As Golpistas é sobre anti-heroísmo feminino e dilemas (Crítica)
Jennifer Lopez dispensa apresentações e ostenta invejáveis 20 e poucos anos de carreira como cantora, compositora, atriz, modelo, coreógrafa, entre outras inúmeras especialidades que pavimentaram seu caminho até aqui. Essa estrada, no entanto, tem suas sinuosidades por conta de uma indústria que a esnobou durante esse tempo, seja no campo musical ou devido a uma filmografia permeada por comédias românticas pastelonas e produções peculiares (jamais esquecer de A Cela e Anaconda). Mas parece que o jogo virou em As Golpistas e aqui temos uma J.Lo irretocável em todas as suas propriedades, em um contexto pré e pós-crise econômica de 2008.
Baseado em fatos reais, um grupo de strippers — após sofrer anos de abusos e todo o pacote de toxicidades praticado contra a mulher —, é encabeçado por Ramona e Destiny, que decidem somar forças com outras garotas para tirar vantagens de seus clientes ricaços de Wall Street. O palco é montado pela diretora e roteirista Lorena Scafaria, responsável pelos razoáveis A Intrometida e Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo. Se é uma produção sobre “máfia girl power”, nada mais justo que um olhar feminino sobre a pauta, que é destrinchada com auxílio da veia dinâmica e detalhista da dupla Adam McKay e Will Ferrell na produção.
As Golpistas se divide em três atos e, indiscutivelmente, o primeiro será o mais recordado lá na frente em termos de espetáculo. A produção foi capaz de remontar um 2007 para 2008 repleto de minúcias que imergem o espectador naquele período. Figurinos, músicas, gírias, tecnologias… está tudo lá. Mas o que realmente recebe os holofotes são as performances deslumbrantes no pole dance, combinadas com saltos altos, vestimentas cintilantes (e bem curtas, considerando o cenário), neon para todo lado e uma técnica incrível para tornar cada número impecável, e sem desrespeitar a mensagem que norteia o longa.
Nas demais sequências, somos apresentados ao ônus que desnuda todo o “glamour” da bonança financeira em que viviam as protagonistas, mas que tão logo é desmontada devido à crise que atingiu quem detia o cacife: os dólares já não eram mais postos em calcinhas a torto e a direito como antes. A partir daí, as strippers se mobilizam para aplicar os golpes, de forma bastante estruturada, e a velha máxima vem à tona: os fins justificam os meios? Há um prazer em assistir ao contragolpe feminino nos caras que tanto as assediaram. Contudo, a direção se preocupa em demonstrar o quão inglórias eram aquelas práticas, e as consequências vêm.
Definitivamente é um dos melhores trabalhos de Constance Wu. Sua Destiny é escalável, reativa, empática e está em completa sintonia com a personagem de J.Lo, que toma o filme inteiro de assalto. Muito além da sensualidade dos palcos, Jeniffer Lopez encena uma Ramona firme, experiente, perspicaz e que tem autonomia em suas atitudes, mas que não deixa de ser tão errônea quanto qualquer ser humano. A diferença aqui é que, felizmente, a cantora de fato acerta em tudo. Do outro lado temos Keke Palmer e Lili Reinhart, que foram remendadas na trama como alívios cômicos. Faltou aproveitamento. Julia States no papel da jornalista Elizabeth, apenas passível de catalogar os fatos que se tornaram o artigo da revista New York Magazine. Por fim, algumas participações especiais, valendo apenas ressaltar a de Cardi B com uma aparição feita sob medida para os fãs.
As Golpistas é sobre anti-heroísmo, resistência, identificação, feminismo e dilema. Todas essas agendas são bem anexadas por Lorene Scafaria, que acerta em espetacularizar e, seguidamente, corroborar o falso charme que existe dentro de uma conjuntura deprimente no universo das boates de strip e em todas as suas ramificações. Para todos os efeitos, um produto pensado para eviscerar as nocividades da vida real. Constance Wu brilha, mas é a J.Lo que surpreende durante toda a projeção, presenteando o espectador com uma performance exemplar e completa, digna de um merecido reconhecimento por parte da indústria.
Por Fabrício Calixto de Oliveira via nexperts.
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