte ou de estar em alguma condição muito específica; mas isso também não tira o brilho do desafio e da superação.
De resto, é possível encontrar diversos recursos já batidos, e ainda excelentes, da empresa, como locais para subir de nível, pântanos tortuosos, grupos de inimigo que vão destruir tudo rapidamente e muito mais. Contudo, também há surpresas agradáveis, como o crafting. Não, não é nada como qualquer outro jogo por aí, mas permite, sim, matar animais selvagens e coletar recursos no mapa para fazer facas de arremessos ou flechas, por exemplo.
Tudo é muito familiar e ao mesmo tempo diferente, com uma sensação de ser algo novo e não um Dark Souls 4. Há uma única ressalva, que pode ser infundada, mas vamos falar sobre isso depois.
Aparentemente mais narrativo também
Muitos dos games da FromSoftware são famosos por suas narrativas contadas por elementos do ambiente e descrições de itens, algo que fez e ainda faz com que muitas pessoas não entendam a trama do que estão experimentando. E Elden Ring? Afinal, George R. R. Martin de Game of Thrones assina o roteiro, não é mesmo?
Apesar de ser um breve recorte, o game aparenta estar um pouco mais narrativo e mastigado do que o comum. Não espere por nada extremamente guiado, mas parece que o nível de compreensão se assemelha a Sekiro, que já foi mais guiado. Há sim mais cutscenes e as coisas parecem fazer um pouco mais de sentido facilmente do que o comum, mas a build era pequena demais para nos dar a resposta definitiva.
O jogo mais social da FromSoftware?
No final das contas, o teste fechado de rede de Elden Ring era isso: um teste de rede. Isso porque desde a primeira revelação, vimos que o fator social estará mais presente além do que já estamos acostumados. Segundo a Bandai, é possível aproveitar a experiência com até quatro pessoas simultaneamente.
Mas não se engane: isso não quer dizer que seja um jogo cooperativo e dependente de multiplayer. Durante as várias horas que passei jogando, fiz quase tudo sozinho e isso é extremamente viável. Contudo, há sim mais itens para invocações, invasões e incentivo à jogatina cooperativa. Mas isso não tornaria o game mais fácil?
Pode até parecer na teoria, mas na prática me pareceu o oposto. Para enfrentar um dos chefes mais difíceis da build, um dragão que ronda o lago, tentei na terceira jogatina invocar um aliado. Eu já havia derrotado ele duas vezes com outros personagens e esperava facilidade, mas não foi bem assim. O padrão de ataque do chefão mudou e ele ficou bem mais agressivo, talvez por ter que mudar entre alvos constantemente.
De qualquer forma, há restrições: no modo multiplayer, não é possível montar o cavalo e a sessão não é contínua, assim como nos demais jogos, pois caso o aliado morra, a conexão acaba. É possível jogar de forma mais contida e colocar senha também para evitar o fator online constante.
Caso opte por jogar sozinho, as invocações são uma boa maneira de contornar o problema social, já que os summons são itens, e não magias: ou seja, até classes de corpo a corpo podem usá-los, apesar de que ainda é necessário usar mana para o recurso. Contudo, é preciso ter estátuas de invocação na área e não são todas as situações que elas serão viáveis.
Pequenas ressalvas no quadro geral
Por ser um teste fechado de rede, meses antes do lançamento, é absolutamente normal que haja alguns problemas: afinal, esse é o tipo de Beta correto, muito antes da estreia, para que coisas técnicas sejam resolvidas. Dito isso, a conexão sempre fluiu bem no multiplayer, seja em invasões, seja em sessões cooperativas.
Entretanto, os maiores problemas aconteceram durante o gameplay comum. De vez em quando, havia lag no server e o jogo ficava lento repentinamente e quase congelava. Vale ressaltar que isso não era problema de performance, mas deve ser corrigido até o lançamento. E por falar em performance, também vi elementos a serem melhorados.
Eu joguei Elden Ring na versão de PS5, que tinha dois modos: o qualidade, que prioriza resolução 4K e 30 fps, e o taxa de quadros, que diminui a resolução, mas coloca a experiência em 60 fps. Joguei o tempo todo na segunda opção e, de vez em quando, foi notável algumas quedas de frames aqui e ali, mas nada drástico. E vale ressaltar que ambos os modos têm visuais lindíssimos, contrariando o senso comum de quando foi revelado. De qualquer modo, há tempo para corrigir esses problemas e eventuais bugs, apesar de ter visto pouquíssimos.
Por fim, há uma última coisa que me incomodou. Esse ponto negativo pode não ter fundação por se tratar de uma build fechada e com alterações em relação ao produto final, mas senti que o sistema de aumento de nível é bem diferente e estranho. As runas, que servem para comprar itens e subir de level, são bem escassas e os inimigos fornecem pouquíssimas, o que acabou fazendo com que eu dependesse muito de chefes e dungeons para farmar.
Mas, caso perca esse recurso precioso depois de matar um chefe, as coisas complicam. Afinal, os chefes não reaparecem depois de derrotados. E, além disso, ao chegar em níveis mais avançados, senti que fiquei extremamente poderoso para a área, mais do que o comum nos jogos da FromSoftware, com muita vida e força.
Novamente, era apenas uma build de testes e alguns atributos podem estar alterados para que a experiência fechada neste escopo menor funcione. Contudo, teremos que esperar o lançamento para descobrir como a progressão vai funcionar.
E agora?
Elden Ring certamente se provou o jogo mais ambicioso da FromSoftware e removeu qualquer preocupação de mudanças drásticas. Tudo que foi adicionado vem para acrescentar e enaltecer o que a empresa faz de melhor. O escopo maior da experiência é um presente e um deleite aos fãs, que ficarão felizes em saber que há mais conteúdo e de maior qualidade.
Apesar de ser apenas um recorte, o mundo aberto se provou uma escolha ousada e recompensadora até o momento, me causando um sentimento raro hoje em dia: o de querer continuar a jogar sem parar e vasculhar cada centímetro do que é oferecido. Em um mercado em que o termo “mundo aberto” causa mais preguiça e más impressões, Elden Ring parece, novamente, usar elementos já fundamentados para liderar a vanguarda de games incríveis para a história.
Vale reforçar, mais uma vez, que o que jogamos é apenas um pequeno trecho do que haverá na versão final e que todas essas impressões são prévias, algo que pode mudar quando tivermos o produto finalizado em mãos. Elden Ring chega ao PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series S|X e PC em 25 de fevereiro de 2022. E aí, empolgado pelo game?
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