Os meses que antecedem a E3 costumam compor o período que chamamos de “entressafra”, isto é, uma fraca janela de lançamentos, quando os poucos bons que saem conseguem um estratégico destaque no mercado, sem oponentes que possam ofuscá-los. Assim é The Surge, agendado para o dia 17 de maio no PlayStation 4, Xbox One e PC: um daqueles jogos com brilho próprio e absolutamente propenso a entrar no seu radar.
Entregue pelas mãos da Deck13 Interactive, a mesma que concebeu Lords of the Fallen, a nova experiência embute a famigerada temática futurista, que atualmente está na “montanha-russa” do vai e vem no hype, com um bem-vindo tempero da fórmula Soulsborne. Mas não duvidem: aqui, o horizonte consegue ir muito além do que a mera cópia de uma fórmula estabelecida.
Para conferir esses e outros detalhes, o TecMundo Games teve a oportunidade de testar o jogo a convite da Sony Music Games Brasil, que distribui o game por aqui. Em duas horas de jogatina, nossas impressões foram surpreendentes, seja pela dose masoquista do combate, pela exploração inteligente ou pelas possibilidades de customização – acredite, dão inveja a Robocop.
A temática futurista numa fórmula bem-vinda
A sinopse de The Surge é tão sucinta quanto os títulos da From Software e resguardam mais informações para quem busca por fora do que pela exposição da história durante a aventura. Em resumo, o que temos é o seguinte: um evento catastrófico deixou o protagonista inconsciente em seu primeiro dia de trabalho. Você acorda equipado com um exoesqueleto em um local destruído pela explosão. Os trabalhadores do local estão inconscientes – mas os uniformes deles, também exoesqueletos, parecem reagir por conta própria.
O personagem principal parece uma mistura de Marcus Fenix com o Duas-Caras – e é tão canastrão quanto
Aqui começa sua jornada por um mundo futurista, distópico e hostil, em que qualquer coisa que se movimente minusculamente pode ser fatal e no qual sua atenção deve ser redobrada – assim como em qualquer Souls. O ingrediente ocidental se faz presente logo de cara: personagens robustos, com bordas e traços mais quadrados, parrudos e carudos se deparam com seres robóticos que destoam completamente da fisionomia e do ecossistema de um NieR: Automata ou um Gundam Wing da vida. O personagem principal parece uma mistura de Marcus Fenix com o Duas-Caras – e é tão canastrão quanto.
A apresentação é muito agradável. Não há uma opressão psicológica gerada por um visual que é o tempo todo sombrio, coisa que Bloodborne e Dark Souls fazem com maestria (e de propósito, naturalmente). Aquela atmosfera nefasta cria uma postura diferente em todos nós, ainda que de maneira inconsciente. Em The Surge, essa transição é gradativa: você inicia a aventura sob a luz do sol, com a vastidão do céu azul, e não nebuloso, em complexos industriais que reservam um monte de pequenos segredos escondidos em frestinhas, becos e afins.
Combate: solidez e robustez
Há pouco espaço para claustrofobia aqui. Logo de cara, sente-se o gostinho de apanhar, cair e levantar: bastam três ataques rechonchudos de qualquer inimigo e você morre. A movimentação não é rápida nem lenta: é média. E é difícil alcançar esse ponto de equilíbrio num título do gênero. A equipe fez a lição de casa e aproveitou o aprendizado com Lords of the Fallen para aprimorar aquilo que já sabia fazer.
Seguindo a cartilha da fórmula, você tem uma barra de stamina (aqui traduzida para “Vigor”) que mede seus movimentos. É preciso ter um balanço entre esquiva e defesa dependendo do adversário à sua frente – e jamais subestime nenhum, nem mesmo os robozinhos voadores que são iguais aos minions mais traiçoeiros de Dark Souls.
Você é o melhor Conan que Arnold Schwarzenegger poderia conceber, só que todo implantado com peças derrubadas por inimigos que foram dilacerados
O legal é que existe um peso na hora de descer o sarrafo. Aqui, aplausos à Deck13. Você é o melhor Conan que Arnold Schwarzenegger poderia conceber, só que todo implantado com peças derrubadas por inimigos que foram dilacerados. Parece que você desce uma tonelada de ferro em cada pancada aplicada. A mixagem de som ajuda muito – não são raros os momentos em que você se pega falando sozinho “blow”, “plow”, “bluf” e outras onomatopeias, só porque tá gostoso demais de ouvir aquilo no jogo. E nós tendemos a reproduzir sons dos quais gostamos.
Outro destaque: você pode mirar nas partes do inimigo que pretende destroçar. Existem pontos fracos, nos quais o dano incidido é maior, e regiões mais resistentes, em que você parece estar batendo num joão-bobo. É uma mecânica curiosa que traz um chamariz diferente a uma fórmula conhecida – e que mostra o claro intuito de imprimir selo próprio à experiência, sem ser uma cópia descarada e futurista de Dark Souls.
Um botão de finalização coloca a cereja no bolo da brutalidade. É aqui que The Surge se aproxima de um hack’n’slash mais tradicional ou cadenciado mesmo, nos moldes sanguinários que você vê em Shadow of Mordor ou God of War, com a pitada cinematográfica que isso merece. Após enfraquecer um inimigo e deixá-lo com um restinho de vida, o ícone do botão quadrado (ou X no Xbox One) é exibido sobre ele. Pressione o comando e assista a uma finalização visceral, que vai transformar ferrugens em miúdos e jorrar sangue na tela. É uma delícia. Tem o mesmo sabor da exploração.
Exploração deliciosa
Assim como em qualquer Souls, o mundo de The Surge é todo interligado e incentiva a exploração. Ao chegar ao ponto principal de um objetivo, que jamais é apontado na tela, você geralmente consegue se deslocar para algum beco e abrir uma porta que vai desembocar num trecho visitado anteriormente, criando a conexão entre um ponto de partida e um destino que, antes, estavam geograficamente separados.
Há um montão de segredos escondidos em cada cantinho pitoresco daqueles complexos industriais com paisagens externas e internas (até mesmo bosses, sim). Aliás, os corredores metálicos, tão escuros quanto uma caverna de Nioh, reservam bons sustos – com direito àquele violino agudo dos filmes de terror, estridente aos ouvidos. Gostei da dose de suspense intercalada com o masoquismo da dificuldade. A arte conceitual a seguir traduz um pouco desse sentimento.
Customização f*da!
O looting é tão viciante quanto qualquer coisa que te incentive a evoluir. Você coleta peças de metal que podem ser encaixadas nas pernas, nos braços e na cabeça. Com o tempo, o seu personagem se transforma num verdadeiro híbrido de máquina e humano. A parte mais gostosa desse processo é que você arranca pedaços dos inimigos para implantar em si próprio – ou usar como arma, se preferir.
Se você morrer, sua experiência fica intacta no chão até ser coletada. Mas existe uma sacada aqui: há um tempo limitado para você recuperar seu suor e não deixar seu orgulho ser ferido
O seu exoesqueleto é tão funcional quanto as habilidades que você desbloqueia no decorrer da jornada. Cada arma tem sua própria proficiência e pode ser aprimorada em estações de upgrade, que funcionam como os santuários de Nioh ou as fogueiras de Dark Souls. Ao atingir um ponto de descanso, todos os inimigos renascem. Se você morrer, sua experiência – chamada de “sucatas” em The Surge – fica intacta no chão até ser coletada. Mas existe uma sacada aqui: há um tempo limitado para você recuperar seu suor e não deixar seu orgulho ser ferido. Sim, é preciso rushar até a sucata caída. Se não chegar a tempo, adeus XP.
Discreto e cheio de potencial
Até aqui, o marketing de The Surge tem sido tão discreto quanto os alemães. Fundado em 2001, Deck13 é um estúdio do país germânico que se mostrou disposto a absorver as tendências do mercado, especialmente uma fórmula tão complexa – e ao mesmo tempo eficiente – quanto a de Dark Souls.
Lords of the Fallen impôs um estilo ocidental e apresentou mecânicas decentes, mas The Surge está muito mais maduro do que isso e diversos degraus à frente: robusto, sólido, inspirado e lotado de referências. A combinação que a experiência traz parece ser extremamente promissora e definitivamente merece a nossa atenção.
Aguardemos o lançamento, agendado para 17 de maio no PlayStation 4, Xbox One e PC. Conte suas expectativas na seção destinada aos comentários, logo adiante.