Em julho deste ano, o Voxel foi convidado para ir até a cidade de Los Angeles para conferir as cinco primeiras horas de Shadow of the Tomb Raider, game que fecha a “Trilogia da Origem” da Crystal Dynamics. Além de poder aproveitar os momentos iniciais do game, também tivemos a oportunidade de bater um papo breve com parte da equipe responsável por ele.
Em uma sala aconchegante repleta de pôsteres e imagens do novo jogo, conversamos com o diretor Daniel Chayer-Bisson (que também comandou o reboot de 2013) e a roteirista Jill Murray, que guiou a equipe responsável pela nova trama. Entre os assuntos tratados estão o desenvolvimento de personagens secundários e a maneira como Lara Croft vai ser retratada na trama.
Você pode conferir a entrevista completa tanto no vídeo presente neste texto quanto abaixo, em uma versão sem edições.
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Voxel: Quando vocês decidiram tornar Lara a vilã do game? Porque ela basicamente coloca o mundo no caminho da destruição. O que aconteceu aí?
Jill: Você sabe, é tudo sobre dualidade, então é um caminho de destruição e então reconstrução. Ela comete esse erro, você sabe... Nós a encontramos no auge de suas habilidades, ela faz o que sempre foi boa em fazer, no que os jogadores sempre foram bons em fazer, que é correr à frente da Trindade, chegar ao artefato antes deles conseguirem e pegá-lo para que eles não possam usá-lo.
Somente nesse momento ela percebe que foi um erro e ela deu início ao apocalipse. Então ela é seu pior inimigo em vários sentidos, ela não é a vilã da história, ela ainda se importa muito com o mundo e com todas as pessoas que foram afetadas por esse erro.
E realmente é sobre ela olhando para dentro, descobrindo como seguir em frente a partir desse ponto, como trabalhar com outras pessoas para ajudar a corrigir o erro e talvez chegar a uma compreensão mais completa do mundo e do seu lugar nele como resultado.
"ela não é a vilã da história, ela ainda se importa muito com o mundo e com todas as pessoas que foram afetadas por esse erro"
Daniel: Então, eu quero adicionar uma coisa. A coisa que é importante é que o que quer que ela faça, o objetivo é nobre. Ela sempre tenta fazer a coisa certa. Ela só não sabe exatamente o que é a coisa certa que ela deveria estar fazendo. Ela está aprendendo nesse jogo o que significa exatamente o que é a coisa certa, como lidar com as consequências de suas ações.
Então, ela não está dizendo, torcendo um bigode e [risada maligna] ‘eu vou destruir o mundo’. Não, essa não é ela. Ela está tentando fazer a coisa certa, tomar a decisão certa. E é muito... é como um cirurgião fazendo uma cirurgia. Se ela der errado as pessoas morrem, e é isso o que ela aprende ao pegar a adaga sem realmente entender o que isso significa, embora os sinais de alerta estejam lá.
Jill: Eu acho que pode ser bem difícil descobrir o que essa decisão é e a resposta nem sempre é a mais óbvia que a decisão certa é fazer nada. Certamente não é no começo do game e não é a natureza da Lara só tentar não fazer nada e ver se essa é a coisa certa a fazer. Ela sempre vai tentar ser proativa.
Voxel: Anteriormente vocês disseram que o jogo vai ser um pouco mais sombrio, que vai ter uma perspectiva mais sombria. O que vocês querem dizer com isso? O que os jogadores podem esperar nesse sentido?
Daniel: Eu diria que o tom não é necessariamente mais sombrio, mas que a percepção dele pode ser mais sombrio. Temos muito momentos mais leves, se você jogou, vai ver momentos que são muito divertidos e isso foi muito importante.
Eu diria que, quando você é um ser humano e está fazendo erros e não sabe consertá-los, e a consequência é tão grande quanto a ação que ela faz. Como um Tomb Raider, sua ação é maior do que quebrar uma ferramenta ou algo do tipo. Ao tomar essa decisão de pegar a adaga, por exemplo, o que quer que aconteça vai ter consequências sobre as pessoas inocentes ao redor.
E isso parece mais triste no começo porque precisamos colocá-la no cenário correto, precisamos entender. Como um jogador, queremos que eles se sintam como a Lara, sintam a culpa.
Porque nos videogames, uma emoção central que você não tem em outras mídias... em filmes, quanto você simpatiza com o herói, você nunca sente culpa, porque não é você fazendo a escolha. Em video games, você tem isso de que, embora seja Lara que fez essa ação, o jogador a trouxe até lá.
"Como um jogador, queremos que eles se sintam como a Lara, sintam a culpa"
E, você sabe, você sente quando está nadando e vê todas essas pessoas mortas, os jogadores vão sentir culpa. E quando essa criança cai, é por isso que as crianças reagem visceralmente em relação a isso, porque elas se sentem culpadas quanto ao que está acontecendo.
Jill: Você sabe, nesse game também falamos muito sobre a selva e como Lara tem que se tornar uma com a selva. E há paralelos psicológicos, você sabe, quando seu avião cai e ela é jogada na selva, é uma selva psicológica para ela também, ela não sabe como sair dali, ela precisa aprender sobre todo esse território novo, as ferramentas que ela encontra ao redor... se você quiser expandir a metáfora da perspectiva do gameplay... [passa o microfone para Dan].
Daniel: É, do gameplay... Então, descer é um dos elementos centrais desse game. Em Rise não tínhamos isso, em 2013, se quiséssemos descer, tínhamos que fazer ela cair. Mas com a jornada interior que ela faz, também queríamos recriar isso nas mecânicas.
Então a parte transversal, descer com o rapel é uma analogia, uma metáfora disso. E também ficar sob a água e se descobrir, encarar seus medos e encarar seus demônios é algo central aos elementos do personagem.
Jill: Acho que, dito isso, não queremos que o game inteiro pareça que é essa coisa sombria ou miserável. Temos momentos de contraste e muita luz. Por exemplo, em Paititi, o maior centro social que já criamos para um jogo de Tomb Raider e nos outros centros sociais também, onde Lara vai conhecer muitas pessoas e aprender como trabalhar com elas.
Seu senso de humor vai aparecer mais, vemos um lado mais leve. E acho que essa também é a maneira como ela encontra a forma de se retirar desses locais sombrios é através de suas relações com outras pessoas, seja seu melhor amigo Jonah ou algum dos novos personagens que ela encontra em sua jornada.
Voxel: Falando sobre Jonah: vamos ver um melhor desenvolvimento dos personagens secundários no game? Ou o foco vai ser em Lara e sua jornada e em seu crescimento?
Jill: Definitivamente vemos ótimas coisas em todos os personagens secundários, gosto de pensar que todos, de Jonah a Dominguez, o antagonista, a Abby, que você conhece no fim do segmento que acabou de jogar e alguns outros personagens, todas essas pessoas poderiam ser heróis em suas próprias histórias.
Todos eles têm coisas importantes que estão fazendo no mundo, todos eles têm suas próprias motivações. Se Lara não estivesse lá o mundo continuaria indo para frente, então eles não estão lá só como complementos para ela, mas eles são seus iguais e desafiantes e amigos.
Daniel: Mesmo do ponto de vista dos recursos e da produção, a prioridade era construir um relacionamento entre os personagens. E isso foi um elemento-chave para nós. Então Jonah está muito mais presente no dia-a-dia de Lara, hora por hora, do que nos dois jogos anteriores.
E essa foi uma das nossas prioridades, o que chamamos de “prioridade um”, e isso foi muito importante. Então, se vamos ter uma melhor exposição de personagens secundários do que nos jogos anteriores? Esse é o objetivo, isso é o que queremos fazer, para que as pessoas se importem.
Voxel: Como vocês lidam com as interações entre Lara e as pessoas de Paititi? Quero dizer, deve ser estranho nessa sociedade isolada por milhares de anos que de repente há essa garota andando por aí com um grande arco em suas costas. Então, há alguma espécie de conflito, do tipo “quem é você e o que está fazendo aqui”?
Jill: Então, as coisas não vão muito bem para Lara quando ela chega a Paititi. Ela tem que pensar rápido sobre o que ela consegue fazer e se estabelecer junto aos rebeldes, que estão em conflito com o poder governante de Paititi. Ela consegue estabelecer muito rápido que eles têm algumas necessidades e inimigos em comum, e ela consegue construir e manter sua confiança ao demonstrar que ela vai trabalhar com eles.
Daniel: É um relacionamento mútuo, claro, quando você pensa sobre isso. Quando ela está andando em Paititi, seu relacionamento lhe dá um certo status e não podemos estragar algumas coisas que você vai descobrir ao jogar. Mas digamos que há razões pelas quais ela pode andar por lá usando essa roupa especial e se manter longe dos guardas, há um motivo para isso.
E seu relacionamento como Onoratu, que é a personagem que você viu no final da demonstração, antes de chegar a Paititi. Ela está construindo um relacionamento com ela, e isso dá a ela mais liberdade para andar pelo cenário.
Jill: E nem todo mundo se acostuma com ela, há lugares em que ela não consegue ir sem entrar em conflito, há pessoas que querem espantá-la. Nunca é algo fácil.
Voxel: Então, esse é o final da trilogia que foi iniciada com o reboot de 2013. O que isso significa? Veremos uma nova Lara Croft no futuro ou é só o fim do arco da Trindade e a veremos no futuro com novos inimigos e uma nova trama?
Daniel: Para ser completamente honestos, estamos focados em Shadow agora, que é o final da trilogia, a trilogia da origem, então isso que é importante. Depois, tudo o que vamos mostrar é ela virando a Tomb Raider que ela deve se tornar, esse é objetivo, mas com uma visão moderna. Então com certeza isso vai ser algo, mas o que exatamente isso significa não sabemos, vamos esperar, estamos focando em Shadow.
Jill: Estamos super focados nesse jogo agora e também pensamos que, mesmo se você não tiver jogado os dois games anteriores, Shadow of the Tomb Raider é o ponto perfeito para começar a explorar tumbas com Lara Croft porque é aqui que ela se torna a versão definitiva da Tomb Raider que ela sempre esteve destinada a se tornar.
Voxel: O que significa exatamente virar a Tomb Raider?
Daniel: No caso dela é realmente entender de que há coisas maiores do que ela no mundo. Mistérios e segredos estão ali, e só interagir com eles sem entendê-los pode causar grande dano ao mundo. E viver com as consequências de suas ações, realmente entender o que significa exatamente lidar com isso. É conseguir certo grau de maturidade, é isso que significa exatamente.
Eu vou deixar você jogar até o fim do game, e vamos responder no final do game exatamente o que isso significa. Mas, por enquanto, você tem que ficar satisfeito com o que eu disse. Eu não sei se Jill quer adicionar algo, mas é isso o que eu posso dizer.
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Com versões para PlayStation 4, Xbox One e PC, Shadow of the Tomb Raider tem lançamento programado para o dia 14 de setembro deste ano. Aproveite também para conferir as nossas impressões das horas iniciais do game e não se esqueça de usar nossa seção de comentários para deixar registradas as suas impressões sobre ele.
O Voxel viajou a Los Angeles a convite da Square Enix
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