Joias Brutas: esqueça o Adam Sandler que você conhece (crítica)
É impossível pensar em Adam Sandler sem associá-lo às suas comédias do gênero... Adam Sandler. Em seus 30 e poucos anos de carreira, títulos como O Paizão, Como Se Fosse A Primeira Vez, Gente Grande, Esposa de Mentirinha, entre outros, estiveram presentes em nossos aparelhos de VHS e DVD, eventualmente retransmitidos em TV aberta — durante as exibições da Sessão da Tarde —, além da sua não tão recém-adesão aos serviços de streaming, encabeçada por Zerando a Vida e Mistério no Mediterrâneo, na Netflix. Há quem o ame e há quem o odeie por conta de seu estilo, muitas vezes, escatológico e superficial de criar humor. Diante dessa vertente enraizada no imaginário popular, é possível cogitar personagens “sérios” para o ator? Existem produções que já o fizeram, mas não de forma tão visceral quanto em Joias Brutas.
Howard Ratner é um joalheiro endividado que encontra uma possível chance de quitar suas pendências, mas acaba gerando confusões de todo o tipo e, simultaneamente, adota saídas paliativas e ousadas para se livrar de cada imbróglio. A direção é dos novatos e igualmente talentosos irmãos Safdie, autores do competente Bom Comportamento. Na produção de 2017 havia uma experimentação do caos e frenetismo, agora utilizada como molde principal em Joias Brutas, lapidado à base de um ritmo tão assertivo e que aqui ganha a espessura ideal.
Os Safdies procuram, o tempo todo, provocar o espectador com as burradas de Ratner, e o jogo veloz de câmera, juntamente com uma trilha sonora enérgica, que proporcionam esse nível de imersão que permeia a obra do início ao fim. Sem adentrar no campo dos spoilers, mas existe uma exposição de contexto densa e eficiente no primeiro ato que, gradativamente, se torna prolixa no segundo, gerando determinada sobrecarga na trama. O ato final, no entanto, é a cereja no bolo e apresenta um desfecho impressionante, recorrendo de uma reviravolta impremeditada com força total para explodir a cabeça de quem assiste a um fim tão marcante. O roteiro, por sua vez, é intenso, espinhoso, sagaz e também reforça a atmosfera turbulenta do longa.
Sandler já se mostrou capaz de embarcar em atuações mais sérias, registradas em Os Meyerowitz, Embriagado de Amor até mesmo Click (não?). Em Joias Brutas, todavia, testemunhamos seu melhor papel e aqui o ator está longe da sua zona de conforto humorística, extremamente empenhado em entregar um Howard Ratner repleto de camadas dramáticas conflituosas. O joalheiro é explosivo, sinuoso, indiligente, cativante e move o enredo sem desmagnetizar, em momento algum, a atenção sobre ele. Idina Menzel desperta empatia sob uma esposa encarregada de absorver os trambiques de seu marido picareta, e Julia Fox é uma eficaz amante que flexibiliza as tramaiosas do figurão. Também temos as participações especiais do jogador de basquete Kevin Garnett e do cantor The Weeknd, muito bem mesclados por Lakeith Stanfield. E, por fim, vale destacar o núcleo funcional de agiotas, composto impreterivelmente por Eric Bogosian e Keith Williams Richards — importantes no giro da treta toda.
Joias Brutas é um trabalho envolvente dos irmãos Safdie, que conseguem, com primazia, explorar um Adam Sandler jamais visto em cena. É um filme frenético e essencialmente sobre seu personagem com uma apresentação formidável, ora desgastada no segundo ato, mas que se regenera lá na outra ponta, entregando ao espectador um final inesquecível e surpreendente. Quem sabe Sandler não seja indicado a algumas premiações? Fato é que seu potencial para atuação dramática está definitivamente validada e gera anseios: queremos mais dramas protagonizados por Sandler.
Este texto foi escrito por Fabrício Calixto de Oliveira via nexperts.
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